Tenho lido muita opinião sobre a última decisão do Tribunal Constitucional. Mas quer sejam opiniões de juristas, economistas, ou até alergologistas, como no meu caso, sempre quem está à direita está contra a decisão e à esquerda a favor.
Sempre, vírgula: que pelo menos uma surpreendente excepção conheço, de um constitucionalista e socialista, que, tranquilamente, com argumentos pela sua maior parte jurídicos, censura a sentença, aqui. Tiro-lhe por isso, com respeito, o chapéu que, retoricamente, raramente despego da cabeça. Não por concordar, como concordo, mas pela raridade do pensar, e pensar bem, desalinhado.
Isto vem confirmar-me nas suspeitas que sempre tive, e que se aplicam ao TC desde que este entrou em rota de colisão com o Governo (ou ao contrário) e que, num post seminal, enunciei assim: Que se me não fale de argumentos jurídicos e subtilezas escolásticas. Porque é sempre possível construir raciocínios jurídicos diferentes mas igualmente impecáveis na sua fundamentação, consoante os princípios que se escolhem para nortear a conclusão.
Acrescento o seguinte:
A maior quebra de autoridade do Governo não lhe vem de, na situação de aperto do País, ir ao bolso de pensionistas e reformados; vem-lhe, na minha opinião, de fazer isso sem nunca ter sido verdadeiramente convincente no corte de despesas do Estado, por poupar o que não devia ser poupado (RTP e fundações, por exemplo, de uma extensa lista de parasitagens sortidas) e por não se ter dado nunca ao trabalho de explicar, em termos perfeitamente inteligíveis mas que não implicassem necessariamente descer ao detalhe ou à inconfidência, por que razão na renegociação de contratos no âmbito das PPPs, ou swaps, ou quaisquer outros que envolvam bancos ou instituições, em particular se estrangeiros, tem, se tem, as mãos atadas.
Os tribunais em geral, e o Constitucional em particular, servem para defender o cidadão do abuso, seja de outros cidadãos seja do Estado. A nossa perversa Constituição, porém, faz com que o Tribunal que privilegiadamente a interpreta sirva muito menos para defender o cidadão do Estado e muito mais para defender os supostos direitos adquiridos de uns contra a obrigação forçada de outros. Devemos este texto iníquo a todos quantos o aprovaram em 1976, e ao PS que sempre arrastou os pés para o rever.
Talvez o TC, com o golpe de asa que não tem, pudesse perceber que se pode interpretar bem um texto mau, indo buscar ao extenso catálogo dos princípios os que o bom senso manda, mesmo que circunstancialmente pareçam de direita.
Os senhores juízes, porém, deixaram-se inquinar pela interpretação autêntica, em vez de adaptar o texto ao estado de necessidade do País. Talvez, numa próxima revisão, se pudesse incluir uma tabela de princípios, indo buscá-los à doutrina e hierarquizando-os: se o legislador quer interpretações de funcionários o melhor é não deixar nada ao acaso.
Boa tarde,
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Atenciosamente,
Catarina Osório
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De Fátima Mendes a 21 de Dezembro de 2013 às 17:34
Quem assim fala ou é um absoluto ignorante (a nossa constituição consagra os direitos fundamentais que são cumpridos religiosamente por países como a Alemanha, a Dinamarca, A Suécia, a França etc. )
ou então é um neoliberal oportunista.
Abjeto
De MEN a 21 de Dezembro de 2013 às 19:17
Concordo, em absoluto com a Catarina Osório. O mais provável e que a Fátima Mendes não conheça sequer quais são os direitos fundamentais a que alude. Trata-se de uma interpretação de um órgão que já se tornou num senado político. Concordo que não temos outra solução que não respeitar a decisão, porque estamos em democracia e é a constituição que temos (sociedade socialista). Contudo será sempre a interpretação de uns quantos senhores juízes com um estatuto ímpar em Portugal e até na Europa, com direitos adquiridos que ninguém há-de tocar, até porque eles não deixam.
Resolvo-lhe a hesitação, minha ácida Fatinha; sou relativamente ignorante (não absolutamente) e liberal (não neo, é mesmo o artigo genuíno). Agora, oportunista é que não estou a ver como e abjeto não sei o que é. E a Fatinha, é o quê? Peixeira?
De Makiavel a 21 de Dezembro de 2013 às 20:33
Argumentar que a Constituição foi aprovada em 1976, esquecendo as diversas revisões de que já foi objecto posteriormente, é de um oportunismo (liberal, neo-liberal, ou outro) que só colhe entre os mais distraídos. Assim como realçar a opinião de Vital Moreira, em contraponto com a opinião menos abonatória (a roçar a insinuação torpe acerca da honorabilidade de todos os juízes do TC) só revela desorientação e falta de argumentação digna desse nome nas hostes dos liberais de bolso cá do burgo. Estamos perante um manifesto caso de aplicação do princípio de Peter - nem de propósito: ao ser eleito, Passos Coelho foi promovido ao seu nível de incompetência. Que volte para os seus negócios, que só está a agravar a situação do país.
De José C. M. Velho a 21 de Dezembro de 2013 às 20:44
A primeira Constituição apareceu ainda nos tempos da monarquia, em 1822 e seguiram-se muitas outras: em 1826, 1838, 1911, 1933 e a de 1976, esta já com 7 revisões: em 1982, 1989, 1992, 1997, 2001, 2004 e 2005. Antes de haver Constituição os reis faziam o que queriam, quando queriam e como lhes desse mais vontade e benefício. Hoje encontramos gente a pensar como reizinhos de há muitos séculos. Estou parvo! Saiba-se, por fim, que há Constituições em quase todos os países do Mundo, desde há muitos anos e com constantes adaptações aos novos tempos, tal como a de Portugal, sempre atualizada. É necessário atualizar mais? Pois atualize-se e depois cumpra-se dessa forma mas enquanto não houver outra previsão é a que temos e é a essa que devemos obediência, tal como podíamos conduzir à esquerda, como no Reino Unido, mas como o nosso Código da Estrada nos obriga a conduzir à direita é assim que cá temos que conduzir até que se mude o código e este nos permita conduzir pela esquerda, pelo meio ou por outro lado qualquer. A lei fundamental de um país (Constituição) serve para regular todas as leis provisórias dos governos temporais desse mesmo país e as constituições existem precisamente para esse fim, para verificar se os governos agem de acordo com essa norma fundamental que juraram cumprir e obedecer aquando da tomada de posse. Por fim note-se que foi o próprio Presidente da República quem pediu ao Tribunal Constitucional que verificasse se as normas estavam ou não de acordo com a Constituição, porque ele próprio pensava que não estavam. note-se que não foi a oposição nem eu, foi o próprio Presidente da República, o amigo e a sustentação deste Governo, quem pediu a intervenção do Tribunal e também não foi o Tribunal que decidiu andar a apreciar a coisa, aliás, os tribunais só apreciam aquilo que lhes põem à frente para apreciar, porque é assim mesmo que os países funcionam e não de outra maneira. Alteremos a Constituição e ponha-se lá que quem aprecia da constitucionalidade das leis são os autores dos blogues e seus comentadores e não cerca de uma dúzia de juízes próprios para esse fim, pois esses certamente nada, mas mesmo nada, conseguem interpretar e pronto, temos o problema resolbido. Chama-se a isto fazer uma convergência das interpretações, cortando o benefício das interpretações a alguns poucos de forma a que todos os demais possam interpretar e decidir o que é ou não é e quando, isto é, agora sim, agora não, agora interpreto assim e amanhã assado. Arranje-se outra maneira de funcionar e então teremos outra maneira mas para já é esta a que temos. A Democracia não é o melhor dos sistemas, pois não, mas é o melhor dos sistemas que conhecemos e que, para já, podemos ter.
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