As sondagens dão ao António Costa mais de 40% de intenções de voto, aos adversários internos, inimigos na terminologia sábia de Winston Churchill, da liderança do PSD nos últimos anos um argumento para a derrubar, e aos militantes que lhes vão na conversa um incentivo para acreditar neles. Dizem que o governo do António Costa é forte e a oposição de direita fraca.
São os mesmos mais de 40% que as sondagens lhe deram até poucas semanas antes das eleições de 2015, que ele acabou por perder com 32%. Resultado para que as sondagens convergiram correctamente nas últimas semanas da campanha eleitoral. Mas não vale a pena argumentar contra a fiabilidade delas com base na hipótese de, do sentido e da amplitude do erro verificado em 2015, se dever deduzir que, com sondagens muito semelhantes, o governo do António Costa está tão forte como a derrota que conseguiu em 2015 e a oposição de direita tão fraca como a vitória que conseguiu nessas eleições. Quem quer acreditar que o governo está forte e a oposição de direita fraca, ou fingir que acredita para efeitos de luta interna nos partidos da oposição, não se demoverá de arrumar esta hipótese como hipotética e especulativa. E eu já tenho idade suficiente para perceber que não vale a pena discutir assuntos de Fé com Crentes, e considerar mais eficaz, além de mais económica, a estratégia argumentativa de "depois falamos".
No entanto, elas falham...
Como eu não sou adepto de teorias da conspiração não vou pela justificação de as sondagens serem manipuladas para darem os resultados desejados por quem as encomenda. Esta explicação foi abundantemente usada, por exemplo, pelos adeptos do Donald Trump para apreciarem as sondagens que, até à última hora, previam uma vitória folgada da Hillary Clinton, com a acusação de serem tendenciosas com a intenção de enganarem o eleitorado e o levarem a votar nela. Este efeito de adesão dos eleitores ao que acreditam, nomeadamente pelos resultados das sondagens, ser a posição maioritária, que os académicos designam por bandwagon effect, que sustenta as suspeições sobre a honestidade das sondagens, está longe de estar provado. Eleições como as legislativas de 2015 em Portugal, em que as sondagens andaram com o António Costa ao colo desde que substituiu o António José Seguro como candidato socialista a primeiro-ministro, mas acabaram por resultar numa derrota do vencedor das sondagens não o confirmam. Mas o que interessa para a crítica das teorias da conspiração é que as sondagens encomendadas pela equipa de campanha do Trump faziam exactamente as mesmas previsões que as encomendadas pelos mainstream media, um neoinsulto na linha de neolibrais, que promoviam a adversária.
Não é, acredito eu, pela manipulação dos resultados que as sondagens falham.
Mas esta notícia da capa do Expresso, e perdoem-me os leitores se me fico pelos títulos gordos da capa, mas os honorários que recebo como blogger não pagam a estopada de ler integralmente todos os artigos de jornal que cito, tem uma pista que ajuda a compreender onde falham as sondagens.
Não é na parte de 41% dos portugueses pretenderem o voto obrigatório mesmo para os que, em consciência ou fora dela, mas em liberdade de escolha, escolhem a abstenção. Faz tanto sentido pensar que tornar o voto obrigatório aumenta a adesão dos cidadãos à democracia, como pensar que obrigar os casais a uma frequência mínima de rituais de acasalamento, seja diária, semanal, mensal ou anual, aumenta a natalidade. São apenas idiotas que gostam de interferir na liberdade dos outros. Adiante, para não dizerem que tenho mau feitio, e para não converter o resto da conversa para o dialecto minhoto, ao qual décadas de experiência me deram um domínio razoável.
É na de 84% garantirem ser votantes habituais.
É que nas eleições no mundo real o número de votantes não chega a 60%. O que significa que as sondagens são realizadas sobre amostras que não são representativas do universo eleitoral. Na amostra desta sondagem 84% dos respondentes dizem que votam habitualmente, mas nas eleições votam apenas cerca de 55%. Ou, 84% dos respondentes fazem parte dos 55% que votam, e apenas 16% dos respondentes representam os 45% que não votam.
Isto pode resultar de um erro de amostragem, como seria num exemplo extremo realizar os inquéritos à porta da sede do PS no Largo do Rato, e se fosse erro de amostragem significaria falta de profissionalismo ou de honestidade das empresas que realizam as sondagens.
Mas tem provavelmente uma razão diferente que não pode ser compensada com maior profissionalismo: as pessoas que votam têm mais propensão a aceitar responder a sondagens do que as pessoas que não votam. Ou, nas sondagems sobre intenções de voto, as pessoas que votam no PS têm mais propensão a aceitar responder a sondagens do que as que votam nos partidos da direita. Ou, à medida que se aproximam as eleições, pessoas que anteriormente não estavam dispostas a responder a sondagens começam a aceitar responder, o que faz o resultado das sondagens convergir gradualmente para o das eleições.
Tudo isto podem ser hipóteses realistas ou especulativas. Mas a verdade é que não há 84% de eleitores que votem habitualmente. Nem, digo eu, 40% que tencionem votar no António Costa nas legislativas de 2019.
Depois falamos.
Ah, já me esquecia de dizer uma coisa importante. Num contexto político em que a maioria de esquerda implodiu a possibilidade de governar com maiorias relativas, o que tem uma certa piada por esta possibilidade ter sido implodida pela mesma esquerda que sempre defendeu que as maiorias absolutas propiciavam a tentação do poder absoluto e eram um perigo para a democracia, talvez por até 2005 só ter havido maiorias absolutas da AD do Sá Carneiro e do PSD do Cavaco Silva, os partidos da direita que não vão regressar ao poder sem maioria absoluta, de um só ou dos dois em coligação, têm mais vantagem em colaborar para conseguirem em conjunto maiorias absolutas do que em competir para distribuirem entre si maiorias relativas que serão minorias absolutas.
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