Sábado, 7 de Janeiro de 2017

O Ministro das Finanças já tem sucessora

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O Ministro das Finanças Francisco Anacleto Louçã fez duas importantes comunicações ao país esta semana.

  • Na primeira, anunciou que o Novo Banco vai ser nacionalizado, medida que suscitou apoio entusiástico generalizado, incluindo o da família Espírito Santo, da secretária de estado das finanças Manuela Ferreira Louçã, e do presidente do maior partido da base de apoio do governo bloquista Carlos César. Este medida permite isentar os bancos que operam em Portugal de terem que reembolsar o empréstimo de 3.900 milhões de euros que o Estado fez ao Fundo de Resolução de que eles são titulares e por cujas respponsabilidades respondem, confirmando a carta de conforto que já lhes tinha sido anteriormente anunciada pelo porta voz do ministério Mário Centeno, que já os isentava do risco de virem a ter que fazer contribuições extraordinárias para o fundo, e dá aos contribuintes a oportunidade de serem eles a salvar mais um banco com o seu próprio dinheiro, deste vez pelo custo muito em conta de apenas 390 euros por português, pouco mais de mil euros para uma família de três pessoas. Uma pechincha!
  • Na segunda, designou como sua sucessora no Ministério das Finanças da República Socialista Soviética de Portugal a sua ghost writer e sucessora na linha dinástica bloquista Mariana Mortágua. Ficará com a incumbência de conduzir a renegociação da dívida quando ela se tornar impagável, objectivo para o qual o governo tem focado todas as suas capacidades e competências com resultados cada vez mais inegáveis.

Estão ambos de parabéns, e estamos nós.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 15:27
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Quinta-feira, 5 de Janeiro de 2017

O milagre da gravata

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O Bloco de Esquerda insurgiu-se desde sempre contra a utilização de dinheiro público para salvar bancos.

(Eu sou do tempo em que ser de esquerda era ambicionar uma sociedade onde a miséria fosse, se não erradicada, pelo menos minimizada na medida do possível, onde não se passasse fome e as pessoas pudessem viver em condições de higiene e salubridade minimamente decentes e ter acesso a tratamentos na doença e à educação, se tivessem vontade e cabeça para estudar. Quis o destino que o modelo de sociedade e de economia que se aproxima mais de possibilitar esta ambição seja o de democracia liberal com economia de mercado e um nível de estado social minimamente sustentável por ela, e eis-me aqui neoliberal de esquerda.

Mais tarde, vim a perceber que ser de esquerda não é ter esta ambição e procurar as soluções que a consigam concretizar no domínio das possibilidades, mas sim exigir que seja o estado, mais do que a regular a economia e os agentes económicos, que somos todos nós, o agente económico que se dedica à produção, desejavelmente em regime de monopólio, dos bens e serviços e, acima de tudo, dos disponibilizados pelo estado social, coisa que em breve fará um século que está provado que não faz nem bem nem com eficiência no consumo de recursos.

Mais tarde ainda, foi-se tornando claro que ser de esquerda já não tem nada a ver com aquela ambição, mas apenas com o controlo da sociedade pelo estado para defender grupos de interesse específicos, que incluem corporações como a função pública e os sindicatos, mas não os mais desfavorecidos e em risco de cair, ou ser impedido de sair, da miséria, que não há sindicatos de desempregados nem de sem-abrigo, em detrimento dos dos que não fazem parte desses grupos de interesses. Isto sem nunca abandonar a retórica, marketing oblige, da defesa dos mais desfavorecidos, que lhe rende votos quando os mais desfavorecidos são também desfavorecidos de lucidez e informação.

E tornou-se também evidente que para se ser verdadeiramente de esquerda é necessário padecer de uma disfuncionalidade cognitiva permanente relativamente à origem do dinheiro colocado à disposição do estado para gastar, ignorando persistentemente que é o dinheiro dos cidadãos passados, quando o estado tem poupanças, actuais, quando se financia com os impostos que lhes cobra, e futuros, quando se endivida para eles pagarem mais tarde, formulando as suas políticas como se o dinheiro caísse do céu. Quem diz caído do céu pode também dizer doado pelas instituições europeias que o vão buscar aos cidadãos europeus, ou por credores que o emprestam sem a preocupação de o vir a receber um dia mais tarde. Dinheiro que há-de aparecer, se Deus quiser.

É este o motivo mais ponderoso para o Bloco de Esquerda ser sempre contra o resgate de bancos com dinheiro público, admitindo que não é necessário porque eles podem ser resgatados com dinheiro caído do céu, ou podem ser deixados falir porque dinheiro caído do céu haverá de compensar os pobres da perda das suas poupanças se o seu banco falir, e um milagre há-de garantir que quem é compensado são apenas os pobres a que recorre na sua retórica e não os ricos.)

No mundo real, quando um banco chega a uma situação de risco de falência, e para evitar o risco de disrupção económica e social que a perda das poupanças e investimentos confiados a esse banco por particulares, empresas e outras instituições teria grande probabilidade de desencadear, resgatam-se os bancos. E resgatam-se por uma de duas vias alternativas:

  • a nacionalização, em que o estado, ou seja, os contribuintes, cobre todas as reponsabilidades do banco e garante o reembolso de todas as poupanças e investimentos que estavam à sua guarda;
  • a resolução, em que se definem as regras que determinam que responsabilidades com depositantes e investidores devem ser garantidas, e a quais deve ser dado o calote, se cria um banco novo para onde estes clientes são transferidos, e se cria um fundo de que todos os bancos são titulares e responsáveis para capitalizar o banco novo de modo a assegurar as responsabilidades com esses clientes, sendo o fundo inicialmente capitalizado com dinheiro emprestado pelo estado, remunerado com juros e para ser mais tarde reembolsado pelos bancos titulares do fundo usando, nomeadamente, a receita da venda do banco novo se ele for vendido, e sendo responsáveis pelo reembolso do resto se a receita da venda não for suficiente.

Na primeira, os contribuintes cobrem todas as reponsabilidades do banco falido. Como aconteceu em Portugal no BPN e no Banif. Na segunda, os contribuintes adiantam aos outros bancos o dinheiro para assegurarem as reponsabilidades que se determina que devem ser cobertas, a juros, e para ser reembolsado por eles. Como aconteceu em Portugal com o BES e deu origem ao Novo Banco.

O Conselheiro de Estado Francisco Louçã acabou de pedir ao governo a nacionalização do Novo Banco. O que significaria desobrigar os outros bancos de reembolsarem o estado pelo crédito concedido ao fundo de resolução, ou seja, fazer serem os contribuintes, e não os outros bancos, a suportar as responsabilidades, seleccionadas de acordo com o critério definido, do BES.

Para quem sempre se insurgiu contra a utilização de dinheiro público para salvar bancos, defender a utilização de dinheiro público em vez de dinheiro dos outros bancos para salvar o Novo Banco é uma grande progressão. Merecia ser nomeado para um Conselho de Administração de um banco, num cargo não executivo para salvaguardar a saúde financeira do banco contemplado, ou, pelo menos, para um Conselho Fiscal.

É o milagre da gravata que passou a usar nas reuniões do Conselho de Estado.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 17:09
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Quarta-feira, 4 de Janeiro de 2017

A censura só conta quando é feita pela direita.

O Alberto Gonçalves, pessoa que não conheço socialmente a não ser das redes sociais, como aliás boa parte dos amigos mais chegados das redes sociais, e autor de colunas de opinião no Diário de Notícias e na revista Sábado com um sentido de crítica e de humor cáusticos quase sempre dirigidas ao governo e aos partidos de esquerda que o apoiam, com especial incidência sobre os socialistas e os bloquistas que lhe dedicam publicamente um odiozinho especial e se dão ao trabalho de o comentar, acabou de ser despedido do Diário de Notícias, jornal do grupo Global Media presidido pelo advogado Proença de Carvalho.

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Onde era o autor de artigos de opinião mais partilhado nas redes sociais, com uma média superior a mil partilhas por artigo, só aproximada pelo António Barreto.

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Em tempos recuados, o despedimento, depois de ter sido criticado por um ministro, do comentador Marcelo Rebelo de Sousa, particularmente crítico do governo, por um canal de televisão que, aliás, era propriedade de um cunhado seu, motivou a dissolução pelo presidente socialista Jorge Sampaio do parlamento onde havia uma maioria absoluta sólida e estável do PSD e do CDS-PP, que estavam mesmo coligados no governo. Isto pouco mais de um ano depois de o mesmo presidente ter aceitado nomear um primeiro-ministro que não se tinha apresentado como candidato a primeiro-ministro nas eleições legislativas, nem sequer a deputado, dizem as más línguas que para dar tempo ao PS para substituir um líder que não parecia suficientemente ganhador por outro que parecesse, substituição que entretanto se tinha concretizado. Mas, para sair do domínio da especulação e regressar ao dos factos, o despedimento do comentador com mais audiência no canal onde comentava por ser incómodo para o governo foi motivo para a dissolução do parlamento e para a convocação de novas eleições legislativas. O governo social-democrata e centrista não podia censurar o comentador que o censurava regularmente.

É verdade que o governo seguinte, socialista, passou uma legislatura e meia a tentar silenciar jornalistas e comentadores através do controlo accionista de jornais e canais de televisão, de ameaças directas e explícitas às redacções, por vezes feitas directamente por telefonemas do primeiro-ministro, e da instauração por ele a jornalistas e comentadores de processos cíveis de valores suficientemente milionários para aterrar qualquer jornalista com a ameaça de falência, e nenhum dos presidentes com quem conviveu institucionalmente, nem o Jorge Sampaio, que o tinha feito na legislatura anterior, nem o Cavaco Silva, que nunca o fez, esteve próximo de dissolver o parlamento por causa de o governo pressionar a comunicação social. O governo socialista podia censurar comentadores à vontade.

Seguiu-se o governo social-democrata e centrista neoliberal do Passos Coelho, que se esteve nas tintas para a comunicação social e o que dizia dele, e dizia mal, e sempre, e muito. Mas mesmo assim foi acusado das mais selvagens violações da liberdade de imprensa por motivos como ter sido encerrada a delegação em Paris da agência noticiosa estatal, a Lusa, e de com isso terminado a comissão de serviço e a estadia na cidade-luz do jornalista que era lá correspondente, e de ele ter sido forçado a regressar a Portugal para não perder o emprego. Mesmo sem censurar jornalistas e comentadores, o governo social-democrata e centrista era censurável.

As ameaças a jornalistas, umas em público, outras em privado tornadas públicas pelos ameaçados, precederam a nomeação do primeiro-ministro socialista actual António Costa, sem que no entanto tivesse sido impedido de se candidatar ao lugar e de perder as eleições. Do mais não se sabe, porque, ou ele deixou de ameaçar jornalistas desde que foi eleito nomeado primeiro-ministro, ou passou a fazê-lo de modo mais discreto do que o seu antecessor socialista e do que ele mesmo enquanto candidato. Mas o Alberto Gonçalves não tem sido de uma maneira geral elogiado pelos socialistas e pelos bloquistas que se dão ao trabalho de comentar comentadores. Nem o presidente da Global Media se tornou conhecido pela sua antipatia relativamente aos socialistas, nomeadamente os que atacam jornalistas, tendo mesmo patrocinado como advogado os múltiplos processos do José Sócrates a jornalistas. Significa isto que o parlamento corre risco de dissolução por ter havido socialistas e bloquistas a criticar um comentador e ele ter acabado por ser despedido de um jornal presidido por velho amigo dos socialistas?

De certeza absoluta que não. O comentador Marcelo, cujo despedimento da TVI foi usado como argumento para o presidente Jorge Sampaio dissolver um parlamento de maioria PSD e CDS-PP não vai fazer nada como presidente Marcelo, nem sequer tomar conhecimento, por haver comentadores despedidos por criticarem o governo socialista com quem ele desenvolveu uma cooperação estratégica exemplar. Por uma razão ponderosa, um artigo não inscrito na Constituição mas desde sempre respeitado: em Portugal é ilegítimo governos social-democratas, ou social-democratas e centristas, pressionarem a comunicação social, mas os governos socialistas têm toda a liberdade para o fazer. A censura só conta quando é feita pela direita. Mesmo quando não a faz.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 20:28
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Terça-feira, 3 de Janeiro de 2017

O Partido da Pecuária

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Apesar de os seus fundadores terem tido raízes ideológicas comunistas, o PS nasceu como um partido social-democrata empenhado na defesa da democracia liberal, incluindo as liberdades normais, que não as amplas, de opinião, imprensa e associação, da economia de mercado, e do estado social para limitar as desigualdades e erradicar a miséria. E, claro, a defesa do estado de direito, em que, entre outras peculiaridades, as dívidas são para serem pagas. Foi assim durante o PREC, em que se tornou o maior alvo de ódio dos comunistas e da esquerda radical, pelo menos daquela que não fez dos comunistas ou do resto da esquerda radical o maior alvo do seu ódio, que erradicou, parecia que definitivamente, do poder que tinham adquirido pela via revolucionária mas não sobreviveu às eleições, e passou a ser assim, parecia que definitivamente, quando o Mário Soares, reconhecendo que só se podia governar no domínio das possibilidades, declarou que tinha metido o socialismo na gaveta.

Mas ao longo do tempo o PS foi sendo colonizado pelos desertores da esquerda radical, ou por terem descoberto os encantos da social-democracia que antes os encanitava, ou por terem pragmaticamente reconhecido que na esquerda radical não podiam fazer carreira política nem empresarial, tendo admitido tanto ex-militantes do MES, como ex-MRPP, como mais recentemente até ex-BE. E, na mesma medida em que a população nativa de um país de acolhimento de imigração tende a reduzir o seu peso demográfico comparativamente com a população imigrante por esta ter taxas de natalidade mais elevadas, os colonos da esquerda radical, com o seu activismo acrescido e o tradicional apelo pelo disparate das gerações mais jovens, foram ultrapassando em número e em peso político os social-democratas clássicos, e acabaram por tomar conta do partido. Pelo que não é completamente inesperada a constatação de que o PS tem andado a mudar de ideologia, mesmo que lhe continue a chamar de social-democrata. Que, aliás, agora todos são, desde o Pacheco Pereira, ao Podemos, ao Freitas do Amaral.

A questão, que já o Georges Brassens colocava na canção Mourir pour des idées, é "Mourir pour des idées c'est bien beau, mais lesquelles?".

O PS fez uma incursão histórica no domínio da ideologia da escatologia, num célebre episódio protagonizado pelos ex-MES Ferro Rodrigues e Jorge Sampaio e pelo então sampaista António Costa em que o actual presidente do parlamento declarou ao actual primeiro-ministro "tou-me cagando para o segredo da justiça".

Mas foi já no reinado do José Sócrates que o ministro Manuel Pinho propôs ao partido a ideologia da pecuária. Como Winston Churchill muitas décadas antes, o ministro teve razão antes de tempo e, no momento da proposta, foi completamente derrotado, e teria mesmo sido violentamente derrotado pelos comunistas se não tivesse saído a correr do parlamento, mas ela acabou por vingar alguns anos mais tarde, e o PS acabou mesmo por abraçar esta ideologia. Dando, aliás, acolhimento às teses de vanguardistas das massas que o apoiam, que, ora tratam os eleitores como gado ovino, levado em rebanho ao engano das eleições, ora como gado muar, embevecido com a conversa do (então) candidato Marcelo.

E hoje em dia, honra lhe seja feita, e à memória do seu combate político, não há ministro nem deputado socialista que se preze que não inclua no seu discurso referências à ideologia da pecuária. O PS transformou-se, pois, no Partido da Pecuária.

Mas a linha pecuarista do PS deve estar atenta! Há no seio do partido dirigentes que procuram impôr a ideologia da psiquiatria. Se estes acabam por convencer e vencer, como antes os da pacuária, ainda acabamos todos por deixar de ser gado para nos transformarmos em meros maluquinhos.

Ou isso, ou mudamos de governo.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 14:54
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Domingo, 1 de Janeiro de 2017

Tirar aos pobres para dar aos ricos, o socialismo do século XXI

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O socialismo está-se a aperfeiçoar, a tornar cada vez mais justo e menos desigual.

Se durante todo o século XX foi o sistema baseado em tirar a todos para dar a uma ínfima minoria de dirigentes de topo, colaboradores, nomeadamente militares que lhes asseguravam a permanência no poder, e seus protegidos, não parou de evoluir e, em Portugal, já se pode dizer que atingiu o estado mais avançado de tirar aos pobres para dar aos ricos.

Sabem qual é o município com maior poder de compra de Portugal? É Lisboa, com o dobro da média nacional. E o município com poder de compra mais baixo? Cinfães, com metade da média nacional. Em média, os munícipes de Lisboa têm um poder de compra quádruplo do dos de Cinfães.

2017-01-01 Pordata, poder de compra por município

Na realidade a diferença é ainda maior. A esmagadora maioria dos munícipes de Lisboa têm, a walking distance da sua casa, uma caixa multibanco, uma farmácia, o centro de saúde, a escola, a esquadra da polícia, a junta de freguesia, um Minipreço ou um supermercado low-cost. Para não falar num hospital ou numa universidade. E, se não os tiverem assim tão perto, têm uma paragem de autocarro ou uma estação de metro para apanharem o transporte público para os levar até ao destino. Por um preço abaixo do custo real do serviço, e é por isso que as empresas públicas de transporte de Lisboa acumularam prejuízos que foram pagos por uma dívida que cresceu como uma montanha para assumir proporções de impagável.

Já os de Cinfães, e eu escrevo isto correndo o risco de imprecisões sem me ter documentado previamente no Google Maps para não apanhar uma depressão no primeiro dia do ano a sofrer com as penas deles, o único equipamento que provavelmente têm a curta distância de casa é a igreja. Todos os outros, para a esmagadora maioria deles, estão à distância de uma viagem de automóvel, particular, para os que os têm, ou de praça, que é o nome que os taxis têm por esse Portugal fora. A que custo? Comparativamente com o autocarro ou o metro dos lisboetas, upa, upa! Uma única deslocação pode custar mais que o passe mensal para os transportes de Lisboa. E quando querem meter os filhos na universidade, alugam-lhes um quarto na cidade onde conseguirem vaga e pagam-lhes as deslocações à terra. Se ganham quatro vezes menos, gastam muito mais para terem o mesmo, pelo que o seu poder de compra resulta bem inferior a um quarto do dos lisboetas.

Mas eles são poucos e os lisboetas são muitos, e quando se vai a votos a quantidade de eleitores conta, e em 2017 vai-se a votos, e o governo socialista decidiu dar um presente à câmara socialista de Lisboa. Ofereceu-lhe a Carris, para poder dispor dela a seu favor nestes meses que faltam para as eleições.

Mas simplesmente entregá-la à CML tinha um problema: a dívida, resultante de décadas de prejuízos acumulados a disponibilizar aos lisboetas transportes a preço abaixo do custo real, de 700 milhões de euros, que não só constituiria um encargo pesadíssimo, como um bloqueio à capacidade de a empresa se endividar ainda mais para investir a melhorar o serviço aos utentes e fazer uns floreados que ficam bem em ano de eleições, coisas como renovar a frota com autocarros eléctricos ou reforçar carreiras para os utentes não se chatearem por ter de esperar tanto pelo autocarro. Vai daí, o António Costa, que se fosse advogado de divórcios conseguiria aos seus clientes divórcios daqueles em que o marido fica com a casa e a mulher com a dívida ao bancoassumiu a dívida da Carris para oferecer à CML uma empresa sem encargos de dívida e com a possibilidade de começar de novo a endividar-se a partir do zero, ser muito mais perdulária, e fazer um figurão nos primeiros anos de gestão camarária. E, digo eu, os lisboetas que não se assustem com a responsabilidade, porque a Carris vai continuar a gastar mais do que consegue cobrar, e vai voltar a recorrer à dívida, mas, um dia, quando a nova dívida se tornar impagável, outro governo socialista tratará de a assumir, como este fez a esta. A dádiva foi tão generosa que o próprio António Costa confessou que tinha inveja por não ser ele o presidente da CML a recebê-la para fazer floreados com ela, mas desejou-lhe felicidades, o que mostra que não é homem de rancores.

Quem diz o António Costa assumiu quer de facto dizer o António Costa transferiu para todos os contribuintes o encargo da dívida.

E assim chegámos ao socialismo do século XXI. Em vez de deixar aos lisboetas, que são os munícipes mais ricos do país, a dívida de 700 milhões de euros que foi acumulada para lhes oferecer transportes públicos a preço abaixo do custo, e que já ia em 1.400 euros por lisboeta, distribui-a por todos os contribuintes, mesmo os mais pobres a quem não são oferecidos transportes públicos nenhuns, mesmo os de Cinfães, numa razão de 70 euros por português, ou 280 euros para um agregado familiar de quatro pessoas.

Pelo que chegamos ao que queriamos provar: tirar dinheiro aos pobres de Cinfães para dar transportes públicos baratos aos ricos de Lisboa, como fazem em Portugal os socialistas do século XXI, é um grande avanço em termos de justiça social e combate às desigualdades comparativamente com tirar a todos para dar apenas aos governantes e generais e respectivas famílias, como fizeram no século XX, e continuam a fazer no XXI, os socialistas de todo o mundo.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 18:07
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