Eduardo Cabrita, um deputado geralmente cordato do PS, escreveu o seguinte: "A frígida Maria Luís encarregou-se de dizer em Bruxelas que a conversa de Portas era só agitação".
Shyznogud, uma blogger que sigo com curiosidade e gosto, e António Araújo, um blogger que sigo com prazer e proveito, ficaram indignados. A primeira não se dá ao trabalho de dizer porquê, o segundo remetendo para a definição médica de frigidez e exigindo pedido de desculpas do atrevido à destinatária (e ao público, presumivelmente).
Sucede que o que o deputado em questão disse é adequado ao comportamento público da ministra, se adoptarmos uma das definições que de frígido dá o dicionário: demasiadamente frio; gelado; álgido. Basta ter visto a imperturbável reacção da governante, numa reunião da Comissão de Inquérito aos Swaps, em 30 de Julho passado, em resposta às teimosas e malcriadas insistências do deputado Paulo Sá (ver no Canal Parlamento, Arquivo, a partir das 2H08), para lhe compreender, e admirar, a algidez: outro qualquer sugeriria que o senhor deputado fosse dar uma volta ao bilhar grande. Maria Luís tem, ou afecta ter, o que para o caso é igual, uma pétrea serenidade em todas as situações.
Isto não é defeito, é feitio. E, no que me diz respeito, uma característica positiva num governante: a lágrima ao canto do olho, a emoção fácil, o feitio exaltado, podem ser compreensíveis e até simpáticos; mas não qualificam ninguém para coisa alguma.
Eduardo Cabrita queria mesmo fazer insinuações sobre a vida sexual da ministra? Duvido, e acho que permitindo o que escreveu interpretações mais amenas são estas que devem ser adoptadas. Porque, senão, entraremos na fiscalização da linguagem, uma horrível mania importada da América. E se amanhã alguém disser que o deputado Helder Amaral vê o futuro negro, estará a fazer uma afirmação racista; e se disser que Seguro é impotente para controlar o PS, ou que a deputada Fulana tem posições promíscuas, ou que o ministro xis está de quatro perante a troica, uma insinuação sexista.
Não precisamos disso.
Vivemos "à beira do abismo". Um destes dias, um bater de asas desencadeará a explosão do Vesúvio, do Santorini ou do Krakatoa, um novo e mais devastador Katrina ou, com maior probabilidade, o maremoto de 1755.
E, todavia, seria tão fácil evitar: bastaria votar no PS.
É o que aqui se defende. "Eleições antecipadas, já".
Faz tempo que, graças a Deus, não via notícias sobre Leal da Costa, o Savonarola que, no Governo, tomou sobre si a missão de nos defender de nós próprios a golpes de proibições e coimas.
A propósito de uma greve de médicos, o governante em questão declarou no Parlamento, em Junho de 2012, que "um grande grupo de portugueses não tem emprego e um grupo de privilegiados como os médicos não quer trabalhar, vão fazer greve e não têm razão para isso".
Depois daquela, já houve 19427 greves, governantes disseram coisas no Parlamento e fora dele cerca de dois milhões e oitocentas mil vezes, uns saíram e outros entraram (Leal permanece, com grande benefício para o País e dano para o seu portfolio de doentes), mas a Justiça seguiu a sua implacável marcha.
É que 60 (sessenta) médicos não levaram a bem a declaração de Leal e apresentaram queixa, com fundamento no nº 3 do art.º 128º do Código Deontológico dos senhores médicos, que reza assim:
"O médico não deve fazer afirmações ou declarações públicas contra colegas".
Fizeram muito bem estas cinco dúzias: que a redacção é admirável na sua granítica singeleza, e Leal, efectivamente, manifestou-se contra colegas.
Assim não o entendeu a relatora do processo (não pude apurar se é médica ou jurista) que, em Setembro passado, veio em menos de uma página propor o arquivamento.
Ana Matos Pires, a quem fico penhorado pela divulgação desta história, tem dúvidas sobre a bondade do articulado em questão, mas nem por isso apreciou a proposta, entre outras razões porque quem respondeu no processo foi o chefe de gabinete do Secretário de Estado, e não o próprio; e - mas isto já é processo de intenção meu - sendo um membro deste governo, por definição, celerado, e a greve algo que não se pode discutir, o arquivamento sem mais está irremediavelmente ferido de não sei quê.
Por mim, fiquei a meditar no que terá levado a que um assunto aparentemente tão simples tenha consumido mais de um ano para chegar a termo; e, como não estão tribunais envolvidos, admito que a relatora, ou outras pessoas no Conselho Disciplinar do Sul, tenham estado doentes, pelo que folgo em ver que recuperaram.
Quanto ao fundo da questão, a Ordem bem poderia, numa próxima revisão, eliminar aquela funesta redacção. Que o Tribunal Constitucional não tem por certo dúvidas sobre o direito à greve; mas não as terá também sobre o direito à liberdade de expressão e opinião.
Eles fecham, despedem jornalistas, pagam mal a fornecedores, aos próprios jornalistas e articulistas, eliminam as edições em papel ... um novo jornal é, em princípio, uma boa notícia. E ainda por cima grátis para quem o quiser ler, uau.
Mas a publicidade é um pouco equívoca. É em papel ou não é em papel? Que com o iPad ainda não se embrulham castanhas nem se acende a lareira. E é para andar nas paredes, de mão em mão, e de boca em boca?! Ó chefe, nas paredes só se for para não sujar os lambris quando se refresca a pintura - isso é raro, o stock de jornais velhos chega perfeitamente. E de mão em mão, vírgula: que muitos de nós não querem papéis sebentos.
De boca em boca deve ser sentido figurado - está bem. Mas para isso quer-se notícias fresquinhas, opiniões inovadoras, e aspecto atraente. Ora, que diz o editorial? Diz isto:
A paz, o pão,
Habitação,
Saúde, educação.
Só há liberdade a sério quando houver
Liberdade de mudar e decidir
Quando pertencer ao povo o que o povo produzir.
Acho, snif, que vai falir. Que jornal da Associação Portuguesa de Arqueólogos já há.
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