Há movimentos que esticam uma certa arte ao ponto máximo que ela consegue atingir, pelo menos durante um período longo. Abrem direcções cujo abandono significa quase sempre a decadência. Uma das razões que tenho por mais claras é a sobrevalorização da originalidade como um critério errático, solto da substância do entendimento e da interpretação das circunstâncias que distinguem se uma obra é adequada ou se limita a uma afirmação de puro exibicionismo, um espasmo acéfalo de vaidade pessoal.
No design de mobiliário, o modernismo escandinavo estabeleceu e assentou padrões de perenidade que até hoje não foram substituídos. O mundo mudou, o trabalho mudou e os processos também. Isto levanta problemas que a indústria ainda não resolveu - mas há-de resolver. O resto, o que se tem apresentado como evolução, das duas uma: ou se aproxima dos padrões fixados ou balança entre o bizarro e a fancaria.
A história da Olaio não é, como diz o Observador, um capítulo da nostalgia. O que ela mostra, até certo ponto, é a tensão e os sobressaltos que as mudanças nos modos de vida podem provocar no que as sociedades precisam de manter.
"O resto ficaria por conta do próprio Dr. Costa, que louva imenso a "lusofonia" e fala um português assaz carenciado", escreve Alberto Gonçalves no DN de hoje.
Não destaco esta frase por achar que ela é um bom piparote na geringonça política do dr. Costa: as deficiências linguísticas são uma superfície que não precisa de ser arranhada para deixar à vista a educação rápida, mal coada, suja de impurezas, que descansa no erro primário sem correcção e devia assustar-nos para uma longa cadeia de riscos. O dr. Costa recusa a imundície da "contabilidade", e sobe a discussão para a "cultura" com apetrechos de sucateiro.
"São mais cuidadosas, mas têm outros handicaps que agora seria fastidioso estar aqui a dizer" - responde o canastro, com toda a razão.
Para começar, convêm definir: o que é "conduzir bem"?
Na perspectiva das "autoridades" (jornalísticas e outras), é cumprir os limites de velocidade, amarrar-se com o cinto de segurança, ligar o pisca, segurar o volante com as duas mãos, evitar cigarros, telemóvel, e os editoriais do Avante!, ter a papelada em ordem, escoltar os ciclistas, e outros tédios da mesma família. Uma lista infindável de regras concebida para dar resposta às pressões de grupos com objectivos sortidos, totalmente alheios aos assuntos da estrada, e que levam os nossos pensamentos para paisagens mais estimulantes. Ninguém, nem o cidadão mais espesso e menos dotado de imaginação, consegue passar 300 quilómetros concentrado nestas importâncias. Não lhe sobrando atenção para dar ao que interessa, espera-se que acabe por estampar-se.
Na minha perspectiva, "conduzir bem" é chegar do ponto A ao ponto B no mais curto espaço de tempo, sem ter nem causar acidentes. Fazer isto e "respeitar" a lei são exercícios incompatíveis (desde 2011, escolho naturalmente o segundo - que fique dito).
Critérios à parte, voltemos à pergunta: As mulheres conduzem mal? Sim, pessimamente. E os homens também.
Para começar, fica à vista que a SPA é a primeira a copiar o trabalho alheio e a chamar-lhe seu. Um gesto simbólico quando se trata de discutir a "defesa" dos "direitos" de "autor". A seguir, faz de conta que esclarece os seus processos numa prosa minada de aldrabices.
Diz, por exemplo, que 40% das receitas da cópia privada são para os autores, 30% para os editores, 30% para os produtores (atenção, vamos em 100), e 20% para um Fundo alegadamente Cultural. Não se mencionam despesas administrativas, nem a máquina burocrática gasta um cêntimo que seja, garantindo-se que os surpreendentes 120% da receita serão encaminhados para aquelas bandas da “arte” que a SPA conhece e promove “sem despesas para os contribuintes” (é mesmo assim que lá está escrito).
Esbarrondada no fundo da mediania, da imaturidade, da falta de imaginação, e de um amadorismo artístico sem disfarce nem misericórdia, a SPA recorre a truques de pilha-galinhas sendo a justa representante daquelas almas puríssimas que agora cantam aos calcanhares de António Costa.
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Imagem daqui.
O ponto 10 concentra o fundamental: a maior parte dos dinheiros da “cópia privada” vai servir para pagar burocratas; o resto será distribuído pelo Estado e por autores que ninguém quer pagar.
A moral desta história é que os "artistas" portugueses insistem em viver da extorsão de recursos públicos, sem sujeitar as maravilhas que produzem ao escrutínio dos leitores, das plateias, ou da crítica, ficando pela mediocridade proverbial, com desdém pela ética, o talento, e o dinheiro do próximo, para prejuízo da cultura e do seu papel civilizador.
A moral desta moral é que o Estado, na sua visível fraqueza e ignorância, cede ao estrépito ardiloso dos "artistas" num servilismo sórdido.
Não devemos nada, nem prebendas nem respeito, a uma colecção parda de “artistas” mal ensinados e grosseiros de espírito, acostumados a apregoar um zelo ruidoso pelas artes para poderem, em nome do seu prestígio, sustentar um modo de vida parasitário. Este abuso presunçoso, em algum momento, tem de levar um encontrão.
Começou por aceitar a encomenda extravagante e impudente do jornal Expresso para escrever um prolongamento d'Os Maias. Alguém disse na altura que "com um bocado de caridade" se podia considerar, entre os prolongadores contratados, Rentes de Carvalho como o único legível. Pareceu-me uma crítica exagerada, mas agora que li o livrinho percebo que era justa e até bondosa.
Das piores possibilidades (duvido que houvesse "boas”, e foi isso que o Expresso ignorou), Rentes de Carvalho escolheu situar, já velhos, Carlos da Maia e João da Ega numa quinta do Douro, e empenhou-se em caracterizar aquilo que imagina ter sido "o falar do povo" nas conversas fastidiosas, irrelevantes, e em discurso directo, com os criados. Como se isto não fosse ilícito suficiente, assassinou todo o carácter ficcional de Carlos da Maia atribuindo-lhe “preocupações sociais”, por artes infanto-juvenis de umas reflexões sobre “desigualdades”.
Hoje publica no Tempo Contado (um dos poucos blogs que visito com regularidade e cautela) um texto (entre aspas porquê?) que descreve com detalhe a aventura de um idiota português que se enrola em esbórnia com um grupo de motards alemães a arrotar sauerkraut e cerveja morna.
Recomendo que evitem a leitura, talvez o exercício mais repelente dos meus últimos meses. Não posso suspeitar que as “autoridades” da “crítica” “literária” portuguesa estejam a caminho de premiar Rentes de Carvalho; já o premiaram (há uns meses?) e eu - com leviandade - aplaudi.
Eu propunha soluções mais participadas. O governo alugava uma cave em Algés. Daquelas com janelas à altura das peúgas que passam na rua, geralmente ocupadas por armazéns de contrafacção ou escritórios de linhas eróticas de valor acrescentado. Começava por lhe aplicar uma obra de restauro, que consistia em pintar todo o interior de verde chroma (paredes, tectos, portas, móveis, tudo), como se usa no cinema. Com a correspondente portaria, ficava estabelecido o Gabinete de Estudos.
A seguir mandava fazer bonecos de papelão com as fotografias em tamanho natural de todos os parceiros sociais. O de Arménio Charles levava uma camada reforçada de verniz de alto brilho nas zonas da testa e do queixo, para ficar tal e qual. Em sistema de turnos, ia nomeando peritos para presidir a Comissões constituídas por eles mesmos e meia dúzia de personagens fictícias, representadas por figurantes sorteados entre todos os gabinetes ministeriais. Cada equipa instalava-se, digamos, durante 15 dias e escolhia uma política pública para aperfeiçoar. Durante o meio dia da manhã, recebiam e respondiam a telefonemas dos telespectadores dos programas de antena aberta. Da hora do almoço em diante intrigavam com jornalistas.
Em cada momento eram escolhidos os parceiros sociais adequados à reportagem. Para o efeito, o senhor ministro Maduro, destacado para o local, encarregava-se de retirar da despensa os respectivos bonecos, colocá-los a jeito, e voltar a arrumá-los no fim dos trabalhos. Sobre o chroma, e em pós-produção, seriam projectadas bonitas imagens dos interiores de palácios ucranianos reunidas antes da ocupação.
Uma vez por ano, os contribuintes elegiam a sua equipa favorita de entre as 24 disponíveis. Cada contribuinte dispunha de um número de votos calculado pelos cupões atribuídos a concurso no Portal das Finanças, de acordo com as facturas registadas. Como é evidente, acabava-se com o sorteio dos Audis (que nunca foi uma boa ideia). Após um período de telefonemas, rigorosamente acompanhado por um representante do Governo Civil enfiado num fato fora de moda (como é de rigueur), apurava-se o perito que os portugueses queriam homenagear.
No dia previsto, feriado nacional, alugava-se o Terreiro do Paço ao dr. Costa. O aluguer consistia numa encomenda de rissóis de berbigão, confeccionados pelo próprio segundo a sua receita de família e em número suficiente para dar de lanchar a todo o povo que quisesse juntar-se à festa. A equipa chegaria ao centro empoleirada numa carroça puxada pelos 3 peritos mais votados, rodeada por uma escolta de campinos ribatejanos.
Com recurso a um sólido sistema de roldanas, os peritos (presos pelos pés) seriam içados ao palanque e primorosamente maquilhados para uma emissão em directo. Um cabeleireiro transexual, recrutado nas oficinas de reinserção do Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz, ficaria encarregado de lhes ornamentar as cabeças com penteados alusivos à selecção portuguesa de futebol. Após esta homenagem sentida, um grupo de aposentados cantava “ó pavão, lindo pavão” enquanto refrescava o segundo e terceiro classificados com esfregonas previamente mergulhadas na gordura de fritar os rissóis.
O segundo classificado tomava posse como Secretário de Estado do Empreendedorismo, Criatividade, e Inovação; o terceiro como Comissário Europeu para a mesma pasta.
A jornalista Ana Lourenço aguardava impaciente pela sua oportunidade, quando lhe seria disponibilizado o perito-mor para entrevistar. De olhinho insinuante e beicinho vulnerável, levantava 2 ou 3 assuntos fundamentais e, quando não conseguisse mais segurar os seus impulsos, rapava de uma motosserra que trazia guardada na carteira e desmontava o campeão numa pasta informe de sangue, ossos, e cabelos, para dentro de um alguidar. Da multidão soltavam-se “bravos”, “vivas”, e fogo de artifício.
A parte protocolar das cerimónias seria encerrada com o discurso de um sociólogo prestigiado, tratando Portugal por “tu”. A festa prolongava-se noite fora numa borracheira colectiva, animada por canções de Charles do Carmo e outros bardos premiados. No dia seguinte, perante os vestígios e os eflúvios deixados das comemorações, os funcionários do lixo faziam greve.
Mas lá está; se eu mandasse no país isto ia de outra maneira.
Em traços grossos, há os que não leram, os que tresleram, e os que efectivamente leram. Deste último grupo, já de si residual, 9 em cada 10 (para evitar exageros) não perceberam nada. Ao contrário do que agora se diz por aí (todo o cão e gato "lê" situações, polémicas, e acontecimentos), existe uma diferença substancial entre "ler" e "interpretar". São exercícios diferentes, e ambos exigem trabalho e capacidades. É por esta razão que a minha temperatura mental permanece inalterada perante argumentos couraçados em citações.
Falo nisto a propósito do malsão Leal da Costa, que citou "O banqueiro anarquista" para mostrar o oposto do que diz o texto de Fernando Pessoa. Se virmos bem, não fez diferente do que faz a generalidade dos nossos peritos e “literatos” - que na melhor das hipóteses (tirando 2 ou 3 excepções, que a plateia não sabe identificar) se resumem a operosos coleccionadores de papéis.
Aviso já que não vale a pena ler a notícia inteira: o título* chega perfeitamente. O resto, para quem tenha curiosidade, mostra a promiscuidade e as trapalhadas entre o Estado e as empresas predilectas do regime quando se desperdiçam dinheiros públicos à boleia de "conceitos" importados e absurdos.
Neste caso, importa perceber uma ideia simples: Lisboa (como o Porto e a maior parte das cidades portuguesas), pela sua topografia e salvo áreas muito reduzidas, não se presta a bicicletas. E nem pela cabeça de um robalo passa a ambição de ver os lisboetas, aplacados por operações de "mudança de mentalidades", exercer felizes a sua "sensibilização" de ladeira acima - transpirando a "sustentabilidade" do planeta e a bazófia dos figurões que vivem à conta deles.
A moda das ciclovias, com os respectivos adornos, serve para perfumar um caixote de lixo. Feito de incompetência, abuso, descaramento e muita propaganda. Assim que se rasga a superfície, vê-se o que não gostamos.
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* "Ponte ciclável e pedonal sobre a Segunda Circular vai servir para quê?"
Considera-se um pensador, apesar de ter sido um estratega e um homem muito agradável sempre que a lisonja lhe servia os objectivos. Não está disposto a abdicar de um poder que já ninguém lhe reconhece, nem sequer dentro do partido. Rodeou-se de uma corte de intriguistas fracassados, porque os intriguistas com talento não precisam dele nem lhes sobra tempo para visitas de cortesia. Reune-se, pública e periodicamente, com um conjunto de aduladores que se penduram no seu passado político como se o prestígio fosse transmissível por contágio. O nome de Mário Soares atesta, julgam eles, uma virtude "humanista" no currículum de muitos cavalheiros. E assina artigos de opinião - numa prosa baixa, rude, desabrida e pesada, sem cor nem recursos linguísticos, com o garbo de um carroceiro e o estardalhaço de um sarilho na taberna.
Nunca suportou ser contrariado. Quando se candidatou à presidência do Parlamento Europeu (e perdeu para Nicole Fontaine), disse que os deputados tinham preferido votar numa "dona de casa". E há uns meses (não muitos), quando azulado de cólera apelou à violência contra o Governo e o Presidente da República, guardou uns insultos para os comentadores que não gostaram. Nunca admitiu que o fizessem para expressar uma discordância legítima, em resultado de uma inteligência própria e de uma diferente interpretação dos acontecimentos. Discordaram, escreveu Mário Soares, para "especular", "ao serviço do poder", e "para ganhar dinheiro".
Em 1986, quando se candidatou pela primeira vez à Presidência da República, Mário Soares chamou as "notabilidades" da época. Do mundo do futebol falou-se de muita gente, mas o mais "notável" (lembro-me bem, porque já me repugnava pelos projectos medonhos que desenhava) foi Tomás Taveira, que andava em namoro com a direcção do Benfica por motivos de um estádio, e encheu tempos de antena com aquele paleio aldrabão e cabelos soltos, pose marialva, frente ao ascoroso edifício das Amoreiras.
Eusébio não apareceu. Nem nessa altura nem noutra, porque Eusébio sempre fez - muito bem - o que lhe coube, e nunca falou de política. Competiu em partidas de futebol, porque era a sua profissão; e em protagonismo com o dr. Mário Soares, sem esforço e sem vontade, porque Soares não conseguiu associar-se ao seu nome nem conseguiu interpretar as coisas de outra maneira. O rancor foi ganhando volume naquela vaidade sem medida, e nenhuma oportunidade é melhor para aplicar um golpe no adversário do que apanhá-lo... morto.
Aconteceu hoje. O espectáculo repelente não desiludiu ninguém: foi baixo, como é marca do artista, vingativo como um filho mimado; vil como a sua prosa, confundindo (Soares sempre confundiu) coragem com desconsideração; ambíguo como julga que é próprio da alta política; cobarde como há muito não se via - mesmo em Portugal.
Soares disse que Eusébio era "modesto", "pouco instruído", "com pouca cultura", e "não se esperava dele que fosse um pensador". Fosse Eusébio comunista, ou lunático do PREC, e Soares (dominados os maus fígados) tê-lo-ia bajulado com encómios estremecidos, exigindo que o seu peito não descesse a enterrar sem uma dose apreciável de quinquilharia dourada - por serviços à Pátria. Mas Eusébio distinguiu-se no desporto, onde o mérito é possível de medir. Sabe-se (nenhum letrado contesta) que não está no mesmo plano das proezas intelectuais.
A Al Jazeera e a CNN dedicaram-lhe reportagens. O Governo decretou, pela morte de Eusébio, três dias de luto nacional. No facebook houve logo quem se mostrasse desagradado. Quem pensa que os "humanistas" se distribuem pelos partidos, pelas "plataformas", pela "academia" e pelos fiéis das "ciências" sociais - é porque nunca deu uma volta no facebook, onde o "humanismo" (solto das limitações e dos compromissos de quem tem responsabilidades políticas) mostra os contornos extravagantes que atingiu, em níveis estratosféricos de pureza e intensidade. Um "humanista", quando "sério", opõe-se ao "populismo" e não engole um herói do futebol. Herói que é para ser respeitado tem de vir do "pensamento", dos "valores", da "cultura", ou da "revolução". Naquela arrogância de beatos, na admiração analfabeta pela "academia", no orgulho da virtude que se atribuem para se sentir maiores, e nos feitos dos outros sempre encontrar insuficiências, gostam da "igualdade" teórica, conceptual. Amam a "igualdade" enquanto for abstrata, enquanto for "nobre", e por isso intangível, saco para todas as recusas. Detestam o fenómeno real, que os agarra pelos pés e os faz descer do paraíso seguro das "ideias", onde nada os compromete, à imundície banal das pessoas - esses animais que os esperam, matreiros, vulgares, e mal cheirosos, com toda a espécie de riscos. Um "humanista" casto não digere um herói popular, acima de tudo, porque um herói popular nunca precisou de um "humanista" - nem nunca deu conta que ele existisse.
O país vai unir-se numa homenagem a Eusébio - sentida, franca, e grata. Será comovente. Não é obrigatória.
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