Sexta-feira, 14 de Junho de 2019

Os twelve steps do caminho para o socialismo na Saúde

2019-06-14 Marta Temido.jpg

O caminho para o socialismo na Saúde tem doze passos:

1. Começa-se com hospitais com gestão privada que oferecem aos utentes do SNS cuidados melhores e a custo mais baixo para os contribuintes que os de gestão pública.

2. Deixam-se, com reduções de horas trabalhadas que provocam faltas de pessoal e cativações que não permitem comprar consumíveis nem manter os equipamentos a funcionar, os utentes dos hospitas públicos ao abandono.

3. É-se apanhado a aldrabar listas de espera para consultas e cirurgias com consequências mortais para os doentes cujos cuidados foram adiados que morreram à espera de os receber.

4. A culpa é do Passos.

5. Quer-se fazer cumprir o preceito ideológico que diz que todos os estabelecimentos do SNS devem ter gestão pública.

6. Mas os que têm gestão pública funcionam mal, e pior que os que têm gestão privada.

7. Monta-se uma manobra de divisão.

8. Revela-se ao país com justa indignação que os hospitais geridos por PPP internam doentes nos refeitórios e nas casas de banho.

9. Anuncia-se a não renovação dos contratos de gestão dos hospitais com PPP, os malandros que metem os doentes nos refeitórios e casas de banho.

10. Faz-se, para aproveitar a maioria circunstancial de esquerda, uma lei que obrigue as futuras maiorias para todo o sempre, baptizando com o nome de Lei de Bases da Saúde, e com este nome blindando-a contra futuras mudanças de ideias.

11. Para o Marcelo não chatear, que ele ameaça mas depois amansa facilmente, e para alimentar alguma ilusão de variedade na oferta eleitoral da esquerda e, com ela, alargar o mercado a todos os segmentos, os que querem PPP e os que não querem PPP, deixa-se cair a proibição de PPP para todo o sempre, mas previne-se que só em casos excepcionais é que poderá voltar a haver.

12. Em Outubro, se até lá não houver catástrofes naturais, os combóios, o metro e os cacilheiros ainda não tiverem todos parado ou afundado, e a justiça for suficientemente lenta a investigar crimes e teias de corrupção para ainda haver socialistas em liberdade, ganham-se as eleições.

Mission acomplished, e os doentes que se f.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 22:56
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Sexta-feira, 31 de Maio de 2019

Perdoa-me

O primeiro episódio do programa "Perdoa-me", da SIC.

No próximo episódio o ministro Pedro Nuno Santos vai pedir perdão aos eleitores por tratar da vidinha dele, da da mulher, e da das mulheres dos amigos ao mesmo tempo que se está cagando para as deles, apesar do o secretário de Estado garantir que em Londres ainda é muito pior.

2019-05-31 Pedro Nuno Santos jota esse.jpg

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 16:07
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Quinta-feira, 30 de Maio de 2019

Feios, porcos e maus - ao menos que se lhes exijam responsabilidades

2018-05-03 Feios porcos e maus, veneno de ratos.jp

A história conta-se em poucas palavras. Aos 22 anos V. filmou-se, ou deixou-se filmar, a ter relações sexuais. Depois casou e empregou-se, seguiu a vida. Aos 27 o filme apareceu nas redes sociais, talvez colocado pelo co-protagonista? e foi descoberto e começou a ser circulado pelos colegas da empresa, que cuidavam de apontar "é aquela ali". Ela assustou-se mas o mundo continuou a andar à roda (eu sou heliocentrista e tenho a convicção por razões da ciência da Mecânica que a Terra anda à roda num movimento de rotação sobre o eixo e não é o resto do universo que todos os dias anda à roda dela), até a cunhada, que também trabalhava na empresa, o ter visto e o ter ido mostrar ao irmão, o marido de V.. E V., com vergonha, suicidou-se.

Vamos não discutir se o facto de ainda haver gente com vergonha em pleno século XXI é uma excentricidade, porque a pior das pessoas com vergonha é melhor do que a melhor das que não a têm.

Que papel tiveram na morte dela o autor da publicação original do filme nas redes sociais e todos os que, por maldade ou galhofa, o fizeram divulgar até ele chegar aonde chegou? O mesmo que tem num pelotão de fuzilamento o soldado a quem calha o cartucho vazio: mataram-na sem a bala ter saído da arma que todos lhe apontaram para a matar.

O que merecem?

[Aqui abro um parêntesis para opinar sobre justiça.

Não há ninguém mais exigente do que eu de rigor na prova para considerar legítimo condenar um criminoso. Lamento muito dizê-lo mas, apesar de estar convicto e sem a mais pequena sombra de dúvida que o ex-primeiro ministro socialista José Sócrates é um criminoso e de desejar a sua punição tanto quanto qualquer outra pessoa que considere a corrupção merecedora de condenação, necessito de informação muito mais sólida do que consegui ver publicada em todas as notícias  publicadas pela comunicação social sobre o processo ao longo dos anos para me convencer que há provas suficientemente sólidas para o condenar. E sem provas prefiro que ele seja solto a que seja condenado para satisfazer o alarido da multidão e limpar uma imagem que a justiça acumulou ao longo de décadas, talvez com alguma justiça, de ser tolerante com os poderosos. E tenho até noção que há crimes quase impossíveis de provar com solidez, nomeadamente os que são cometidos em privado e que só são testemunhados pela vítima e o criminoso, como grande parte dos crimes sexuais e de violência doméstica, e que esta posição de princípio de algum modo pode dificultar ou mesmo impedir a aplicação de justiça nalguns desses crimes, mas é o meu princípio e não é daqueles que estou disponível para substituir se tiverem outros melhores. É pior punir um inocente do que deixar partir um criminoso, e não é apenas por ser injusto para o injustamente punido, é mesmo por, sinalizando que inocentes podem ser punidos em vez deles, a justiça incentivar os criminosos.

Já relativamente à graduação das penas sou mais medievo. O princípio "olho por olho, dente por dente" não é injusto, é justo. Não é justo cortar a mão a um ladrão, mas não é injusto cortá-la a quem cortou a mão a outro. Sou muito céptico relativamente à pena de morte mas não é por não considerar que determinado tipo de criminosos não a merece, mas pelo risco do erro judicial que qualquer cedência no princípio da exigência da prova torna possível. De resto, qualquer pena é irreperável. A de morte por motivos óbvios (eu também não acredito na ressurreição), mas qualquer dia encarcerado numa cela à espera de ser ouvido por um juiz ou qualquer dia de prisão preventiva à espera do julgamento e de uma possível condenação são irrecuperáveis como dias em liberdade, às vítimas ninguém os tira.]

Merecem, portanto, um processo justo em que se apure com todo o rigor se fizeram alguma coisa que tenha contribuido efectivamente para a morte de V., como partilhar o filme nas redes sociais, mostrá-lo aos colegas e amigos, deixá-la perceber que faziam do filme motivo de galhofa, fazê-lo chegar aonde, ao ter chegado, a induziu ao suicídio. Uns por dolo, outros por negligência, todos por cretinice. A gentleman never tells, e estes cretinos não passaram de filhos da puta.

E, se fizeram, merecem ser responsabilizados pela morte dela e, na impossibilidade de fazer justiça recorrendo a uma bomba de neutrões que os levasse todos para lhe fazerem companhia, como mereciam, é da mais elementar justiça serem condenados a penas de prisão, é ainda mais justo se foram internados na ala dos sodomitas, e realmente justo seria internarem-nos lá, filmarem-nos a serem sodomizados e publicarem os filmes nas redes sociais. Olho por olho, dente por dente. Mas levá-los a julgamento por terem partilhado o filme em vez de os deixar sair sem um arranhão depois de a terem matado de vergonha já não será muito mau, e está ao alcance da justiça e do enquadramento legal que lhe determina as competências.

Esta situação [divulgação de um filme privado que os participantes quereriam manter privado] tem alguma coisa em comum com com uma praga que nos últimos anos entrou a pés juntos no debate público, a divulgação de notícias falsas nas redes sociais para incutir opiniões e, em determinados casos, encorajar à acção quem as toma por verdadeiras. Que é o facto de quem o faz, ou quem defende que quem o faz não deva ser penalizado por fazê-lo, não estar a fazer mais do que dispôr da sua liberdade de expressão do modo que bem entende, divulgando mentiras ou o filme pornográfico da colega de trabalho, e a liberdade de expressão dever ser inalienável.

A liberdade de expressão é, se me perguntarem a minha opinião, inalienável.

Posto isto, que a divulgação de informações íntimas pode provocar danos graves às vítimas da devassa ficou mais do que provado no suicídio de V., e não seria sequer preciso um fim tão trágico para haver danos, qualquer pedido de divórcio, crise conjugal, arrufo ou até um não te convido para a minha festa em querendo ela ir à festa dele poderiam ser danos originados pela brincadeira, mesmo que fosse apenas parva e não mal intencionada.

A divulgação de notícias falsas também tem, e a de notícias que insinuam comportamentos tão censuráveis ou perigosos de grupos de cidadãos que pode encorajar outros a reagir contra eles, eventualmente de modo agressivo, pode ter consequências tão trágicas como, ou muito mais trágicas do que, o suicídio de V..

Tem havido atentados terroristas cometidos por gente, normalmente com pouca capacidade de discernimento e alguma predisposição para a violência, e há sempre gente assim em todo o lado, que foi radicalizada nas redes sociais através de notícias falsas que lhes incutiram a convicção que enfrentam ameaças graves, às vezes a convicção que estão no meio de uma guerra de civilizações de que os mais apáticos ou distraídos não se conseguem aperceber mas que eles e quem os informa sabem que está em curso, e que é vital reagir com determinação e urgência a essas ameaças para salvar alguém, eventualmente salvar a civilização.

Não sei o que é que os clérigos das mesquitas onde são radicalizados os novos terroristas islâmicos, os da vaga anterior eram filhos de família oriundos das teocracias do petróleo que viajavam em primeira classe ou de jacto privado, lhes dizem, que histórias lhes contam, como conseguem convencê-los que as pessoas que lhes propõem ou eles se predispõem a matar indiscriminadamente são uma ameaça que merece ser debelada, nem estou muito interessado em saber, mas certamente terão capacidade de os convencer com factos que elas merecem o destino que tiverem. Até porque não frequento mesquitas.

Não sei de que se convenciam uns aos outros os terroristas de extrema-esquerda de há umas décadas atrás, mas também passaria certamente por pintar as vítimas como a tal nível desumanas que era melhor eliminá-las do que não o fazer, mesmo que fossem bebés de colo que um dia poderiam crescer para se tornarem fascistas ou capitalistas. Até porque não frequentava círculos de activismo da extrema-esquerda nessas décadas.

Mas sei de alguns casos recentes de radicalização de terroristas a partir de pessoas normais através de notícias falsas devidamente enquadradas por interpretações sugeridas que os levam à conclusão que só mesmo a passagem à acção directa pode salvar alguém ou o mundo das ameaças que os convencem que são graves e iminentes. Até porque frequento as redes sociais e vejo circular notícias como as que os radicalizam. E até tenho deixado por aqui e por aqui algumas reflexões e preocupações sobre o fenómeno da disseminação de notícias falsas.

Alguns casos de radicalização chegam a ser cómicos, pelo menos para quem se consegue abstrair da tragédia em que podem terminar. Como o do pacato pai de família que a frequência de redes sociais da alt-right convenceu que a cave da pizzeria Comet Ping Pong em Washington era usada para encarcerar crianças por uma rede de pedofilia gerida por Hillary Clinton, o género de "história que os mainstream media escondem pelo que não vale a pena tentar confirmá-la nas notícias", e decidiu libertá-las, viajando 6 horas até Washington e entrando na pizzeria a disparar uma arma automática, para os entendidos uma AR-15, para os leigos uma espécie de G-3, felizmente sem ter atingido ninguém. Depois de se render pacificamente explicou que se tinha rendido por ter verificado que afinal não havia lá crianças presas. Exceptuando a descomunal falta de bom-senso requerida para alguém acreditar que era possível a secretária de Estado do governo americano dirigir uma rede de pedofilia e a facilidade assustadora de se deixar sugestionar ao extremo de criar uma convicção tão sólida sobre a autenticidade da situação imaginária que só a acção directa a poderia resolver, o autor do atentado podia até ser um pai de família decente que agiu na melhor das intenções acreditando estar a salvar crianças de um inferno. Mas transformou-se num terrorista, e podia ter feito inúmeras vítimas. E acabou condenado numa daquelas penas que nos EUA são para fazer doer. Deu cabo da vida dele, e da da família.

E que papel tiveram no atentado cometido por um cidadão que até nem tinha perfil de criminoso o autor da publicação original da notícia falsa nas redes sociais e todos os que a fizeram circular sustentada por argumentos que a faziam parecer sólida e à prova de dúvidas até ela chegar aonde chegou? O mesmo que tem num pelotão de fuzilamento o soldado a quem calha o cartucho vazio: cometeram-no sem as balas terem saído da arma que todos apontaram para o cometer.

E que legitimidade tinham eles para inventar e divulgar uma notícia falsa que fazia acreditar a quem a tomasse por verdadeira que no local do atentado havia vítimas que era necessário libertar? Toda. Todos, exercendo a sua liberdade de expressão, tinham legitimidade para divulgar a notícia falsa, acreditando nela ou não.

E como lidar então com as consequências que podem eventualmente resultar do acolhimento como credível de uma notícia falsa que os autores devem ter a liberdade de divulgar sem colocar em causa a liberdade de expressão? Responsabilizando-os pelas consequências.

Como o tribunal espanhol vai avaliar que papel e que responsabilidade tiveram os colegas de trabalho de V. na sua morte, e que punição criminal eventualmente poderá ser apropriada para os confrontar com essa responsabilidade, quem coloca no exercício da sua liberdade de expressão notícias falsas a circular também deve ser responsabilizável se elas eventualmente tiverem consequências más.

Liberdade e responsabilidade são dois conceitos sem os quais não queremos ser forçados a viver, mas que só têm sentido quando usados em conjunto. Um sem o outro é caminho certo para o disparate.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 10:29
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Terça-feira, 28 de Maio de 2019

Famílias socialistas

Já tenho ponderado dedicar uma série de artigos à defesa da família com que tempero as minhas concepções muito liberais dos costumes, e poucas vezes tenho visto nestes já 62 anos de vida defender a família com a determinação comovente, quase obsessão, com que o PS que hoje está defende as famílias dos seus.

Mas para evitar meter-me num assunto que depois é tão vasto que dificilmente conseguiria estar à altura de dar conta do recado mesmo que não fizesse mais nada para além de escrevinhar neste blogue, tenho-me refreado. Por outro lado sei que, refreando-me, cometo uma injustiça por omissão.

Vou hoje, a título de excepção, homenagear uma família socialista e, nela, todas as famílias socialistas.

2019-05-28 Fernando Freire de Sousa e Elisa Ferrei

O marido da vice-governadora do Banco de Portugal que diz que o dinheiro do Estado é do PS participou no grande assalto à CGD e é presidente da CCDR Norte.

Deixo aqui a minha singela mas sentida homenagem a esta encantadora família.

 

* Fotografia roubada à revista Caras

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 18:32
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Domingo, 19 de Maio de 2019

A ética do populismo de extrema-direita

O vice-chanceler austríaco Heinz-Christian Strache, do Partido da Liberdade considerado populista de extrema-direita, demitiu-se, ou foi forçado a demitir-se, todos sabemos como os cordões sanitários são importantes na política, por ter sido apanhado numa gravação a propôr a um investidor russo a garantia de adjudicações de obras públicas desde que ele se disponibilizasse para adquirir o controlo accionista de um jornal e lhe alterasse a linha editorial para passar a apoiar o governo e "build a media landscape like Orban".

E a primeira dificuldade em sair deste primeiro parágrafo é a renitência de alguns, mais especificamente dos populistas de extrema-direita, em aceitar a classificação de populistas de extrema-direita. Enquanto extremistas como, por exemplo, os comunistas, se orgulham da sua orientação ideológica, e para muitos não há mesmo maior honra do que ser sepultado com a bandeira do Partido a cobrir o caixão, os populistas de extrema-direita parecem ter vergonha e ressentem-se de serem classificados assim, e estão normalmente dispostos a encetar discussões infindáveis para desmentir a classificação, que passam sempre pelo argumento que para os socialistas qualquer posição que não esteja de acordo com a deles é populista de extrema-direita.

A parte do populismo é de facto fácil de pôr em dúvida, porque qualquer definição de populismo passa pelo menos, para além da denúncia das elites corruptas instaladas no sistema, pela sua assumpção como um movimento de revolta das bases contra as elites, e os populismos são esmagadoramente liderados por clãs. Os Trump, os Bolsonaro, os Le Pen. Curiosamente, como os comunismos. Os Kim, os Castro, os dos Santos. 

2019-05-19 Clãs Trup Bolsonaro Le Pen.jpg

Mas abstraindo esse detalhe que põe em causa que os populismos liderados por elites sejam mesmo movimentos de bases, os populismos são fáceis de identificar, e toda a gente os identifica bem desde que não se perca a discutir a definição.

Já a parte da extrema-direita, que os revolta ainda mais por se considerarem a eles próprios no centro, no meio do povo, é mais fácil de demonstrar, até geometricamente. Se alguém considera todos os outros de esquerda está obrigatoriamente a olhar para eles da extremidade direita. Se um português vê socialistas em, para além dos partidos da extrema-esquerda incluindo o BE, do comunismo clássico do PCP, do socialismo dito democrático do PS, também na social-democracia mais ou menos liberal do PSD e do conservadorismo mais ou menos centrista do CDS, só pode estar à direita deles todos, só pode estar na extrema-direita.

O termo "populismo de extrema-direita" tem ainda uma vantagem apreciável que favorece a sua utilização, pelo menos coloquial. Independentemente de descrever fielmente ou não as características de quem refere, identifica muito bem quem refere. Quando se fala de populistas de extrema-direita toda a gente percebe de quem se está a falar, pelo que, independentemente de eles serem ou não populistas de extrema-direita, o termo tem precisão quanto baste para ser útil para os identificar.

Resignemo-nos então ao incómodo que lhes causa serem identificados como populistas de extrema-direita, e continuemos.

O que têm então de diferente os populistas de extrema-direita austríacos que foram apanhados em flagrante a propôr um esquema de corrupção a investidores russos dos populistas de extrema-direita franceses que não foram?

O exercício de funções executivas e o consequente acesso ao desvio de dinheiros públicos para benefício próprio. Os Le Pen estão na política há décadas, são talvez dos políticos franceses que estão há mais tempo instalados na política, mas nunca tiveram oportunidade, também pela exigência do sistema eleitoral francês, de ocupar funções executivas. Estão há décadas em todos os tipos de parlamento, dos locais ao europeu, mas nunca estiveram em maioria nem governaram.

Porque o sentido de ética, esse, foi sendo aferido ao longo da carreira política do clã, à medida das oportunidades que lhe foram sendo colocadas. Se nunca esteve em posição de adjudicar obras públicas, já esteve em posição de contratar assessores parlamentares ou de votar estando ausente do parlamento. E nunca se desviou de um padrão bem definido. Marine Le Pen contratou como assistentes parlamentares com o salário pago pelo Parlamento Europeu, ou pelos contribuintes europeus, que o Parlamento Europeu não dispõe de dinheiro que não seja deles, funcionários do partido a fazer trabalho para o partido, e por isso foi condenada pelo Tribunal Europeu ao reembolso de €298,497.87. O pai Jean-Marie Le Pen, e um clã é um clã, foi por seu lado condenado a pagar mais de 320 mil € pelos mesmos motivos. Quem sai aos seus não degenera.  Marine Le Pen foi também apanhada num esquema de falsificação de votações no Parlamento Europeu onde depois de ela se ausentar o seu voto foi usado pelo colega de bancada holandês Marcel de Graaff.

Estes pecadilhos, mesmo assim envolvendo somas consideráveis de dinheiro, são tão graves como a promessa de adjudicação de obras públicas a troco de um favorecimento do partido do governante? Não, nem de perto. Mas podem ser o melhor que se consegue arranjar para um político corrupto que ainda não teve oportunidade de, ocupando funções executivas, subir de divisão para a grande corrupção. São um bom preditor do que fará o ladrão, uma vez lhe seja dada a ocasião.

E isto distingue em alguma coisa populistas de extrema-direita corruptos de políticos do sistema igualmente corruptos  que também usaram dinheiro público para comprar jornais e canais de televisão, e também enriqueceram graças a gorjetas generosas por adjudicações de obras públicas? Não. Como a divisão do poder entre membros de clãs não distingue em nada os clãs de familiares de populistas de extrema-direita dos clãs de familiares, colegas de curso e de partido de políticos que já são do sistema. Como a recusa em fornecer informações a entidades de investigação independentes do executivo não distingue o boicote de Donald Trump às investigações às suas finanças pessoais ou às suas ligações com o governo russo do boicote de António Costa a fornecer às comissões parlamentares de inquérito informações sobre os créditos concedidos a amigos pelas gestões socialistas da CGD. Como a tentativa de capturar o controlo do sistema judicial, que pode facilitar tanto a vida a políticos corruptos, não distingue em nada governos populistas de extrema-direita como o de Viktor Orban de governos de partidos do sistema como o de António Costa. Políticos corruptos são políticos corruptos, qualquer que seja a sua orientação ideológica.

Mas este é justamente o ponto. Quando uma força política populista se afirma através da denúncia da falta de ética dos políticos do sistema, e há muitos com falta de ética, insinuando que têm todos falta de ética, já isto é uma falsidade absoluta, há que olhar muito bem para ela para lhe avaliar os sinais do seu próprio sentido de ética, descontar-lhe o facto de nunca ter sido posta à prova com oportunidades de praticar grande corrupção como eles foram, e perceber se tem um percurso de pequena corrupção, ou de suspeitas, ou de nepotismo, ou de recusa de cooperação com investigações independentes, ou de resistência à separação de poderes. Porque há grandes probabilidades de essa força, se acumular algum destes indícios, ser tão corrupta como os mais corruptos dos que já chegaram antes ao sistema e tiveram a oportunidade de demonstrar que são.

A palavra mais discutível no título não é afinal "populismo" nem "extrema-direita". É "ética".

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 17:05
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Sexta-feira, 17 de Maio de 2019

Os centros de decisão nacional ou, a ocasião que faz o ladrão

Quando fiz um MBA na Universidade Nova de Lisboa no milénio passado o professor José Neves Adelino disse numa aula de Finanças uma frase de que nunca me esqueci, ao longo da vida vamos guardando frases de que nunca nos esquecemos e para mim esta foi uma delas, "quando os gestores não se conseguem justificar um investimento que querem fazer aprovar através de números defendem-no dizendo que é estratégico".

Em decisões de investimento "estratégico" é a palavra mágica que cala qualquer oposição ou sequer dúvida. Tal como, incapazes de recorrer a uma verborreia cheia de palavras como "orgânico", "telúrico" ou "estruturante", temos vergonha de mostrar que não percebemos uma instalação de arte moderna, ou arquitectura já que estou com a mão na massa, dizendo que não vemos ali arte, mas merda, também temos vergonha de não estar à altura de entender o pensamento estratégico que sustenta uma decisão de investimento pelo que, para evitar passarmos por parolos, nos calamos prudentemente. O que é estratégico é para aprovar.

Vem isto a propósito das declarações recentes do professor, chamemos-lhe assim, Fernando Teixeira dos Santos, explicando o episódio Berardo como uma consequência natural da estratégia dos "centros de decisão nacional" que orientou muito do pensamento de política económica português nas últimas décadas, e intensamente o dos governos Sócrates de que ele foi membro.

2019-05-17 Teixeira dos Santos Sócrates.jpg

O professor Fernando Teixeira dos Santos será avaliado pela história a partir de muitos pontos de vista contraditórios e não sei, nem me interessa por aí além, qual deles prevalecerá. O financeiro que sustentou até ao fim os governos corruptos de José Sócrates, ou o herói que desencadeou no último minuto o pedido de assistência financeira à revelia e contra a vontade e a ira do comandante? A minha impressão pessoal, que vale o que vale, é que ele não deverá ter sido menos honesto que o antecessor mas, ao contrário deste que se levantou sem tocar no prato logo que se apercebeu da qualidade das matérias-primas usadas na cozinha, teve estômago para ficar na mesa até ao fim e sofreu as consequências de sucessivas gastroenterites até se tornar insuportável aguentá-las e chamar o 112. De qualquer modo tem, como testemunha desses tempos, a qualidade inegável do conhecimento directo de os ter vivido por dentro do núcleo mais duro que os conduziu.

Eu já me tinha aqui dedicado a apelar a que se olhasse para o caso Berardo com distância suficiente para perceber o quadro mais completo em vez de se ficar preso no detalhe que alimenta o populismo fácil dos "quando se deve mil tem-se um problema, quando se deve um milhão o banco tem um problema", "os ricos safam-se sempre", "rouba e ainda goza com o pagode", contextualizando o papel que ele desempenhou no projecto montado pelo governo Sócrates de assumir o controlo da gestão do BCP sem o nacionalizar.

Teixeira dos Santos abre ainda um bocado mais o zoom e explica, e bem, que a conquista do controlo da gestão do BCP pelo PS não deve também ser apenas vista como um mero golpe de um grupo de fora-da-lei aparentemente dentro da lei para dominar uma instituição financeira com capacidade para desviar dinheiro para projectos de investimento "amigos", ou "de amigos", mas como uma peça de um projecto mais largo que estava no núcleo da política económica do governo Sócrates, o da defesa dos centros de decisão nacional nos sectores estratégicos da economia.

Vale a pena registar algumas frases carregadas de objectividade que contextualizam os Berardo, como "Não nos podemos esquecer do que há 20 anos se tornou quase um paradigma, pelo menos entre as elites bem pensantes económicas, que achavam que precisávamos de ter centros de decisão nacional ... Foi esta ideia de os bancos arranjarem empresários portugueses que personificassem estes tais centros de decisão nacional e de os financiarem para que pudessem existir que está na raiz do que se tem assistido com a CGD". Ou até um olhar lúcido sobre a profundidade da crise como "Tivemos um capitalismo próprio sem capital próprio ... Com a crise todo esse status quo foi abalado".

Da política económica do governo Sócrates e, de facto, da filosofia económica do Socialismo, quer na forma clássica e fundamentalista do Comunismo Soviético, quer na forma mais moderna e manhosa do Socialismo Democrático. Que bebem a inspiração do princípio comum e o interpretam por caminhos diferentes.

Na primeira o controlo dos sectores estratégicos só pode ser garantido pelo Estado, sendo que o partido assegura, por seu lado, o controlo do Estado, o que significa que o controlo dos sectores estratégicos é exercido pelo partido, e como não há nenhuma alternância política este controlo é estável.

Na segunda pode ser aceitável a existência de sectores estratégicos no sector privado, ainda que volta e meia socialistas menos sofisticados se distraiam e exijam a sua nacionalização, e o seu controlo deve ser garantido através da colocação de socialistas na gestão desses sectores, o que lhes garante alguma estabilidade de manutenção dos sectores em boas mãos mesmo quando o ciclo político lhes é adverso e o governo cai em más mãos. E de algum modo comprova a estupidez dos que berram pela nacionalização mesmo depois de ouvirem o hino da CGTP horas a fio para acalmarem a sua ira revolucionária perante um mundo que nem sempre a segue: os Constâncio vão-se com as mudanças de ciclo político mas os Mexia perduram.

Para atalhar conclusões, não nos fiquemos por atribuir o caso Berardo, que é trágico, não por ele se rir, mas por nos sair do bolso a todos, à chico-espertice do próprio, apesar de ela ser real, não nos fiquemos também por atribuí-lo à chico-espertice de um partido corrupto e de um governo corrupto que o utilizaram para concretizar um plano corrupto, apesar de também ela ser real, mas percebamos que a ocasião que faz o ladrão é a intervenção do Estado na economia, e essa está na raiz de todo o pensamento económico socialista, qualquer que seja a versão do socialismo em execução.

Não querem Berardos? Retirem o Estado da economia.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 13:29
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Quinta-feira, 16 de Maio de 2019

O voto da Igreja

O Patriarcado de Lisboa partilhou nas redes sociais um quadro elaborado por uma associação de direito à vida, a Federação Portuguesa pela Vida, que resumia a posição dos diversos partidos face a diversos temas da "ideologia de género", incluindo o aborto, a eutanásia, as barrigas de aluguer, a prostituição e a liberdade de educação, e apelando ao voto nas eleições para o Parlamento Europeu nos partidos que defendem a vida, ou seja, que são pela criminalização do aborto e da eutanásia, e talvez as outras. Mais tarde retirou a publicação e classificou-a como uma imprudência, ou por ter ponderado que a recomendação incluía algum partido em cujas posições o Patriarcado não se revê, ou por preferir manter-se acima da luta política abstendo-se de fazer recomendações de voto.

2019-05-16 Patriarcado de Lisboa defesa da vida.jp

Não é a primeira vez que a Igreja faz recomendações de voto em eleições.

Nas primeiras eleições a seguir ao 25 de Abril, realizadas em 25 de Abril de 1975 para eleger a Assembleia Constituinte, o pároco de uma pequena paróquia no Alto Minho ponderou que o melhor voto dos seus paroquianos devia ser no CDS, e na missa que antecedeu as eleições comunicou-lhes essa recomendação.

Mas fez mais, sendo uma paróquia com uma elevada proporção de gente de idade e analfabeta decidiu ajudá-los a localizar o CDS no boletim de voto. Assumiu que o boletim de voto devia ter os partidos dispostos por ordem alfabética e recomendou o voto no terceiro quadrado.

E nas primeiras eleições da nossa jovem democracia a mesa de voto dessa paróquia do Alto Minho teve uma esmagadora vitória da Frente Socialista Popular, um grupo de dissidentes do Partido Socialista que sairam pela extrema-esquerda para fazer a revolução popular.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 11:26
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Quarta-feira, 15 de Maio de 2019

Jornal de campanha: aviso aos pais

Sabem onde estão os vossos filhos a esta hora?

2019-05-15 Pedro Marques escola.jpg

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 23:00
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Jornal de campanha: proximidade

O cabeça de lista do PSD às eleições europeias teve a ousadia de sobrevoar de hilicóptero as zonas assoladas pelos incêndios de 2017. A máquina de spin socialista não apreciou esta visão distante dos dramas e despachou-o com um twit a mostrar que "Em 2017, quando foi preciso, @pmdjmarques e @antoniocostapm não sobrevoaram as zonas dos incêndios, foram ao terreno, falaram e confortaram os afectados, procuraram responder à situação em articulação com as autarquias".

Proximidade, proximidade, proximidade.

2019-05-15 Twitter PS incêndios.jpg

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 22:46
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Domingo, 12 de Maio de 2019

Eutanásia

2019-05-13 Zurique.jpg

A Rosa entrou pela porta num pranto.

- O que é que aconteceu?

- A Zurique foi atropelada.

[A Zurique não é nenhum dos gatos cá de casa, é a gata da prima dela, mais ou menos contemporânea da nossa Laranjinha, mas ela tem uma ligação muito próxima com a prima, que viveu cá em casa quando veio fazer o estágio de advocacia em Lisboa e ela ainda era bebé de fraldas, e também com a Zurique, que a prima levou para casa quando nós já tínhamos uma experiência acumulada bastante apreciável de acolhimento de gatos em casa e portanto ela apoiou com know-how e logística, e afectividade.]

- Morreu?

- Não, está viva, mas está mal.

- Como foi?

- Ontem à noite ela chegou a casa com os miúdos e a Zurique não estava em casa, tinham deixado uma janela mal fechada e ela tinha mais uma vez saído [há uns meses a Zurique tinha andada desaparecida uma semana e só foi encontrada a alguns quilómetros de casa graças a aníncios colocados nas redes sociais], e quando foram à procura dela deram com ela atropelada na rua. Ela levou-a uma clínica veterinária perto de casa, onde a observaram e lhe fizeram uma radiografia, onde viram que tem o esterno partido mas não lhe detectaram lesões internas graves, e a medicaram com analgésicos, mas a Zurique passou a noite a gemer em sofrimento. E ela hoje de manhã tem um compromisso profissional a que é impossível faltar e deixou-a em casa para ir trabalhar, e pediu-me para ir lá a casa ver como ela está e levá-la à nossa veterinária, em cuja avaliação confiamos mais.

[E, chegados aqui, a gata atropelada em sofrimento apesar de medicada para as dores, alguma incógnita sobre se é recuperável ou não, fiz a pergunta]

- E ela está preparada para ser confrontada com tomar uma decisão sobre eutanásia, se a veterinária recomendar?

[Os gatos não são pessoas.

Mas há pessoas que desenvolvem com os gatos relações afectivas suficientemente intensas para lhes ser muito penoso sabê-los a sofrer, mesmo se os gatos exteriorizam muito pouco a dor, para sentir por eles compaixão semelhante à que sentiriam por um humano próximo delas. E ninguém é obrigado a sentir compaixão por gatos, de facto ninguém é sequer obrigado a sentir compaixão por humanos, mas quem tem capacidade de a sentir, por uns e/ou por outros, também não é obrigado a solidarizar-se com a falta de compaixão de quem não a tem, ou sequer de a considerar dentro do domínio da decência humana. Resumindo, há quem sinta compaixão pelo sofrimento dos gatos.

Em todo o caso, o que me fez fazer a pergunta foi um raciocínio muitos simples. Eu gostava muito que a Zurique sobrevivesse e recuperasse das lesões e ficasse boa, mas se a veterinária avaliasse que não conseguiria resistir às lesões e comulativamente estivesse em sofrimento preferia que fosse eutanasiada e cessasse rapidamente o sofrimento a que tivesse uma agonia dolorosa, como parecia estar a ter.

Faria o mesmo raciocínio se em vez de uma gata fosse um humano, nomeadamente um humano com quem eu tivesse uma relação afectiva? Não sei, e respondo assim mais por nunca ter sido confrontado com uma decisão desta natureza do que por ter grande dúvida sobre o que decidiria se fosse.

Mas suponho que já convivi com uma decisão desta natureza, mesmo sem, por pudor, a ter tentado clarificar. A minha mãe morreu nos cuidados intensivos de um hospital depois de ter estado vários dias inconsciente e mantida viva através de ventilação mecânica e outros meios químicos de que também não me procurei inteirar em pormenor, ligada à máquina como se costuma dizer. Visitava-a diariamente, falava com ela, mais porque nos filmes se diz que as pessoas naquela situação conseguem ouvir e compreender, e a ser verdade cada palavra que lhes dizemos merecer ser dita e ser uma oportunidade que não devemos perder, do que por me parecer que de facto ela estivesse a ouvir e compreender, porque me parecia que não. E uma hora de jantar, algumas horas depois de lá ter estado, o médico telefonou-me a comunicar o falecimento, que aceitei com o conformismo de quem estava à espera da notícia sem nenhuma esperança de receber uma diferente.

Nem durante o período em que foi mantida viva artificialmente, nem quando me comunicou o falecimento, confrontei o médico com o que estava a ser feito, se era o melhor para ela, se haveria alternativas mais eficazes, se teria sido possível prolongar-lhe mais a vida. Confiei no juízo dele, não quis interferir, e respeitei-lhe as decisões. Mesmo estando convencido que a última decisão dele terá sido desligar voluntariamente a máquina por ter avaliado que já não havia nada a fazer para a trazer de volta e portanto não valia a pena continuar a prolongar-lhe uma vida que já não era bem vida, mesmo acreditando que ela não estaria a sofrer. Desligar a máquina deve ser uma decisão suficientemente pesada para um médico não necessitar de ter os familiares dos doentes a moer o juízo a quem a toma com dúvidas e recriminações. E eu não lho quis moer.

E para dizer que, resumindo, estou convencido que não foi Deus que decidiu terminar-lhe a vida naquela hora mas o médico num processo de decisão grave mas respeitável e que eu respeitei, e que estou convencido que todos os dias muitos médicos se vêem confrontados com a decisão de desligar máquinas podendo-as manter ligadas, e que são decisões nobres, mesmo se a alternativa de manter os doentes vivos e eles virem a recuperar fosse infinitamente mais apelativa para todos. Se fosse possível.

E falei de casos em que se põe termo à vida de um doente sem o envolver na decisão por cessar a esperança de a recuperar, seja para lhe pôr fim a um sofrimento atroz, seja pela razão ainda menos premente de não ter sentido manter artificialmente uma vida sem viabilidade, nem sequer entrei por casos em que é o próprio doente a, com as expectativas que tem, decidir que não quer continuar a viver e pedir ajuda para morrer condignamente e sem sofrimento.

E não vi nenhum crime nos factos que descrevi nestas linhas, vi apenas afecto, compaixão e responsabilidade.]

- Está, se for essa a opinião da veterinária.

Enquanto ela se preparou e não preparou para sair o tempo foi avançando, quando passou pelo trabalho da prima para ir buscar as chaves de casa a prima já estava despachada do compromisso inadiável e foram as duas, e quando chegaram a casa a Zurique já descansava em paz. Sepultaram-na sem ter que tomar uma decisão sobre eutanásia.

publicado por Manuel Vilarinho Pires às 12:58
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