Tirando dos factos as lições que eles encerram, pode-se imaginar um caminho; caso contrário, não. Quais são então os factos, as lições e o caminho?
A abstenção é o maior partido, com 2/3 dos votos (um tanto menos, se nos lembrarmos dos emigrantes e da tradicional desactualização dos cadernos);
O PCP foi o partido tradicional que mais cresceu;
O Bloco mirrou;
O PS só poderá vir a formar um governo minoritário com apoio parlamentar do CDS e do PSD (ou do PSD, possivelmente com abstenção do outro); ou um governo maioritário com o PSD, para abandonar de vez qualquer esperança de reforma do Estado e de saneamento das contas públicas, quer seja liderado pelo patético Seguro quer pelo visionário Costa, uma espécie de Zorrinho do Plano Tecnológico e tretas modernaças sortidas, mas com mais subtileza, habilidade e estatura.
Marinho e Pinto é um balão. Pode encher mais e subir mais, mas começa a esvaziar logo que se perceba que tem combustível apenas para subir, como sucedeu ao PRD e ao partido dos reformados (do saudoso Prof. Sérgio) antes dele, bem como ao próprio BE, este último também por ser um sucedâneo urbano e parvinho do PCP.
A miríade de partidos restantes que abrilhanta as eleições vale o mesmo que os foguetes das festas populares, com a diferença de não poder originar incêndios.
Estes os factos. Agora as lições:
Os abstencionistas, em proporções impossíveis de calcular, disseram três coisas: i) A Europa é uma mama, o Parlamento Europeu uma abstracção, e os candidatos uns treteiros à procura de tachos dourados; ii) Ninguém prometeu convincentemente que a mama murcha ia inflar, logo alimentar com votos partidos fervorosamente europeístas foi chão que deu uvas; iii) O governo do dia deu austeridade, emigração e reformas de paleio e tinha que ser castigado por isso. Mas como só os comunistas ofereceram uma alternativa às políticas seguidas, mas despertam anticorpos num universo eleitoral cuja esmagadora maioria não é constituída por mujiques, operários raivosos e intelectuais subsídio-marxistas - não havia partidos nos quais votar.
Temos então que os comunistas não contam, porque a diferença deles não pode ser engolida; o PS não conta, porque, mesmo que ganhe, não pode fazer maioria com o PCP (está mais distante dele do que qualquer dos outros partidos) e a que poderia fazer com o PSD apenas prolonga o marasmo; a coligação dita de direita não conta porque o eleitorado desconfia que, com ela, terá pelo menos mais uma década penosa, e portanto não lhe dará a maioria absoluta.
Estão as condições reunidas para um novo partido, ou um velho renovado. Não para fazer um arranjo diferente das mesmas velhas coisas, mas para pegar no problema de um outro ângulo, que inclua abandonar o Euro e, se for necessário, a UE. E isso não em nome de uma autarcia cubana, como quer o PCP, ou de um PS dirigista, intervencionista e despesista, como quer, mesmo que diga não querer, o Prof. Ferreira do Amaral (a quem tiro, com respeito, o meu chapéu), mas em nome da reforma do Estado por fazer, do crescimento económico sem paternalismo nem dirigismos e da independência na medida do que as circunstâncias permitirem - mas não mais do que isso.
Vai suceder? Claro que não. O mais provável é, com a aterrorizada conivência da Europa, o governo pôr em banho-maria até mesmo o módico de reformas que tem querido fazer, alargar um furo ao cinto da austeridade, e trombetear optimismo. E não é impossível que o BCE e a nova Comissão Europeia sejam compreensivos, na exacta medida em que a Alemanha e satélites deixem.
Deixarão? Suponho que sim, moderadamente. Chegará? Suponho que não, e assim o que o futuro nos reserva é balbúrdia.
De qualquer forma, ele, o futuro, sucederá apenas de uma maneira, e há inúmeras de o prever. Donde, a probabilidade de errar é grande. Conto com isso.
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