Senhores terroristas,
A vossa comodidade é a nossa preocupação.
No próximo mês haverá uma visita papal a Fátima, e o Papa Francisco estará em Portugal nos dias 12 e 13 de Maio.
O senhor primeiro-ministro cultiva a imagem do aluno mais rebelde da turma a Finanças Públicas, o que lhe dá uma certa aura de James Dean, só que em bastante mais feio e gordinho, mesmo se se esforça por ter boas notas nos exames, às vezes com alguma batota, mas a Segurança e Cooperação ambiciona ser o melhor aluno, ou não tivesse ele um passado de ministro das polícias. E não vai deixar fugir a oportunidade de se mostrar um durão, suspendendo Schengen, ou seja, repondo os controlos de fronteiras entre o dia 10 e o dia 14 de Maio e mandando as televisões filmar polícias de metralhadora e colete à prova de bala, uma ou outra barreira de arame farpado mediaticamente exposta, talvez até um ou outro blindado, para impressionar o mundo. Nesses dias, o mundo, genericamente, e Portugal, especificamente, estarão mais seguros.
Mas temos a noção que estas alterações, mesmo sem impedir a vossa actividade, poderão perturbar a circulação de terroristas. De modo que vos queríamos deixar alguns conselhos. Terrorista prevenido vale por dois.
Se pretendem estar em Portugal durante a visita papal devem organizar a vossa viagem de maneira a minimizar os eventuais transtornos a que o controlo de fronteiras vos poderá sujeitar. Como é expectável, neste período os passageiros que chegarem por terra, mar e ar serão sujeitos a controlos de fronteira que, mesmo sem grande risco de lhes conseguir interceptar armas ou engenhos explosivos, os obrigarão a incómodas esperas, mais longas do que é habitual. Assim, será do vosso interesse chegarem a Portugal antes do fecho das fronteiras, ou seja, até ao dia 9 de Maio, de modo a passarem a fronteira muito mais rápida e comodamente, e terão ainda alguns dias livres para conhecer o nosso belo país, eleito repetidamente no Facebook como um dos melhores destinos de férias do mundo.
Bom, para dizer a verdade, estamos certos que os verdadeiros terroristas já se terão lembrado disto e tratado de reservar a sua chegada para antes do dia 10 de Maio. Também estamos certos que as autoridades portuguesas têm noção que, se alguns terroristas quiserem entrar em Portugal para cometer um atentado, entrarão à vontade antes do fecho das fronteiras. Pelo que, mesmo tendo a noção que a suspensão de Shengen contribui zero para a prevenção de algum eventual atentado terrorista, será pelo menos uma bela oportunidade para mostrar aos portugueses e ao mundo que o governo zela pela nossa segurança e pela dele.
Bem hajas, António Costa.
Os finalistas da geração mais bem preparada de sempre de Portugal, os que se tiverem tido média de 19 vírgula picos e se conseguirem acabar o curso daqui a meia dúzia de anos nos podem retalhar o peito para nos destroçar o coração, ou os pulmões, compraram uma férias em Torremolinos com bar aberto desde as 10 da manhã, e dedicaram o resto do dia a tentar demolir o hotel, ou pelo menos as convenções, instalando televisores nas banheiras, sofás nos elevadores e lançando pelas janelas colchões voadores. Uns labregos.
[Eu também já fiz uma viagem de finalistas. Fui a Londres em Abril de 1974, fui a 7 e regressei a 17. Ficámos numa residencial da universidade de Londres perto de Russel Square que não vandalizámos. Vimos pela primeira vez televisão a cores, e que bonito era ver futebol a cores... Não nos embebedámos, se bem que alguns tenham experimentado o seu primeiro charro, e outros perdido a inocência, na época não era nada mau perder a inocência aos 16 anos, uns com amadoras, outros com profissionais, um dos quais não chegou a perder porque aquilo era um esquema de pagar bebidas e a ele acabou-se-lhe o dinheiro antes de chegar ao último nível. A maior parte foi ver o Oh! Calcutta! e o Last Tango in Paris, que só alguns, como o João Gonçalves, que era da selecção nacional de juvenis de handball, tinha visto até aí quando jogava lá fora. Éramos just a bunch of regular decent guys. Uma semana depois acabava a ditadura, e um ano e meio depois começava a democracia. Por enquanto ainda dura.]
Os papás, e nada como os representantes dos papás para representar os papás, correram a explicar que era muito natural, e os da Confap, uma espécie de Fenprof do encarregados de educação, e eu digo isto tendo sido presidente de uma associação de pais, a do Instituto Gregoriano de Lisboa, meteram as mãos às ancas e esclareceram que, se não fosse para os meninos partirem aquela merda toda, os tinham mandado rezar para Fátima. Em resumo, a expulsão do hotel, antes de terem sequer completado a demolição, foi um exagero.
Já o ministro, esse pau mandado na Fenprof e, pelos vistos, da Fenprof dos encarregados de educação, pôs água na fervura, e disse que é preciso perceber com serenidade o que aconteceu antes de julgar os meninos.
Em resumo, explicam os pais, explica o ministro, é para isto que os meninos andam a ser educados.
Há uns bons pares de anos, numa segunda-feira de manhã, a capa de uma revista veio comover a nação que vivia o auge do cavaquismo com euforia. O arquitecto do regime, que fazia projectos milionários para tudo o que fosse eregível, e facturava ao governo muitas dezenas de milhares de contos (e muitas dezenas de milhares de contos ainda são dinheiro, mas naquela altura eram muito mais) por meros ante-projectos de urbanizações a eregir em manicómios deslocalizados para fora do centro da cidade, figura central do jet-set da época, até empresário da noite, era um dos donos do Bananas, e senhor de uma riqueza ostentada sem vergonha, deslocava-se de Rolls, também se dedicava ao cinema amador. O título da notícia era algo como "As loucuras do arquitecto", ou "Pau para toda a obra", já não me lembro bem. Mas lembro-me que, antes da hora de almoço, o jornalismo de investigação que se praticava na era pré-internet nas grandes empresas multinacionais quando havia grandes debates públicos a decorrer já tinha descoberto, na empresa onde eu trabalhava, que, nas Páginas Amarelas, o gabinete do arquitecto vinha na página com o separador "Pronto a Comer", na secção "Projectos de Arquitectura". Nas multinacionais, quando se investiga, investiga-se a sério.
Entretanto o regime mudou, o Cavaco Silva, ou porque não lhe apeteceu, ou porque pensou que ia perder, não se voltou a candidatar a primeiro-ministro, e o cavaquismo acabou e foi substituído pelo socialismo, entremeado com algumas interrupções neoliberais rapidamente postas na ordem pelos socialistas, mesmo quando perdem as eleições. E, com o socialismo, mudou o arquitecto do regime.
Hoje em dia não há peido que se dê no Portugal socialista sem um tripezinho Siza para o segurar, ou um candeeirozinho Siza para o iluminar.
Do museu ao auditório da escola, do bairro de uma grande cidade destruído por um incêndio ao pavilhão de uma exposição universal, vai a todas as que têm promotores públicos, um dia hei-de tentar perceber se por concurso público ou por ajuste directo? se bem que tenha a intuição que mais por este do que por aquele, porque o talento não se leva a concurso. Temos, pois, o novo arquitecto do regime.
Acontece que eu tenho alguma dificuldade em compreender, para usar uma expressão na moda, o que faz de um arquitecto cuja obra é uma pain in the ass para os desgraçados que são forçados a usufruir dela um grande arquitecto, para além da facturação do gabinete?
A mim que, na arquitectura, me impressionam menos os Pritzker do que o cuidado com "as pessoas" que são condenadas a viver dentro dela, ou a ergonomia, só posso esperar que o regime mude rapidamente, para aparecer um novo arquitecto que nos torne a vida menos penosa e perigosa e mais agradável e segura.
Por acaso, ouvi há pouco em diferido uns quantos minutos do programa a Quadratura do Círculo de ontem. O tema era a pobreza, os sem-abrigo, a liderança do combate ser feita por Costa ou Marcelo. Todos os comentadores, incluso o jornalista, defenderam medidas de combate à pobreza tais como:
- politicas activas de emprego, mais fiscalidade e mais medidas de redistribuição de rendimentos, subsídios aos pobres, liderança seja como for do Estado
Nem um disse uma centelha sobre aquilo que está na origem de grande parte da pobreza actual:
- politicas activas de emprego, mais fiscalidade e mais medidas de redistribuição de rendimentos, subsídios aos pobres, liderança seja como for do Estado.
Hoje lanço aqui um MBA rápido em Jornalismo, na especialidade de Entrevista Política, com uma garantia de empregabilidade de 100% na Impresa, o grupo de comunicação social do dr. Pinto Balsemão. O curso é gratuito, mas ofereço a garantia de devolução das propinas se o candidato não conseguir o tão desejado lugar nos quadros deste afamado grupo.
O curso é suportado cientificamente numa investigação empírica exaustiva conduzida ao longo de anos na observação de percursos profissionais de sucesso de jornalistas lambe-botas e lambe-cus, fundamentação científica que permite assegurar os resultados prometidos.
O estudo de caso que se propõe como exercício é preparar um guião para uma boa entrevista ao líder da oposição. Para os alunos não gastarem os neurónios, a abundância de neurónios não é um pré-requisito para o ingresso no grupo Impresa, a resolvê-lo, apresenta-se desde já a solução e despacha-se o curso mais repidamente.
Guião para uma boa Entrevista ao Líder da Oposição.
[Se incluiu estas perguntas na sua solução, o entrevistador já obteve a aprovação no curso e um lugar garantido nos quadros da Impresa. A resposta seguinte permite ascender à classificação de Aprovado com louvor e Distinção e dá acesso directo ao ingresso na Quadratura do Círculo e a sete mil e quinhentos euros por mês a título de direitos de autor, que pode acumulaar com outros rendimentos e lhe dá um desconto no IRS]
Obrigado pela vossa comparência no curso, espero que vos tenha sido útil e proveitoso, e deixo-vos a sugestão de levarem sempre convosco a imagem de São Pacheco, o santo padroeiro dos vira-casacas, que neste mundo nada é imutável e a capacidade de adaptação a circunstâncias que se alteram dinamicamente é crucial para os lambe-botas e lambe-cus de sucesso.
* Imagem do santo tomada de empréstimo ao seu suposto autor, o blogue wehavekaosinthegarden.
O Público é uma espécie de esgoto a céu aberto mediático que se faz notar principalmente quando as suiniculturas licenciadas para o utilizar, e destacam-se sempre as suiniculturas António & Pedro Nuno e Catarina & Mariana, fazem descargas. Estranhamos sempre, mas já estamos habituados ao cheiro.
Apesar de o Passos Coelho andar relativamente sossegado, decidiram agora fazer-lhe uma descarga, por motivos que só eles saberão, regressando ao velho tema da Lista VIP.
A informação que o fisco guarda sobre os contribuintes e a sua vida contributiva é útil, e até imprescindível, para perceber se eles cumprem integralmente as suas obrigações fiscais. Não serve para os funcionários vasculharem os rendimentos e o património dos vizinhos, nem para comissários políticos infiltrados na administração fiscal a poderem distribuir a quem entendam para finalidades de utilização no combate político em que participam. Como foi abundantemente utilizada na última legislatura, em que, nomeadamente, a vida contributiva do então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho foi exaustivamente vasculhada e discutida, mesmo no parlamento, por dois dos partidos da oposição, o PS e o BE, o PCP costuma ter mais pudor a fazer oposição por essa via, talvez por ter sido em 1980 o precursor em Portugal da política de casos com o caso da dívida do Sá Carneiro à banca e de ter aprendido então, com o resultado da eleição que se seguiu em que a AD reforçou a maioria absoluta de 1979 por outra ainda mais clara em 1980, que a política de casos entusiasma os convencidos mas não necessariamente o eleitorado e não parece converter ninguém. Como, aliás, se veio a confirmar nas eleições de 2015, em que todo o investimento da oposição nos casos que envolveram o Passos Coelho, em que a mera menção da palavra "Tecnoforma" fazia salivar os cães de Pavlov socialistas e bloquistas convencidos que estavam prestes a capturar caça grossa, não evitou a sua vitória inesperada nas legislativas de 2015.
Isto para dizer que,
Posto isto, o jornalismo de combate do Público regressou, pois, à Lista VIP, e esta vez ilustrada com histórias específicas, que depois de ler a notícia, apesar de extensa, se resumem a uma história.
E qual é a melhor história que o Público encontrou para ilustrar o acesso não autorizado a dados de contribuintes detectado pelo sistema de alarmes da Lista VIP? Uma consulta ao IMI do Cavaco Silva por um costista funcionário do fisco para publicação no Público? Uma devassa de um sindicalista bloquista ao IRS do Passos Coelho para passar a informação ao grupo parlamentar do BE para entalar o primeiro-ministro no hemiciclo?
Nada disso! Uma funcionária das finanças da Amadora, onde o Passos Coelho morou antes de se mudar para Massamá, e amiga pessoal dele, a quem ele telefonou para lhe pedir uma informação sobre a sua própria declaração de IRS, que ela consultou para lhe responder pelo telefone. O resto da notícia é uma misturada confusa e extensa de factos e relatos do que foi sendo explicado por inúmeros participantes sobre a origem, desenvolvimento e existência ou inexistência da Lista VIP, a quem a comunicação social e a política deram uma vida mais importante do que a devassa do sigilo fiscal dos contribuintes para finalidades de combate político.
De uma penada, esta feliz ilustração do Público mata vários Coelhos.
É, portanto, uma boa descarga das suiniculturas que recorrem ao Público para se aliviarem delas. Contém frases como "Em pleno caso Tecnoforma, Passos ligou a uma funcionária do fisco sua amiga por causa do IRS. O acesso foi apanhado no alarme VIP e aparece no inquérito arquivado pelo Ministério Público. NIF de Paulo Núncio foi acrescentado à lista mas a razão é um mistério." cheias de palavras-chave como "Tecnoforma", "arquivado", ou "mistério", que exalam o mau-cheiro característico das descargas que elas têm sempre esperança de fazer colar aos visados.
O motivo de as fazerem agora, consumindo matéria fecal que poderiam guardar para um dia mais tarde em que fosse mais necessária, não é claro? Tal como não é fácil perceber porque não aprendem com as experiências passadas, em que as descargas em que depositaram tantas esperanças afinal não conseguiram garantir-lhes o que ambicionavam, vitórias nas eleições, e continuam a fazê-las? Rotina? Instinto? Não se sabe.
A verdade é que continuam a fazê-las regularmente. E que o Público é uma espécie de esgoto a céu aberto mediático que se faz notar principalmente quando as suiniculturas licenciadas para o utilizar, e destacam-se sempre as suiniculturas António & Pedro Nuno e Catarina & Mariana, fazem descargas, e que as estranhamos sempre mas já estamos habituados ao cheiro.
Diz que chegou “da província” e vê-se que diz a verdade. Não que Viseu seja a terra inferior e apalermada que Mendes sugere, espreitando por cima do ombro, imaginando que desceu a Lisboa e encontrou uma grande civilização entre São Bento e os festivais de rock. “A província”, tal como era entendida no tempo em que essa expressão se usava, não se aplica a Viseu e já quase nem faz sentido no país que existe hoje, mas encaixa perfeitamente na maneira retrógrada e preguiçosa, até um bocadinho salazarista, como Francisco Mendes da Silva constrói a ambição dele. Pobre Viseu que criou mais este medíocre.
O ministro Centeno, famoso por mentir ao país, merece-lhe a simpatia porque Mendes acha que “ainda não sabemos” o que “esteve em causa”; e por isso não houve “qualquer imoralidade”. Aprecia a indefinição ideológica, defende certas “causas”, diz que é pouco ortodoxo; declara que o “acusam” de “não ser de direita”. Efectivamente não é de direita, até me custa escrever uma evidência destas, mas esse não é o ponto; ele diz isto convencido da sua extraordinária complexidade, uma obra de arte da filosofia política com uma combinação de perspectivas tão pessoal que tentar classificá-lo como esquerda ou direita é um exercício de excessiva simplificação. Mendes quer que o vejam assim, vive neste capricho, e declama as platitudes dele olhando o mundo pela janela com um sorrisinho de satisfação intriguista. Cheguei a sentir pena do incapaz.
Que ele vá expandir-se para a televisão com dois carroceiros e um possidónio faz parte dos planos: os Mendes da vida precisam de se fazer notados. Que ele respeite Galamba pela grosseria, pela falta de escrúpulos e pela capacidade de se malcriar, também não é uma informação nova. Não lhe devia tocar (a não ser com um pau), se fosse inteligente; Galamba é uma ofensa estética, Mendes é candidato a governante (Deus se amerceie de nós!), a exibição pública de uma amizade é um gesto político e tem consequências. De resto estas amizades nunca foram, que eu tivesse dado conta, publicamente correspondidas. Galamba trata Mendes como o patife trata a namorada púbere: com algum nojo e sobranceira brutalidade.
A entrevista (“i”, 27 de Março 2017) anda para a frente e para trás, encaracola-se em voltinhas sem saída, sem nunca se afastar da ideia principal: dada por estabelecida a incompetência de Mendes para afirmar a direita, este profeta consome-se em maquinações para se pendurar no PS. Prevenido, como manda a sabedoria e a prudência, com um sistema teórico aprimorado e firme, assente em subtilezas finíssimas, que o deixam livre para adornar à esquerda ou à direita consoante a oportunidade. O que importa é concertar um entendimento, um acordo entre ele e os outros democratas, que garanta um grau de respeitabilidade sem vigilância nem oposição; e que, ao mesmo tempo, alivie os rústicos do peso das escolhas, das decisões, das eleições, desejavelmente até do livre arbítrio e da opinião própria – que é, como sabemos, meio caminho andado para a dissidência e a desarmonia, mas não vamos exagerar. O bom povo, como as crianças, precisa de ser conduzido e protegido, não é assim?
Mendes tem sentimentos, “irritou-se” quando o PS não viu as coisas da mesma maneira. Acha que foi “artificial”. Não percebe que o PS é aquilo que o PS faz. Se o PS decidiu rejeitar os partidos do sistema e formou uma aliança aberrante com a extrema-esquerda, o PS é hoje um partido aberrante e radicalizado. Convém meter isto na cabeça, muito bem arrumadinho, de uma vez por todas: como avisou Paulo Portas, a direita só volta a ser governo com uma maioria absoluta.
Mas não, o nosso herói não gosta da ideia: “o CDS não nasceu para ser mordomo do PSD”. Curiosíssimo. O CDS acabou de governar com o PSD por 4 anos, do princípio ao fim do mandato, durante um dos períodos mais difíceis e cruéis da nossa história. Ajudou a livrar o país de uma encrenca colossal; e a ganhar as eleições seguintes, ficando a meia dúzia de deputados para voltar a governar. Mendes não vê dignidade nisto. No entendimento dele, o CDS não contribuiu para alterar a natureza de um governo do PSD; o CDS foi “mordomo”. E Mendes não quer vê-lo descer nunca mais a essa circunstância vil. Suponho que o PS, coligado com Mendes, reservaria para o CDS um lugar mais honrado. O raciocínio não parece lúcido, pelo menos à primeira vista; mas em algum plano ele deve ser impecável, porque o homem pensa à luz das “influências do parlamentarismo britânico”. Também diz que desde a geringonça “o regime constitucional mudou”, e nós já sabemos, neste ponto da entrevista, que a tradução desta frase em língua de Mendes é: “está aberta a porta para todos os conúbios torpes”.
A direita, continua ele, deve defender o Estado Social - para recuperar o voto dos funcionários públicos. Mendes não pensa no país. Se pensasse prevenia que o Estado Social, se o quisermos conservar, tem de ser visto e revisto com muita atenção, e sujeito a escolhas, porque não há nem vai haver dinheiro para o manter desordenado e gigantesco como está. Como também não percebeu que não é possível haver “elevador social” numa economia estagnada. E diz que “a ideologia foi suspensa no tempo da troika”, talvez a frase mais incompreensível da entrevista inteira; a ideologia é um ponto de vista, nunca pode ser “suspensa” e não foi, sobretudo no tempo da troika. Como é que este filósofo imagina que “a salvação do país” é possível sem um ponto de vista?
Nenhuma destas gotas de sabedoria em estado concentrado chega sequer perto do momento em que Mendes declara o seguinte: “qualquer político que queira o poder por boas razões faria a mesma coisa na posição de António Costa”. É preciso ler a frase duas vezes para acreditar. “Qualquer” político? “Qualquer” mesmo ou qualquer um daqueles do círculo de Mendes, por quem ele tem estima? Da variedade dos “temíveis”, como o Galamba? E o que é que Mendes considera “boas razões”? Quem é o candidato a governante que não acredita ter “boas razões” para querer o poder? Compreendi mal ou Mendes considera legítimo e aceitável que um político, por ter sido derrotado ou por ter “boas razões”, traga o radicalismo para o poder? E que em troca de apoio parlamentar esse político “qualquer” aceite entregar aos extremistas todos os lugares importantes que eles quiserem no aparelho do Estado, para que nunca mais se possam de lá tirar?
O cavalheiro é dirigente do CDS, e anda à solta pela paisagem a dizer estas preciosidades. Ele confessa, a dada altura, que há lá gente ainda mais socialista do que ele. E eu, que já vou conhecendo o meu partido, confirmo que também vi. O que não sei, e era bom que alguém se ocupasse de explicar, é se há lá alguém que reconheça e confirme esta linha política. Só para percebermos onde anda a direita, se essa escolha existe, ou se temos de nos resignar para sempre a estes “príncipes da política”.
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