Quinta-feira, 28 de Novembro de 2013

Quem avisa amigo é

Francisco (não o de Assis, o de Roma) declarou à comunicação social portuguesa, por inspiração do dr. Mário Soares:

 

1) A dívida pública deve ser renegociada para um prazo mínimo de cinquenta anos, a uma taxa de juro não superior àquela a que se financiar o Estado Alemão, e com reembolsos de capital indexados ao comportamento das exportações;

 

2) Deve ser suspenso o plano de privatizações e substituído por um plano de nacionalizações, nomeadamente daquelas empresas privadas que se verifica terem uma posição dominante no respectivo ramo, das que se encontrem em situação de oligopólio ou de outras sobre as quais seja legítimo suspeitar que venham a encontrar-se naquelas situações; as nacionalizações deverão obedecer ao princípio de que ao valor de mercado se devem abater os dividendos e prémios distribuídos aos actuais e pretéritos accionistas, nos últimos 20 anos, e de que as indemnizações serão pagas em títulos de dívida pública, a vencer dentro do prazo referido em 1);

 

3) Devem ser suspensos todos os cortes de salários, pensões, subsídios e benefícios sociais, e reposta a situação ex ante;

 

4) O salário mínimo deverá ser aumentado para 550 Euros e todos os anos revisto em percentagem superior à da inflação, a acordar com os parceiros sociais;

 

5) Os contratos no âmbito das PPPs, e os remanescentes no âmbito dos SWAPs, deverão ser renegociados à luz dos seguintes princípios; a) O lucro líquido originado por tais contratos deverá ser taxado em, pelo menos, 70%; b) As partes estabelecerão um plano de taxação retroactiva, de modo a garantir que os ganhos até agora obtidos sejam objecto de igual contribuição; a denúncia, quando o Estado por ela opte, não confere direito a qualquer indemnização;

 

6) É fixado um salário máximo, de montante igual a doze vezes o valor do mínimo;

 

7) É criado um imposto extraordinário de 70%, incidente sobre grandes fortunas, entendendo-se como tal as daqueles agregados familiares cujos activos sejam superiores a 500.000 Euros;

 

8) A reforma do Estado deve prosseguir, à luz dos seguintes princípios: a) Não poderá haver despedimentos, nem mobilidade, sem o acordo do trabalhador; b) Não poderão extinguir-se serviços, salvo se as respectivas competências e pessoal forem afectos a outros serviços, e sem prejuízo da necessidade da aceitação dos trabalhadores, em caso de deslocação;

 

9) Fica proibida a evasão de capitais;

 

10) As empresas cujo capital seja maioritariamente detido por nacionais, ou que realizem em território nacional a maior parte do seu volume de negócios, deverão ter a sua sede em território nacional;

 

11) Pelo menos 1% do Orçamento deverá ser sempre afecto à Cultura:

 

12) O Presidente da República, ouvido o Conselho de Estado, deverá dar instruções ao BCE para financiar directamente o Estado Português, e ao mercado internacional para adquirir dívida pública no mercado secundário, a taxas não superiores às referidas em 1);

 

13) Após a diligência referida no ponto 12) deverá o Presidente dissolver a Assembleia e convocar eleições, às quais só poderão concorrer partidos que subscrevam sãos princípios de defesa da Constituição e do povo trabalhador. Apurado o resultado, instalada a nova Assembleia e conferida posse ao novo governo, o Presidente demitir-se-á, marcando eleições para a presidência da República nos termos constitucionais.

 

Se por algum imponderável isto não se fizer, o nosso País, filho dilecto da Igreja, será palco das maiores violências. Pelo menos é o que, com grande senso e não menor verosimilhança, se diz aqui

publicado por José Meireles Graça às 21:37
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Quarta-feira, 27 de Novembro de 2013

Soares pós-Soares

Daqui a meia centena de anos não haverá ninguém que se lembre, por ter sido contemporâneo, do 25 de Abril, do que se lhe seguiu, da luta para evitar a russificação, da descolonização, da amarração de Portugal à jangada europeia, das personagens.

 

Sobre o que houver então o nosso passado e presente de agora projectarão sombras. E será o tempo dos historiadores: nunca se entendeu o presente, e muito menos se pôde futurar seja o que for, sem memória, uma verdade como um punho que muito cultor de ciências sociais ignora.

 

O futuro especialista do Portugal do último quarto de século e do primeiro deste tropeçará fatalmente em Mário Soares, por causa da descolonização, do regime democrático e da adesão europeia; e não tropeçará, com o mesmo grau de importância, em mais nenhum actor. Goste-se ou não se goste, é assim.

 

Não é porém do Mário Soares histórico que quero falar: esse declinou na sua importância com a adesão à CEE, já tinha cumprido a maior parte do seu papel quando chegou a Presidente da República, e morreu no fim do seu segundo mandato. Os episódios das candidaturas falhadas a presidente do Parlamento Europeu (cuja concorrente insultou) e de novo à Presidência da República, aos 80 anos, fazem parte da decadência.

 

Mário Soares não soube envelhecer. Deixou de entender o mundo que o rodeia, que não aceita, e a procura de um lugar ao sol da notoriedade e importância têm-no levado a lançar mão de todos os recursos de velho manhoso do jogo político, capaz de todos os truques e cambalhotas, a ponto de hoje os seus amigos (ou os que ele assim julga) serem em boa parte inimigos de ontem, que o aproveitam como alavanca.

 

A idade, que lhe retirou lucidez, acrescentou-lhe à desvergonha: Soares acha que pode incitar à violência, nomear-se procurador do poder local, gesticular na defesa da "cultura" e tachar todos os que não veem o momento presente da mesma forma estreita, obsoleta, facciosa e economicamente analfabeta que é a sua, como "especuladores da comunicação social, ao serviço do Governo" e "ao serviço do poder, para ganhar dinheiro".

 

Portas? "Um artista"; Cavaco? "Aconselhe-se com a esposa, que, como antiga professora, tem cultura".

 

É esta a prosa chula que assina num artigo prolixo e desenxabido no Diário de Notícias.

 

Nenhum homem é um grande homem para o seu criado de quarto, disse Eça algures, citando não sei quem. O Soares homem público de hoje perdeu há muito a grandeza e o que decerto já lá estava ficou exposto à comiseração de todos e ao aplauso da esquerda obtusa, para que se possa ver o que só alguns criados conheciam e alguns inimigos adivinhavam. 

publicado por José Meireles Graça às 21:43
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Terça-feira, 26 de Novembro de 2013

Homem velho, homem novo

Eis o verdadeiro problema da integração europeia: tendo baseado a sua legitimação e a sua popularidade nos resultados durante décadas (crescimento, aumento do bem-estar, abolição de fronteiras, etc.), a sua aceitação é posta em causa quando ela entra em crise e deixa de providenciar as vantagens que tradicionalmente proporcionava. Depois da crise, a União Europeia precisa de uma base de legitimação democrática mais funda, mais genuína e mais estável. A União Europeia precisa de criar europeístas não somente para os tempos das "vacas gordas" mas também para os tempos difíceis, por sobre os tempos e as circunstâncias -- ou seja, europeístas para todas as estações.

 

As eleições europeias são a melhor sondagem sobre a aceitação do governo do dia e a força relativa dos partidos: não há cá entrevistas telefónicas a 432 pessoas, nem margens de erro, nem dúvidas originadas em resultados diferentes da sondagem ao lado, ou de uma semana antes, ou de uma semana depois.

 

Isto é um grande benefício; e não é o único: as direcções partidárias livram-se de militantes prestigiados e incómodos, ou premeiam dirigentes que precisam de férias e de melhorar o passadio.

 

E eles lá vão para o shuttle Bruxelas/Estrasburgo, aprender inglês ou francês e a gostar de moules, bem como amealhar uns cobres para os dias maus, que a pátria ingrata e miseranda paga mal e regateado aos seus políticos domésticos.

 

Os meus concidadãos não ligam a ponto de um corno ao Parlamento Europeu, intuindo que aquela porra não produz nada de útil: não sabem quem são os deputados (nem sequer os portugueses - eu mesmo, assim de repente, sei lá quem é que o PCP meteu), não veem debates ou sessões, ignoram o que lá se discute e nunca ouviram falar das estrelas locais, parlamentares e governamentais, com excepção talvez do simpático Schulz, aquele tipo com aspecto de professor Tournesol e paleio a condizer (Van Rompuy, para os cognoscenti) mais o outro ferrabrás que fala inglês como um martelo-pilão e que, por causa da troica, nos polui volta e meia a pantalha, Olli Rehn de seu nome. Sem esquecer o muito nosso Mr. Barrôsô, um artigo de exportação afamado, quase tanto como a cortiça de que é feito.

 

É claro que os meus manhosos concidadãos sabem alguma coisa do assunto, isto é, que da Europa recebemos mais do que para ela contribuímos. E agradam-lhes as autoestradas, a ausência de fronteiras, o não terem que cambiar fora de portas uma moeda que mais de uma década atrás nos envergonhava, e a longa lista dos progressos materiais que a realidade nuns casos, e a crença noutros, atribui à proto-federação.

 

Enquanto a Europa pingar, daqui não lhe vem perigo. Mas Vital Moreira sabe que o sentimento popular no seu rincão não é exactamente o mesmo que noutras paragens; e, não ignorando o descontentamento crescente, não lhe ocorre que talvez haja alguma coisa de fundamentalmente errado com aquilo que defende, desde logo porque o crescimento e aumento de bem-estar que refere são muito da CEE e quase nada da UE. Mas não, não é preciso parar para pensar. O que é preciso é um homem novo.

 

O homem que há é sempre o velho. Mas isto Vital não sabe. Nunca soube.

publicado por José Meireles Graça às 23:25
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Das fraldas e Godot

Duas datas próximas muito importantes para a Itália:

 

27/11/2013 - O senado vota a "decadenza" de Berlusconi que marcará o fim da imunidade parlamentar e o início de cumprimento de pena do senhor. De seguida irá cumprir serviço cívico e fala-se por aqui que os serviços sociais lhe darão muitas fraldas de pessoas idosas para trocar. Haverá destinos piores.

 

08/12/2013 - O Partido Democrático vota em primárias abertas a todos os cidadãos a eleição do próximo secretário-geral e candidato a primeiro-ministro. Na linha está Matteo Renzi, a esperança que se segue para revolucionar a Itália (uma improbabilidade no país mais conservador do mundo ocidental, mas a única esperança).


De resto a vida política segue igual a sempre: discussões eternas, guerras intestinas e zero de avanço nas reformas de estado. Todos à espera de Godot, ou seja, de Matteo Renzi. Veremos se chega.


O Gremlin dará notícias.

publicado por João Pereira da Silva às 16:10
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Cherry picking

 

DN, 26 de Novembro de 2013: "Frente Comum defende greves para repor horário. A coordenadora da Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública disse hoje não compreender a aprovação pelo Tribunal Constitucional do alargamento do horário de trabalho, alegando que o valor dos salários será reduzido e apelou para a realização de greves."

 

STAL, 3 de Setembro, 2013: "Tribunal Constitucional chumba despedimentos na Administração PúblicaExigindo a demissão de um Governo que repetidamente espezinha a Constituição da República e pressiona o Tribunal Constitucional, a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública, na qual o STAL se integra, recorda que, em pouco mais de dois anos, o Governo PSD/CDS-PP já provocou cinco declarações de inconstitucionalidade."

 

publicado por Ana Rita Bessa às 12:07
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Segunda-feira, 25 de Novembro de 2013

Gato carente

Em 19 de Maio último houve uma manifestação espontânea no Marquês, em substituição da grandiosa que a nação benfiquista aprazou para o mesmo local, por não se ter verificado o resultado desportivo que seria o pretexto da segunda.

 

No dia seguinte, o movimento Que se Lixe a Troica manifestou-se em frente ao Palácio de Belém, para protestar contra as medidas de austeridade e a actuação do Presidente da República, bem como para exigir a demissão do Governo.

 

Já houve manifestações no Terreiro do Paço, no Porto de Lisboa, no Largo do Camões, na Ponte 25 de Abril e em numerosos outros locais, para não falar dos desfiles, passeatas e arruadas que com regularidade entopem a Baixa.

 

A mais famosa de todas as manifs, porém, teve lugar em 19 de Julho de 1975, quando Soares se dirigiu à multidão na Fonte Luminosa, um episódio importante do enterro do PREC.

 

Quer dizer que há uma certa concorrência entre locais. Talvez por isso, a senhora Presidente da Assembleia da República confidenciou, sobre a manifestação das forças de segurança nas escadarias da Assembleia da República, quinta-feira passada, que "o Parlamento tem orgulho em ser a casa, a porta, a que todos batem". E acrescentou: "O facto de as manifestações se repetirem muito, junto ao Parlamento, significa que a Assembleia tem um valor sagrado, que é o lugar da esperança".

 

Eu não iria a ponto de considerar a Assembleia um lugar de esperança - isso será a igreja da nossa devoção ou o quiosque onde compramos o Euromilhões. Mas que tem um valor de sagrado civil - tem: é a morada do Poder Legislativo, sede física do Estado de Direito.

 

Sucede que o que os polícias praticaram no local foi uma ilegalidade. E dela, com a demissão do respectivo Comandante, as autoridades competentes já começaram a tirar as devidas ilações. Pense-se o que se pensar sobre o que os polícias reclamam (o que, aliás, está ausente das notícias, diluído naquele magma do "contra a austeridade e o Governo") não é tolerável que ofendam a lei que existem para defender - isso chama-se subversão.

 

A senhora Presidente gosta de ser boazinha e dizer coisas simpáticas. Mas é a segunda figura da hierarquia do Estado e não está menos obrigada que os polícias a defender a legalidade.

 

Conviria por isso guardar a ternura e a bondade para o seu gato, se o tiver. 

publicado por José Meireles Graça às 12:37
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Sexta-feira, 22 de Novembro de 2013

Podia ser que percebesse

Vi a Quadratura em diferido, dado que ontem à hora da emissão valores mais altos se alevantaram.

 

O tema principal foi o Tribunal Constitucional, com o desempenho habitual dos protagonistas: Pacheco espumando ódio aos responsáveis políticos actuais, culpados de o ignorarem, e, no caso do Primeiro-Ministro, também por às vezes ter sorrisinhos enquanto vai fazendo maldades, Costa rebrilhando de satisfação porque todos os dias se sente mais próximo de um destino glorioso, e dizendo aquelas coisas redondas que sabe dizer; Lobo Xavier suando as estopinhas para ir salientando algumas evidências sem ofender nenhum dos parceiros.

 

Já perto do fim, Pacheco rapa de um argumento de tomo: imaginem que um governo chavista (sabem, aquele de Chávez) resolvia confiscar 70% dos bens de todos os ricos por causa da situação difícil do país; diriam que isso ofendia o direito de propriedade, constitucionalmente protegido, sim ou não? Por que razão então acham mal que o Tribunal se oponha ao confisco dos rendimentos de uma maioria (a que menos tem) da população?

 

Pacheco ficou sem resposta, porque o tempo não chega para tudo, e chegou a vez de Costa falar, que veio a despropósito com uma historieta sobre a hierarquia das leis.

 

Sucede que a propriedade é rendimento disponível (pós-impostos) passado e investido, em vez de consumido; e o rendimento é actual e futuro. Donde, confiscar a propriedade não é a mesma coisa que impostar o rendimento, do trabalho ou de outras fontes. Depois, o que o Governo tem feito é cortar nas despesas do Estado, a eito e criticavelmente decerto, mas pouco; e aumentando os impostos - muito. Mas isto não é o cavalo de batalha de Pacheco, as suas investidas são outras:

 

Gosta muito de Cavaco, que todavia entende não fazer o que deve; quer a demissão do Governo, que tem apoio parlamentar maioritário, para, em nome da estabilidade, termos um novo, que não o terá; dá a sua caução à reunião da Aula Magna, mas não é comunista, nem revolucionário, nem soarista, nem da CGTP, nem abrilista; quer que o país pague o que deve, e que se mantenha na UE e no Euro, mas sem recessão; que se reforme o Estado, mas sem despedimentos nem cortes de salários; e, sobretudo,

 

Quer eleições, mas não quer saber do PS, que acha um desastre, para nada. Parece que, em havendo eleições, surgirá um novo Primeiro-ministro do PSD, da facção pachequiana, possivelmente Manuela Ferreira Leite, não obstante as ganhar o PS, o qual, entretanto, depois de consultado Pacheco, se livrará da não-pessoa que actualmente o capitaneia.

 

Tudo isto é muitíssimo subtil. Quem me dera ser filósofo, morar na Marmeleira, e ser especialista na história do PCP - podia ser que percebesse.

publicado por José Meireles Graça às 21:52
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A pátria, o futebol, o refrigerante e o boneco do jogador

A TAP quer agradar aos clientes que apreciam água choca acastanhada e açucarada e faz muito bem: é uma boa parte deles, não podem ser ignorados, e se fossem a preocupar-se em satisfazer minorias em vez da maioria, teriam que oferecer verde tinto sem marca, portanto ilegal e apenas com o selo da fidelidade dos conhecedores da quintarola de origem, a alguns apreciadores, o que levantaria problemas logísticos e com a ASAE.

 

Eu cá não defendo ilegalidades, excepto quando defendo, em obediência ao bordão dos meus concidadãos: dura lex, sed bardamerdam.

 

Nas minorias, há também a dos que apreciam piadas de mau-gosto. Não todas - só as que tiverem piada. E como é que se sabe quais as piadas que têm piada? É fácil - dão vontade de rir.

 

Apreciei o boneco mal parido do Ronaldo atravessado num carril, uma alegoria foleira mas que traduzia bem, simbolicamente, as intenções e o desejo dos suecos que gostam de futebol.

 

Podia agora um desses cartunistas que trabalha para os jornais desportivos representar o bom do Ibrahimovic com um carril enfiado numa cavidade que, sem grande esforço criativo, pudesse admitir uma tal intromissão.

 

Não teria a mesma graça, por ser um eco. No entanto, vá lá, estava ao mesmo nível.

 

Mas não: a dignidade nacional entrou em convulsões espásticas, há abaixo-assinados, a Pepsi apresenta desculpas, ai credo que estão a ofender o nosso Portugalzinho do coração.

 

Sucede que Portugal não arriscou nada, não ganhou, nem perdeu, coisa alguma em Estocolmo; e isto seria ainda verdade mesmo que a esmagadora maioria dos portugueses gostasse de futebol, o que não acontece: mesmo os que gostam não chegam para encher os estádios disponíveis, que se distinguem, salvo nos derbys (um termo reservado para os jogos em que intervêm clubes com alto grau de equivalente influência na arbitragem), por vastas clareiras às moscas.

 

Eu gosto de futebol e aprecio os jogos da selecção; não gosto é de patrioteiros; nem de gente que aplaude alienações de soberania sem pestanejar, ao mesmo tempo que se indigna com um desenhinho insignificante de um artista ignoto, para ridicularizar um grande jogador que, esse sim, deu, sem protestar nem abrir a boca, a melhor resposta que se podia dar.

publicado por José Meireles Graça às 11:48
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Quarta-feira, 20 de Novembro de 2013

Unanimismo chato

Houve um tempo em que uns maduros faziam artigos sábios recomendando a saída do Euro. Excepto pelo detalhe dos sábios, fui um desses. E, como os mais, tenho estado calado. O meu silêncio não precisa de ser interpretado; o dos outros sim.

 

Ocorrem-me cinco razões:

 

i) Os povos dos países aflitos não querem sair. Pode a economia cair ou não arrancar, o desemprego atingir a exosfera, uma ou outra vez chegar à opinião pública uma lei ridícula, metediça ou simplesmente idiota do Governo Europeu, uma ou outra declaração contraditória do FMI, ou do BCE, ou da OCDE, ou daqueles organismos com siglas estranhas que soam como fé-ré-fé-fé-trás-pum - nada, o povo é sereno, e a ideia de sair mais adamastoriana que a tranquila desgraça do ficar;

 

ii) Na 23ª hora as instâncias credoras competentes sempre dão, e deram, um jeito. Elas sabem disso, os governos sabem disso, e os eleitorados sabem disso. Houve um tempo em que se julgou que, logo que os bancos alemães expostos tirassem o cavalo da chuva, e o jogo passasse a ser apenas entre os contribuintes, outro galo cantaria. Mas o edifício resistiu, resiste, com bancos e fundos interpostos a fingir que arriscam realmente alguma coisa, e não fosse pela maçada de a Europa não crescer, a Grécia progredir ainda em direcção ao Neolítico, e os outros países consabidos do Sul continuarem nos cuidados intensivos, poder-se-ia dizer que a crise passou;

 

iii) Nenhuma corrente de opinião importante, nenhum partido político relevante dos países do Euro (o nosso PCP tem realmente muita importância, mas é mais em Loures, um conhecido arrabalde de Lisboa, e no frente-a-frente da Sic-N) defende a saída; e pelo contrário quase todos juram o seu filial amor à ideia da Europa unida, a cujo destino amarraram o seu e o dos seus dirigentes - actuais e históricos.

 

iv) Tirante alguns economistas anglo-saxónicos, que não são gente da nossa criação, e alguns catedráticos isolados, os magos da economia são quase unânimes: no Euro, na União Europeia, está o futuro; e para os velhos do Restelo fica o cais.

 

v) À direita do espectro político, percebeu-se que a disciplina que o Norte da Europa quer impôr ao Sul, por causa do Euro, é a mesma disciplina que o Sul deveria querer impôr a si mesmo, em vez da utilização deliberada da moeda própria para financiamento do laxismo, e dos governos intervencionistas e expansionistas com a máquina de fabricar cédulas debaixo do braço. E aquela parte da Direita que é, assumida, implícita ou inconscientemente, mais ou menos nacionalista, mais a outra que não é adepta da economia vudu, resolveram fechar a matraca - por ora.

 

Os eleitorados compram, no supermercado das ideias políticas, aquelas que lhes agradam, mas elas vêm em pacote: o Euro não se discute porque, de momento, a guerra é outra, e ambos os lados, nesta matéria, defendem o mesmo. Quem não defende não conta porque vem com outra tralha pendurada.

 

O assunto caminha assim para o tabu. Seja. Eu também nem estou disposto a cantar até que a voz me doa nem me suponho cantautor. Hoje é que me deu pr'ó desabafo; que tanto unanimismo chateia.

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publicado por José Meireles Graça às 12:51
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Terça-feira, 19 de Novembro de 2013

Perguntas difíceis

Para as longínquas eleições presidenciais já se indicam aqui e além preferências. Deixemos de lado o comunista de serviço que o PCP apresentará, o lunático ao qual o BE dará o seu irrelevante apoio e a prestigiada personalidade que o PS indicará para encher chouriços, quer ganhe quer não ganhe.

 

Votarei no candidato do meu lado, como sempre faço, ainda que o candidato do meu lado nunca tenha sido meu. E, na campanha eleitoral, silenciarei reservas e divergências, e aplaudirei o que puder, em nome de um mal menor e por espírito de corpo - não sou, nem desejo ser, independente.

 

Mas não estamos ainda aí. E quando ouço os nomes de Durão Barroso, uma rolha do calculismo e do europeísmo, e de Marcelo, uma inesgotável fonte de irrelevâncias e maquiavelismo de trazer por casa, sem uma única ideia no bestunto que não seja a opinião dominante e volúvel no que em Portugal convencionalmente se chama a Direita, ou a última novidade que apreendeu na badana de um livro da moda, ou numa conferência onde foi espairecer a simpatia, digo para mim que tem que haver melhor.

 

Sucede que melhor. António Barreto é melhor: as preocupações que tem são as que deve ter quem sabe que o País está numa encruzilhada e que pode, se nada fizer, descobrir-se num beco sem saída, onde, aliás, em parte, já está. As perguntas que faz aqui são parte das perguntas certas. E mesmo que o pressuposto básico esteja, a meu ver, errado (nas palavras dele: "Não é a melhor altura. O actual período de crise financeira do Estado (e da sociedade) não é a melhor altura para proceder à reforma do Estado"), e ainda que para muitos dos problemas que indica dê, quando dá, soluções ou ingénuas ou inconvenientes (no meu ver; mas, por ora, não vale a pena esforçar-me a elaborar, é possível que ninguém ligue pevide ao assunto) um abismo o separa dos do costume, que ou repetem a cartilha velha e relha que quarenta anos de democracia gastaram até ao fio ou, para além da gestão da tesouraria e das dependências europeias, não veem nada.

 

Eu não acho que devamos estar à espera de que as finanças fiquem minimamente equilibradas para reformar o Estado, desde logo porque sem essa reforma nenhum equilíbrio deixará de ser revertido logo que um empreendedor social-democrata alcance o Poder com ideias sobre como que é que o Estado vai, directamente, promover o crescimento, a modernidade e o céu na terra.

 

Mas um candidato que não diga claramente que a Constituição tem que ser revista não merece ser eleito. Como não o merece também quem defende isto e aquilo desde que a Europa apoie e faça assim ou assado. Porque se alguma coisa já ficou demonstrada, para quem precisava de demonstração, é que não há uma Europa, mas várias.

 

É que pode haver, e há, circunstâncias em que a Europa ajuda - quem se ajuda a si próprio. Num país de maioria católica, eu, que o não sou, acho oportuno lembrar: Ajuda-te, que Deus te ajudará.

publicado por José Meireles Graça às 00:05
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