O jornal Público é uma casa de putas do Partido Socialista, de modo que não é surpreendente que tenha corrido a publicar que a Operação Marquês encontrou ligações entre a corrupção generalizada que encontrou nos governos socialistas de José Sócrates, de que os restantes membros e camaradas de partido, incluindo os que estão neste governo ou nesta direcção do partido, se têm procurado esquivar, com algum sucesso até agora, por trás da explicação que não sabiam de nada ou foram mesmo enganados por ele, e o Governo de Passos.
Estava, aliás, escrito nas estrelas, e foi devidamente divulgado pelo Correio da Manhã, que há uma estratégia de envolvimento do Marcelo e do Passos no escândalo da Operação Marquês, com recurso à técnica tradicional nos socialistas de deitar a porcaria em frente da ventoinha para que esta a espalhe por todo o lado e o mau cheiro generalizado dificulte, mesmo aos narizes mais bem treinados, a localização da sua origem, eles mesmos.
Mas não é a prostituição, mas sim a justiça, que me traz aqui hoje. E vou aproveitar a informação que o jornal Público, insuspeito de querer embaraçar a justiça para tentar safar o governo do Passos, publica sobre a substância do processo para olhar para ela.
Mas ainda antes de entrar no tema quero contextualizar o que vou dizer a seguir.
Eu tenho a certeza absoluta que o José Sócrates é um vigarista, de carácter, e corrupto, de obras. Ele e todos os que fazem parte do grupo dos dois últimos primeiros ministros que os socialistas deram ao país, posso até acrescentar. E como a minha convicção pessoal não lhes causa mais prejuízo do que o meu asco pessoal relativamente a eles posso formulá-la sem necessidade de respeitar todos os princípios que a justiça deve observar para formular uma convicção, que aliás são equivalentes aos que as ciências exactas respeitam, que não necessariamente as ciências humanas, nomeadamente o ónus da prova na acusação e o in dubio pro reo, porque os erros judiciais podem resultar em crimes, se não formais, pelo menos de facto, o que ainda é pior por então serem crimes sem castigo, contra direitos fundamentais, desde a liberdade à vida, em função da cultura civilizacional, das vítimas deles. Mas eu posso dedicar-lhes asco apenas pela pinta deles, e é o que faço.
E faço parte de uma das mais ínfimas minorias da democracia portuguesa, ainda mais rara do que os social-democratas do PSD em extinção nos discursos do Pacheco Pereira, a dos eleitores de partidos de direita que não idolatram os magistrados que têm conduzido a Operação Marquês apenas por eles terem entalado o melhor que sabiam, e sabiam muito bem, o vigarista socialista José Sócrates. Por uma razão obtusa, mas que é minha. É que, mais importante do que a punição judicial de um primeiro-ministro corrupto que a mereça, e é muito importante que seja efectivamente punido, mas é apenas um episódio específico da história geral, chamemos-lhe assim, da democracia, é o respeito absoluto e permanente pelos fundamentos da democracia, nomeadamente os princípios da justiça enumerados acima, que não servem para proteger os criminosos com garantismos, mas os inocentes com garantias, e mais do que isso, para evitar os erros judiciais que tornam a justiça inútil, até porque sempre que um inocente é condenado por um crime, o culpado desse crime é ilibado. E sem Justiça não há Democracia, há selvajaria.
Partilho integralmente, portanto, a ambição de justiça mas também o cepticismo do meu ilustre vizinho José Meireles Graça relativamente aos resultados da Operação Marquês e a convicção que os direitos humanos básicos nem sempre ocupam o topo das prioridades dos magistrados judiciais. E até posso resumir a razão do meu cepticismo evitando formular teorias da conspiração como a de a justiça se sentir obrigada a transmitir à sociedade uma imagem de dureza impiedosa com os poderosos para branquear a imagem de tolerância com eles que adquiriu ao longo de décadas de inacção, ou de a mediatização de alguns magistrados poder ter objectivos que não necessariamente a melhoria da administração da justiça, cuja plausibilidade não tenho meios de confirmar nem desmentir. É que, no vastíssimo acervo de informação que a acusação fez chegar aos jornais que escolheu para publicitar o andamento do processo, desde quando ainda nem havia arquidos nem defesa, e é por isso que digo com segurança que foi a acusação a fazê-lo, vi muito mais conjecturas e hipóteses plausíveis da acusação do que factos que as fizessem passar de plausíveis a provadas, que são exactamente o objectivo do trabalho da acusação. Hipóteses plausíveis formulamo-las nós nas redes sociais gratuitamente sem recebermos salários nem subsídios de renda, mas é a prova delas que justifica o dinheiro que se gasta nos salários daquela gente. Pode ser que, as provas, a acusação as tenha mas se escusasse a mandar publicar nos jornais para as guardar para apresentar em tribunal, como aliás devia ter feito com tudo o que publicou. Pode ser, e nesse caso é provável que o processo seja tão sólido como se deseja. Mas não há informação publicada que me confirme que seja o caso. Pelo que me fico por um oxalá.
Finalmente, é muito difícil fazer partilhar aos eleitores do meu lado do espectro político o meu cepticismo reativamente à qualidade de uma acusação que se dirige a um corrupto para além de qualquer dúvida do outro lado do espectro político. Se o homem é corrupto, e, acrescento eu, se nos é tão antipático como ele consegue ser, e não por ser socialista, mas pelo carácter que tem carimbado na cara, eles devem ter certamente razão. Mas será mais fácil convidá-los a olhar com alguma objectividade para a qualidade da mesma acusação na parte que toca a suspeitos deste lado do espectro político e sem a capacidade quase inigualável, pelo menos quando se deixa de lado o António Costa, do José Sócrates para despertar antipatias.
Mas vamos então ver o tal envolvimento do Governo de Passos na Operação Marquês.
A suspeita sobre o governo do Passos incide, especificamente, sobre o secretário de Estado das Obras Públicas Sérgio Monteiro. E como é que se chega a ela?
Isto é matéria da governação socialista do José Sócrates que não tem nada a ver com o governo Passos, adiante.
Qualquer privado que negoceia com o Estado sabe que está a negociar com um agente económico que negoceia de má-fé e não hesita em violar os termos de qualquer contrato em qualquer circunstância em que lhe seja favorável violá-los, pelo que uma cláusula destas tem todo o sentido do ponto de vista do privado e não constitui o mais leve indício de ilicitude. O mesmo não pensa o Ministério Público que conduziu o Processo Marquês do governo que a aceitou, considera mesmo essa cláusula ilegal, mas mais uma vez foi o governo Sócrates que assinou o contrato e isto continua a não ter nada a ver com o governo Passos. Adiante.
Chegamos então ao Sérgio Monteiro. E o que é que ele fez? Rescindiu o contrato, fatalidade que já era antecipável em 2010 quando ele fora assinado pelo governo Sócrates por já ser conhecida a impossibilidade de encontrar financiamento para o cumprir, e foi justamente aí que residiu a maior vigarice do José Sócrates neste negócio específico, fazer dele um fait accompli para garantir aos amigos privados algum rendimento mesmo que o contrato não se viesse a completar como não veio, nos termos previstos no contrato, ou seja, convocando um tribunal arbitral para decidir os termos da rescisão e as indemnizações devidas ao consórcio, aliás, as que também estavam prescritas no contrato. Ou seja, cumpriu os termos de um contrato assinado por outros, por outro governo, mesmo para proceder à sua rescisão.
Para não correr o risco de cometer um crime de desrespeito com magistrados do Ministério Público, em Portugal há um elevado grau de liberdade de opinião, recentemente ameaçado por algumas forças políticas com uma força política desproporcionada da sua representatividade social e eleitoral, mas há áreas onde a livre expressão da opinião pode constituir crime, eu escuso-me a dar a minha opinião sobre as pessoas que pensam que cumprir um contrato é "obscuro". São, isto posso dizer, pessoas com alguma flexibilidade na interpretação das responsabilidades das partes ligadas por um contrato. Também posso dizer que são pessoas que eu não quero para amigas pessoais. E fico por aqui.
Temos portanto os magistrados da Operação Marquês a considerar suspeito um governante por ter cumprido os termos de um contrato assinado por outros governantes de um governo anterior e que por esse motivo o obrigava a ele quando entrou em funções. Generalizando, e em termos que não constituam crime de desrespeito pela autoridade, eu sou capaz de considerar que estes magistrados têm para formular suspeitas uma bitola mais baixa que a minha, que exijo para as começar formular algum indício de menor lisura do que cumprir os termos de um contrato que obrigue o suspeito, que considero mesmo um indício razoável de lisura. Espero, a bem da probabilidade de este processo resultar em condenações em tribunal e de se fazer Justiça, que as acusações que formularam ao José Sócrates decorram de uma bitola mais alta e sejam mais sólidas do que esta suspeita.
Mas a suspeita formulada ao Sérgio Monteiro no âmbito deste processo tem ainda um detalhe que, se corresponder a uma prática generalizada, não abona em favor da minha admiração por estes magistrados: o assassinato de carácter através da insinuação de ele ter interesses pessoais envolvidos no negócio por ter participado no consórcio privado como representante do banco financiador antes de entrar para o governo. E que banco é que ele representou no consórcio privado? A Caixa Geral dos Depósitos.
Tudo junto, o modus operandi dos magistrados da Operação Marquês no caso específico do Sérgio Monteiro não me desperta confiança nenhuma na qualidade do processo. E eu convido os que circunstancialmente festejam este processo por acusar o José Sócrates como festejam um golo do seu clube, mesmo que tenha sido marcado com a mão, a olharem mais objectivamente para a justiça, pelo menos quando mete golos à mão na vossa baliza e não vos incentiva à euforia, e a elevarem a sua exigência na qualidade da justiça, sem a qual é mais do que certo que a qualidade não aparece, com custos inimagináveis para o futuro de todos.
Ah, o Público tentou obter uma reacção do Pedro Passos Coelho que, educado como é, não mandou os jornalistas para a p. que os pariu. Nada de novo, também aqui.
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