Segunda-feira, 24 de Dezembro de 2012

Vigiados por um farsante

 

 

Não sabemos se o nome dele é, de facto, Artur Baptista da Silva. Apresentou-se como Economista, coordenador de um observatório das Nações Unidas, consultor do Banco Mundial, doutorado e docente numa universidade americana que não existe (Milton Wisconsin University?). Bateu à porta de uns sindicatos, onde não lhe deram crédito. João Vieira Lopes, presidente da Confederação de Comércio e Serviços, "recebeu em mão algumas páginas" de um "estudo" sobre a crise em Portugal e convidou-o para ser orador numa conferência no Grémio Literário.

 

Não chegou de Saturno: aparentemente, o Baptista chegou de um processo na justiça portuguesa, em que foi condenado por burla a uma empresa onde trabalhava nos anos 80. Detalhe que passou despercebido ao cocuruto do nosso jornalismo, que se apressou a consultar as suas opiniões sobre a crise em Portugal (com ênfase nas "consequências sociais" da aplicação do "programa de ajustamento"). Foi entrevistado por vários jornais, rádios, e estações de televisão, e o Baptista transformou-se rapidamente numa referência incontroversa.

 

Falava sempre em nome da ONU; "nós" isto, "nós" aquilo, e foi assim que Nicolau Santos redigiu fundamentados artigos de opinião que publicou no Expresso, repreendendo o governo português por não saber quem era o Baptista e por não dar a devida atenção aos experimentados "alertas" que o Baptista emitia.

 

Não satisfeito, Nicolau Santos quis dar a devida projecção ao génio que a ONU lhe mandava entregar em casa, e convidou o Baptista para o "Expresso da Meia-Noite" a fim de que todos os portugueses ficassem cientes daquilo que os seus pastores insistiam em ignorar, na maior irresponsabilidade. Durante cinquenta minutos, Nicolau Santos interrogou o Baptista, concentrou-se no que ele disse, debruçou-se encantado sobre as frases do Baptista, e (segurando o queixo que se lhe soltava de admiração) esclareceu o país.

 

Emitido o programa, varridos os estúdios da SIC, e resguardadas as suas instalações dos olhares ainda perplexos dos telespectadores, alguém desconfiou. Resolveu fazer uma pesquisa no Google e meia dúzia de telefonemas. Concluiu (e duvido que tenha demorado mais de meia hora) que, tanto na ONU como no Banco Mundial, ninguém tinha ouvido falar no Baptista, o observatório não existia, e nunca tal "estudo" tinha sido feito.

 

Há muito tempo que o jornalismo "especializado em assuntos económicos" não se recomenda pela sua lucidez e seriedade. Mas dificilmente se esperava que, em menos de 48 horas e pela quadra do Natal, nos fosse oferecida a revelação de um rematado farsante. Não me refiro ao Baptista.

 

publicado por Margarida Bentes Penedo às 05:29
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1 comentário:
De Pedro a 26 de Dezembro de 2012 às 13:06
Concordo completamene com o que refere. O episódio nicolau santos é uma caricatura do jornalismo em Portugal.
Desde que o governo tomou posse a classe joralistica passou à oposição e parece travar guerra com o Governo.
Em meados de Setembro a RTP afirmava que não era tempo de antena de um primeiro ministro desgastado , e protestava por ser obrigada a ir a S. Bento entrevistar o PM.
Os jornalistas estão sempre prontos a dar voz a quem critica as politicas de austeridade.
Na RTP dia após dia desfila Louça, o lider da CGTP.., os lideres do bloco..., enquanto Passos Coelho mal se vê.
O sub director do Expresso também ele cego pelo òdio a Coelho e Gaspar deixou - se enrolar.
O òdio cegou-o.
Mas ele é a caricatura do jornalismo que ( não ) temos.

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