Assunção Cristas, perguntada sobre em quem votaria se fosse brasileira, respondeu que não votaria … porque não seria capaz de escolher entre um partido que "destruiu o sistema democrático brasileiro" e um candidato de "extremismos" em que não se revê.
Respondeu mal. Porque um candidato ao lugar de primeiro-ministro deveria dizer algo do género: não tenho de, nem devo, pronunciar-me sobre preferências eleitorais em países amigos.
Deixemos de lado o detalhe de Assunção, se fosse brasileira, e tendo menos de 70 anos, ter de votar, sob pena de multa. E dêmos-lhe o benefício exculpatório de hoje todo o responsável, de Trump a Juncker passando pelo incontinente e irrelevante Marcelo, comentar sem rebuço a vida política de estados terceiros.
Não deveria comentar porquê? Por várias razões: i) Portugal, país pequeno e dependente, não precisa de inimigos. E mesmo que as relações pessoais, de amizade ou inimizade, contem menos do que os interesses, não é um bom ponto de partida que em Brasília venha a morar quem gratuitamente se hostilizou. Nem em Brasília, nem em Luanda, nem em Pequim, nem em Washington, nem em qualquer outro lugar; ii) Os cidadãos portugueses que se interessam por algo mais do que o destino da selecção e o valor exacto da sua pensão ou ordenado não precisam que os dirigentes políticos lhes digam o que pensar sobre os sucessos noutras terras que não a nossa, excepto se e quando algum interesse nacional corra o risco de ser afectado. Não precisam porque estão abundantemente servidos de comentadores, mesmo que na comunicação social haja, como há, uma superabundância de comentadores de esquerda, e uma não negligenciável dos que se dizem de direita mas não se distinguem substancialmente dos primeiros; iii) O CDS é há mais de 40 anos uma espécie de reserva da república para quando o país ganhar juízo ou as circunstâncias o forçarem a tê-lo. E tendo várias capelas (a católica, a europeísta, a negocista, a nacionalista, a liberal, a conservadora, fora as misturas e as oscilações tácticas) sempre teve o cuidado de praticar a tolerância interna, quando não há muito seria o MRPP da direita. Declarações que impliquem divisão são inevitáveis quando se trate de estabelecer um rumo necessário, porque agradar a todos é o caminho mais seguro para a inoperância e para não agradar a ninguém. Mas a gente cá em baixo não precisa de ajudas para se zangar por questões alheias.
Sucede que nas redes logo se estabeleceram duas correntes, uma a favor da abstenção, que concorda com Cristas, e outra a favor de Bolsonaro, que não concorda. E já havia os que votariam Haddad porque são de esquerda, ou porque não são fascistas, e os que votariam Bolsonaro porque são de direita, ou não são comunistas, para não falar em José Manuel Fernandes, que não sabe se votaria num ou noutro porque, votando em branco, dependeria de quem lá pusesse a cruzinha.
Tenho-me divertido a acompanhar a polémica, sem me comprometer. Instintivamente, as minhas simpatias vão para Bolsonaro, mas não faltam declarações do candidato num sentido autoritário, troglodita e primário, que fazem com que, em levando a sério o que o homem diz, se fuja a sete pés. Evidenciar simpatia pela tortura e pelos torturadores do tempo da ditadura militar, por exemplo, já seria suficiente, em tempos normais, para esperar que o autor se refugie num qualquer grupo ultra-minoritário onde os membros se confortem uns aos outros nos seus ódios medievais e nas suas certezas de selvagens.
Os tempos, no Brasil, porém, não são normais. O PT pode não ter instaurado uma ditadura comuno-bolivariana como na Venezuela, e ter preservado os mecanismos da democracia. Mas criou uma vasta clientela de dependentes do Estado que sufocam a economia exangue pelo fim da alta dos preços das matérias primas que o país exporta e pelo intervencionismo dirigista, ao mesmo tempo que promoveu a corrupção a níveis intoleráveis.
Pergunta-se: Haddad tem condições para redimir o Brasil? Não, não tem, absolutamente nada no seu programa, no seu passado e nas suas declarações, na parte em que são credíveis, permite pensar que o PT aprendeu alguma coisa e remediará alguma coisa. Pelo contrário: os lulistas raivosos, de lá e de cá, acrescentariam à gestão inerentemente inepta da economia o revanchismo contra o sistema judicial. E este, que deu provas de ser um baluarte contra o Estado clientelar, passaria a vítima, e com ele o Estado de Direito. O que significaria que, se o Brasil com o PT ficou de joelhos mas não se venezuelizou, desta vez bem correria esse risco.
Então, se eu fosse brasileiro e católico, faria o sinal da cruz e votava Bolsonaro; e, se fosse agnóstico, substituía o sinal da cruz por figas.
Haddad é que nunca, em que pese aos meus amigos bem-pensantes, como o Adolfo Mesquita Nunes, o Alexandre Homem Cristo, o Bruno Alves, a Maria João Marques (esta amiga a 50%, porque a aprecio sem que retribua), outros muitos ainda aos quais escapa o que está em jogo no Brasil, como lhes escapou o que estava em jogo nos EUA.
É aliás o mal das posições ao centro: costuma ser o lugar geométrico de coisa nenhuma. Mas isso fica para outra maré.
Desde que comecei a frequentar as redes sociais tenho-me dedicado esforçadamente ao combate aos boatos, porque tenho a convicção absoluta que quem faz política ou passa mensagens à custa de boatos é pura e simplesmente escroque, quaisquer que sejam as ideologias que defende ou lutas políticas que apoia.
No início os boatos enquadravam-se maioritariamente em dois tipos:
Eu combatia-os deixando comentários a desmenti-los onde os via publicados, e os desmentidos eram, com raríssimas excepções, rejeitados pelos autores das publicações como meras defesas sectárias dos malfeitores alvo dos boatos, fossem os deputados que nos roubam, fossem políticos de direita que tiravam dinheiro aos pobres para o entregar aos banqueiros, ou sujeitos ao desafio de provar o desmentido por parte de quem, assimetricamente, não se tinha dado nem estava disposto a dar ao trabalho de provar as insinuações que partilhava. Era um esforço relativamente inglório mas de dimensão exequível, atendendo à frequência com que esses boatos eram partilhados.
Principalmente desde a vitória do presidente Trump nas eleições americanas apareceu um novo tipo de boatos com uma temática e uma frequência e intensidade diferentes: boatos sobre políticos de esquerda, alguns do mais puro delírio, como o que insinuava ao presidente Barak Obama e à secretária de estado e depois candidata a sucessora Hillary Clinton a gestão de uma rede de pedofilia que operava a partir de uma pizzeria em Manhattan, que deu origem a um atentado de um cidadão que, convencido da veracidade, decidiu fazer justiça por suas próprias mãos, boatos sobre refugiados muçulmanos acolhidos na Europa que lhes atribuem desde violações em massa em massa em países como a Alemanha, à instauração do estado de sítio e mesmo de guerra civil em países como a Suécia, à organização de manifestações de refugiados para exigir a instauração da Sharia nestes paises e noutros, ou insinuações que políticos de esquerda promovem iniciativas legislativas delirantes, como legalizar a pedofilia, no âmbito da "ideologia do género". Mas desta vez em volumes impossíveis de identificar e desmentir em proporções significativas. Com a chegada dos alt-media da alt-right o boato nas redes sociais transformou-se de artesanal em industrial e o combate artesanal aos boatos deixou de ter a pouca eficácia que tinha antes.
O combate à base do desmentido individual, com comentários como confirmou essa notícia em sites de jornais?, tem a certeza que a pessoa na fotografia disse mesmo o que a legenda insinua?, tornou-se insuficientemente produtivo para sequer fazer qualquer diferença na torrente de boatos que passaram a aparecer diariamente, até porque os desmentidos continuaram a ser recebidos pelos divulgadores dos boatos com o mesmo tipo de acolhimento que tinham antes com um argumentário adaptado a esta nova circunstância, com a insinuação de estar a fazer o jogo da esquerda, ou do islamismo, ou dos pedófilos, ou o desafio a provar que o boato era mentira.
É, aliás, assunto que tenho discutido frequentemente com amigos igualmente críticos do ambiente de boato permanente em que se têm transformado as redes sociais, na procura de sugestões de metodologias de abordagem do problema mais produtivas, algo infrutífera por não ser fácil estancar a corrente com a intensidade que tem.
A fábrica de boatos vai-se adaptando à actualidade política, essencialmente quando há processos em que participam políticos populistas de direita que são sempre apoiados por ela, e nas últimas semanas dedicou-se ao lançamento de boatos sobre o candidato da esquerda à segunta volta das eleições residenciais brasileiras Fernando Haddad.
E mais um dos que apareceu nesta última vaga mostra uma montagem fotográfica com retratos dos dois candidatos que sugere que Jair Bolsonaro usa um relógio Casio de poucas dezenas de euros, que usa realmente e no Brasil esses modelos até são designados por Casio Bolsonaro, e Fernando Haddad usa um relógio Patek Philippe cronógrafo de calendário perpétuo que custa cerca de cem mil euros. É uma tontice acreditar que Fernando Haddad use um relógio desse valor, mas achei que valia a pena desmenti-lo. E para o desmentir dediquei algum tempo a pesquisar fotografias do candidato em que o relógio fosse minimamente visível, tendo depois ampliado que encontrei com melhor definição até conseguir, pela mancha do logotipo, identificar a marca e o modelo do relógio, um Longines cujo custo ronta os dois mil euros.
E qual foi a utilidade do tempo gasto a fazer isto, não menos de uma hora? Nenhuma. A quem disse que o relógio não era um Patek Philippe respondeu com um desafio de provar o desmentido, a quem mostrei que era um Longines respondeu com o desafio de provar que era o mesmo relógio.
De modo que decidi experimentar uma abordagem menos convencional com a esperança de ser mais convincente:
As características essenciais do boato forjado eram a inverosimilhança extrema e o público alvo.
Sendo o público alvo de direita com propensão para acreditar em boatos sobre políticos de esquerda era essencial que o político vítima do meu boato fosse de esquerda. Se a vítima fosse de direita o público de direita tenderia a pensar que este era um boato inventado pela esquerda para difamar políticos de direita e desse modo vingar as histórias verdadeiras que circulam sobre políticos de esquerda, e apenas reforçar a sua convicção que estes boatos são mesmo reais.
Dentro da esquerda era essencial escolher uma vítima que o público gostasse de acreditar que seja hipócrita e corrupta mesmo sem mostrar grandes indícios que confirmem a parte da corrupção, o que tornaria o boato mais apelativo por lhes oferecer esses indícios. Os bloquistas por, por um lado, serem praticantes permanentes da política de casos em que difamam políticos de direita através de insinuações e da encenação dessas insinuações no palco político e até no parlamento, como fizeram repetidamente ao longo da legislatura anterior com o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, e, por outro, assumirem sistematicamente uma posição de superioridade moral sobre os políticos de direita, e até sobre os de esquerda mais próximos do arco da governação, eram o tema ideal para este boato. Daí a escolha da deputada Catarina Martins.
Depois era necessário arranjar uma história incrível, tão incrível que mesmo os que gostassem de acreditar nela acabariam por não acreditar. A condição de bloquista ajudava na inverosimilhança, não por os bloquistas serem necessariamente mais honestos que outros políticos de esquerda do arco da governação, mas porque não ocupam posições executivas em que tenham acesso a grandes desvios de fundos que possibilitam o enriquecimento de políticos desonestos. A inverosimilhança foi então baseada em mostrar um bem de valor completamente fora do alcance da vítima do boato. No caso de Catarina Martins, um relógio de luxo com o preço de mais de 20 milhões de euros. Atendendo a que cerca de 20 milhões de euros é o que se estima que um primeiro-ministro alegadamente corrupto alegadamente conseguiu desviar em proveito pessoal ao longo de duas legislaturas em que governou um país, fica completamente fora do alcance de alguém que na política nunca teve qualquer função executiva, mesmo que fosse alguém extraordinariamente corrupto. Uma impossibilidade. Para ajudar a inverosimilhança ainda deixei um erro no comentário ao escrever que é um relógio marca Worldtimer, que não é a marca nem o modelo do relógio mas a firma do comerciante que publicou o anúncio de venda online. Escolhi o relógio para o boato com base no preço, era o mais caro do site, e o anúncio é mesmo real.
Quando publiquei a imagem sem o aviso no dia 12 de Outubro de manhã percebi que começou a ser partilhada por pessoas que conheço e estimo, e que a inverosimilhança lhes passava ao lado. De modo que lhes deixei comentários a avisar que era uma imagem falsa nas partilhas que elas tinham feito, e acrescentei o comentário de aviso na imagem original talvez uma hora depois de a publicar sem aviso. Deste modo, o comentário completo com o aviso passou para todas as partilhas da imagem, mesmo as que tinham sido feitas antes de o completar.
Três dias depois fui avisado por um amigo que a imagem estava partilhada no site de combate ideológico Direita Política como se fosse autêntica acompanhada de um texto assinado por Regina Cunha. Não dei autorização a ninguém para utilizar a imagem, nem me foi pedida, nem sei se é habitual esta deferência ética, nem conheço a autora, nem nas redes sociais, nem faço ideia sobre se a sua identidade é verdadeira ou falsa. O estilo literário, de que me permito transcrever o primeiro parágrafo, é relativamente comum naquela área de combate ideológico e já me cruzei nas redes sociais com quem pratica estilos semelhantes, até na colocação criativa das vírgulas. Mas não faço ideia de quem se trate.
Deixei lá de imediato um comentário a avisar que a imagem era falsa e a explicar a intenção de a ter criado.
Apesar do aviso a imagem não foi removida do site, e só dei pela sua remoção na véspera da publicação do artigo do jornalista Paulo Pena no Diário de Notícias no dia 20 de Outubro sobre esta publicação do boato, percebi ao ler a notícia que o dono do site a substituiu depois de ser contactado pelo jornalista.
Desta história tirei algumas conclusões, umas menos boas do que outras.
A pior, ter-me apercebido que um boato, por mais incrível e mesmo impossível que seja, encontra sempre quem acredite nele. O que faz desta luta contra a disseminação de boatos tão importante como sempre a considerei. A disposição do público para acreditar em boatos que lhe confirmem as opiniões que já tem é assustadora.
A melhor, que a denúncia do boato, e das correntes de boatos que o inspiraram, ultrapassou em muito o alcance limitado da minha rede social, onde poderia esperar avisar umas boas dezenas de pessoas que tenho noção que lêem regularmente o que publico, no limite umas poucas centenas, para se tornar nacional graças à sua publicação não-autorizada no site Direita Política onde coloquei o desmentido que ainda lá está, sem grande esperança de os frequentadores o levarem a sério, mas essencialmente graças ao artigo do jornalista Paulo Pena no Diário de Notícias que deu origem a notícias em quase todos os jornais de maior circulação, para além de sites de combate ideológico como o esquerda.net.
O meu aviso chegou muito mais longe do que sonhava, e espero que tenha contribuído para alertar alguns milhares de pessoas para desenvolverem algum sentido crítico quando, perante uma notícia em que gostariam de acreditar, ponderam sobre a sua veracidade.
Finalmente, hoje fui contactado telefonicamente pelo jornalista Paulo Pena, que não faço ideia onde descobriu o meu número de telefone fixo que ninguém usa para me contactar mas os jornalistas terão as suas artes de descobrir estas coisas, que simpaticamente me explicou que tinha tomado conhecimento que tinha sido eu o autor do boneco do relógia da Catarina Martins e me pediu para trocar impressões com ele e lhe contar a história e autorização para publicar o esclarecimento, que eu, também simpaticamente, acedi a contar e autorizar. Sendo a primeira vez que algum jornalista me contactou para me pedir declarações sobre qualquer assunto tenho toda a confiança que o que for publicado será fiel à nossa longa conversa, e disponibilizo-lhe este artigo para o ajudar a garanti-lo.
O facto de já esta semana ter voltado a ver notícias sobre relógios de políticos brasileiros indicia-me que este combate pela verdade contra a mentira pode ser uma causa perdida. Mas é a minha.
Senhora xxxxx xxxxxxx:
Notei a carta de V. Exª da refª supra, com data de 12 de Outubro mas apenas hoje recebida, redigida na língua de pau a que já me habituou, e usando liberalmente da costumeira má-fé.
Com efeito:
O meu cartão de débito, que nunca perdi de vista, foi utilizado abusivamente, sem que a segurança que deve rodear a sua utilização a isso tenha obstado, por um “comerciante” que se recusam a identificar.
Donde eu concluo que VV. Exªs não contactaram verdadeiramente ninguém, não sabem do que estão a falar e tomam como prática normal da relação fornecedor/cliente a simples aldrabice.
Dos bancos antigos todos sabem o que pensar. Dos novos, pelo visto, é ingenuidade esperar que sejam um pouco melhores.
Passe V. Exª muito bem, que eu fico melhor graças a Deus.
Há uns bons anos, estava com uma senhora na cama, altas horas, e ela lia, apercebi-me, as cartas de Eça à sua futura mulher; eu um ensaio qualquer sobre um recanto obscuro do passado, ou umas tretas sobre as tendências do presente, que são as coisas que me entretêm há que tempos.
A senhora, às tantas, depositou o livro aberto na barriga e, fitando sem ver a parede em frente, murmurou no silêncio sepulcral do quarto: se um homem me escrevesse cartas assim apaixonava-me por ele!
Aquilo não me caiu bem. E, a despeito de Eça ser um dos santos no altar exíguo das minhas devoções, embarquei numa doutoral dissertação sobre a hipocrisia do autor, e o seu casamento por interesse na família dos condes de Resende. Creio até ter chamado à colação o exemplo de Teodorico Raposo que, depois de caído em desgraça, na Relíquia, casou com a irmã abonada do amigo Crispim. Conclui informando que Eça era incapaz de, escrevendo, não ser admirável. E que, se o papel era o de apaixonado, então era bem capaz de despertar a atracção romântica da madre Teresa de Calcutá, ainda por nascer.
Não convenci. E ficou por apurar se o silêncio desaprovador resultava de sono ou da constatação de uma putativa ciumeira.
Lembrei-me desta história por causa do texto da Spiegel que acusa Ronaldo. Está bem feito, o texto. E é tão convincente, como aliás todas as outras peças da mesma proveniência, que todas as feministas que conheço dão como adquirido que ele violou sem sequer se darem ao trabalho, as mais raivosas, de deixarem a clássica ressalva de ser necessária a provazinha da culpa em tribunal.
Sucede que nem todas as mulheres compram, sem mais, a tese da culpabilidade. E esta, por exemplo, que não tem frio nos olhos nem consta que sofra da doença do machismo denunciada pelo movimento Metoo, vê no relato mais buracos do que num queijo Gruyère.
Eu também vejo. E como tenho pelo movimento feminista um respeito excessivamente moderado e pelos homens que nele se alistam, incluindo amigos meus, a forte suspeita de que o que querem é, enrolados na bandeira da modernidade pateta, agradar ao belo sexo a qualquer preço, acrescento:
O MeToo é uma americanice grotesca e interesseira que, a coberto de casos reais de violação e abusos, pretende dar às mulheres vantagens indevidas, que consistem no poder não sindicado de arruinar carreiras e reputações, e no deixar passar para a consciência social a ideia de que quem é acusado por uma mulher, se o crime for de índole sexual, tem os seus direitos de defesa automaticamente diminuídos;
O feminismo é de esquerda, mesmo quando subscrito por pessoas de direita, porque cede ao discurso dos “fracos” e dos “oprimidos” contra os “poderosos” e os “opressores”. É uma bandeira fabricada pela indústria de causas, a mais dinâmica neste dealbar do séc. XXI, alimentada pela comunicação social para vender e pelas redes sociais para que os cidadãos possam ventilar a sua indignada virtude;
Os inimigos expostos à execração são os mesmos de sempre, isto é, os que detêm poder e riqueza. É isto que explica que a empregada que diz que o patrão a assediou tenha automática audiência e serviços públicos prestimosos a investigar, mas o mesmo empenho não se verifique na repressão de práticas medievais como a mutilação genital feminina ou os casamentos forçados em comunidades muçulmanas ou ciganas;
Há cada vez mais mulheres educadas que, na competição por lugares que são naturalmente menos numerosos do que os pretendentes, descobriram que a reivindicação de quotas elimina concorrentes. Uma guerra dos sexos vem a calhar, sobretudo se o inimigo, por ser filho de umas, e marido, amante ou irmão de outras, não perceber que é de uma guerra que se trata.
Pergunta-se: todos os que viram e veem as suas carreiras destruídas por acusações eram culpados dos crimes de que foram acusados, e algum beneficiou realmente da presunção de inocência? Não, porque sofreram uma pena sem processo legal. Ou seja, o movimento feminista defende um retrocesso civilizacional, que é a equiparação dos putativos agressores sexuais a cristãos-novos acusados de judaísmo, e a consagração do princípio de que, para certos crimes, mais vale a eliminação de todos os potenciais criminosos do que o risco de que alguns fiquem por condenar.
De resto, não faltam por aí excitadas a defender que a violação, tal como a define o código penal português, precisa de ver a sua definição legal alargada, e a sua moldura penal agravada. Como se o agravamento da sanção penal para os crimes da moda alguma vez em algum lado tivesse feito mais do que arrastar consigo o agravamento de outras penas para outros crimes; e como se as grandes taxas de encarceramento, e a violência da resposta penal, fossem apanágio de sociedades pacíficas.
Querem importar americanices, minhas senhoras? Fiquem-se pelos blue jeans justinhos, se estiverem bem servidas de pernas, e pela coca-cola light, se não estiverem.
Senhora xxxxx xxxxxxx:
Notei a carta de V. Exª da refª supra, com data de 27 de Setembro mas apenas hoje recebida, que não agradeço por ser, como claramente é, um exemplo de má-fé e língua de pau.
Com efeito:
1. Preenchi em momentos diferentes dois impressos diferentes, ambos do BancoCTT, ambos por exigência vossa e ambos entregues pessoalmente no vosso balcão em Fafe, narrando os mesmos factos. De ambos os impressos (um de 11 de Julho e o outro de 23 do mesmo mês) tenho recibo, razão pela qual a exigência de um terceiro impresso, ainda para mais requerendo expressamente a afixação de uma data posterior, e sob pretexto de que seria uma exigência da SIBS, é não apenas um abuso mas uma potencial desonestidade: poderiam VV. Exªs virem dizer depois que a reclamação não foi tempestivamente apresentada;
2. Das várias vezes em que me desloquei, por exigência vossa, ao balcão local e ao posto da GNR, sempre perdi muito tempo e paguei estacionamento. Isto para resolver um problema que nada impedia pudesse ser tratado por e-mail;
3. Este assunto foi objecto, sempre da mesma forma redundante e acéfala, dos vossos e-mails de 19 de Julho, 23 de Julho (este acusa a recepção da segunda reclamação), 1 de Agosto e 5 de Setembro passados, o primeiro em resposta ao meu de 17 de Julho e os seguintes todos respondidos adequadamente;
4. A sugestão, formulada no penúltimo parágrafo da sua carta acima referida, de me dirigir ao comerciante onde foi abusivamente utilizado o meu número de cartão de débito (e que aliás não sei quem é – Cherry China é o quê? – nem V. Exª indica onde fica) poderia passar por irónica. É apenas, porém, além de estúpida, insolente.
Reforçarei a queixa já apresentada no Banco de Portugal, pelo que valha; se tiver tempo e disposição, e existir serviço de reclamações, queixar-me-ei aos serviços da VISA.
A V. Exª felicito por não ser hábito as cartas, e os e-mails, virem com a fotografia de quem os subscreve. Se fosse, e na hipótese de ser titular de um módico de vergonha, teria que se deixar figurar com a cara enfiada num tacho.
Receba V. Exª, de cumprimentos,
Quanto baste.
José xxxxx xxxxxxxx xx Meireles Graça.
Sou do tempo em que para meter gasolina se perdia pouco tempo, não se sujavam as mãos nem se poluía o ambiente com luvas de plástico jogadas fora. Bastava uma gorjeta modesta para o abastecedor, que fazia ele próprio o troco para contas que eram quase sempre redondas.
O salário mínimo eliminou os abastecedores; o dinheiro vivo foi substituído pelo plástico, em nome de uma comodidade o mais das vezes ilusória; e nas bombas o cidadão orgulhoso exibe a carteira com o estendal dos cartões com os quais o banco o esbulha e o Estado lhe controla os movimentos, enquanto entope a fila para declarar com cidadã satisfação o seu número de contribuinte e introduz o código na maquineta.
O sonho dos estatistas é aliás acabar com o dinheiro vivo. E tempos virão, e não estão longe, em que o funcionário enxerido saberá com rigor quantos cafés tomo pela manhã, e quantos maços de tabaco compro, até ao momento em que um fascista qualquer (pode ser o actual ministro da saúde, ou o anterior, ou o ominoso ex-secretário de Estado Leal da Costa, a liberdade tem poucos amigos) decida que o celebrado SNS não pode servir do mesmo modo quem cuida e quem não cuida adequadamente de si, por muito que os vícios já estejam carregados de impostos.
Na prática, não é possível viver sem um banco. Sei porque tentei. E até o pobre diabo que não tem mais do que a sua reforma acaba por ser forçado a ter uma conta, para não se expor a filas intermináveis para descontar o vale postal. Salvo se for cigano, caso em que as filas podem, como nos hospitais, ser ignoradas.
O Estado agradece. E o banco também, que pilha com naturalidade as contas à sua guarda sob os mais diversos pretextos, sob a atenta supervisão de farinha do mesmo saco, paga a peso de ouro.
Há poucos anos escolhi portanto um banco que não cobrasse comissões, no caso o banco CTT.
Até agora, não me cobrou nenhuma. E satisfeito estava até que um dia me apareceu um débito sob a designação PayPal Cherry China, portanto de uma organização que nunca usei, para pagar a uma firma que não conheço uma despesa que não fiz, com um cartão que nunca me saiu do bolso para aquele efeito.
O incidente deu origem a uma inacreditável saga. E amanhã, para este post não ficar demasiado longo, publicarei o último e-mail que, farto desta gente até aos olhos, dirigi à atrevida que me escreveu a recomendar-me que me dirigisse ao “comerciante em causa”, como se eu soubesse quem é.
De acordo com alguns autores, o melhor que temos na Europa para nos proteger dos socialistas e da sua voragem pelo despesismo eleitoralista e irresponsável que conduz inevitavelmente ao abismo financeiro e do seu fascismo normalizador politicamente correcto são os movimentos, e tenho alguma dificuldade em baptizá-los porque os populistas dizem que não existe populismo, a extrema-direita diz que não há extrema-direita, os nacionalistas dizem que não há nacionalismo, e todos dizem que quem usa esses qualificativos para os designar é socialista ou idiota útil do socialismo, mas chamemos-lhes, sem grandes preocupações de rigor e mesmo que não sejam, apenas por uma questão de dar a entender claramente de quem estamos a falar como se usássemos uma alcunha conhecida em vez do nome verdadeiro que nem toda a gente conhece, populistas de extrema-direita nacionalista.
Além de tudo o mais, estes populistas da extrema-direita nacionalista vão-nos defender contra a entrada massiva de refugiados muçulmanos, mesmo sendo verdade que em Portugal terão a missão facilitada pelo facto de não haver assim muitos refugiados muçulmanos interessados em refugiar-se cá. Mas a atitude vale, nem que seja pelo simbolismo, e portanto eles vão-nos proteger dos refugiados muçulmanos.
Já o socialismo é um problema de que precisamos mesmo de mais protecção do que temos, de tal modo se anuncia como triunfal o passeio que António Costa parece ter pela frente, de vitória eleitoral anunciada e de canja contra uma direita que parece incapaz de se afirmar como uma alternativa, tanto mais quanto por vezes se parece querer afirmar mais como um complemento, um contrapeso ao complemento bloquista do outro lado da balança, do que como uma alternativa ao socialismo.
Estamos, portanto, condenados a mais 4 anos de socialismo ou menos, se o próximo governo de António Costa conseguir rebentar com isto, por exemplo por acontecer um abrandamento do contexto global de crescimento económico que tem sustentado em Portugal o crescimento e o aparente equilíbrio das contas públicas, antes de completar o seu mandato. E o que podemos esperar do socialismo?
Vamos esquecer as propostas mais radicais que ainda há meia dúzia de anos eram repetidamente defendidas como sensatas, quase um dever para defeder as populações das garras do fascismo financeiro "de Bruxelas", como o repúdio da dívida, ou a saída do Euro, ou mesmo da União Europeia, e atentemos apenas ao que pode ser actualmente um programa económico de governação socialista:
Em resumo, agradar a tudo e a todos com dinheiro caído do céu, de mistura com a vocação para a aldrabice que faz da prestação de contas um exercício de toda a dose desorçamentação de que se é capaz, tudo debaixo de uma capa moralista de defesa dos mais desfavorecidos contra a voragem do capitalismo e da elite financeira e contra o garrote "de Bruxelas".
Isto poderá perfeitamente vir a ser a vertente económica do próximo programa de governo socialista concertado entre o PS costista e o BE, admito que não lhes seja necessário incorporarem as sugestões igualmente socialistas de combate à especulação imobiliária do PSD de Rui Rio, mesmo que este se disponha a colaborar com eles pela defesa do interesse nacional acima do interesse egoísta do partido, por não precisarem dele para nada, e que o velho PCP continue a sua descida no plano inclinado para a irrelevância desde que, ao apoiar o governo costista, prescindiu dos travões que lhe retardavam a descida, por também não precisarem dele para nada. Isto no cenário que hoje em dia parece mais provável de o PS ganhar em 2019 as eleições que perdeu em 2015, sem maioria absoluta mas com capacidade para formar uma maioria absoluta com o apoio parlamentar ou governativo do BE.
E é disto que se espera que os populistas da extrema-direita nacionalista nos consigam proteger.
E como é que eles nos vão proteger do socialismo?
Através de um programa económico de governação populista nacionalista alternativo, de que para não inventar podemos ir buscar, a título de exemplo, o do actual governo italiano:
Em resumo, agradar a tudo e a todos com dinheiro caído do céu, de mistura com a vocação para a aldrabice que faz da prestação de contas um exercício de toda a dose desorçamentação de que se é capaz, tudo debaixo de uma capa moralista de defesa dos mais desfavorecidos contra a voragem do capitalismo e da elite financeira e contra o garrote "de Bruxelas".
É igual ao programa económico de governação socialista? É.
E como é que estão a reagir os mercados a este programa? Como sempre reagem a programas socialistas.
Se nos vier alguma vez a calhar na rifa vai voltar a ser um passeio dos alegres para novo resgate? Vai.
Mas sem refugiados muçulmanos.
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