Daqui a dias o Orçamento será aprovado. O PCP dirá, com indignação, que são os mesmos de sempre a pagar, e que prossegue a senda dos ataques aos direitos dos trabalhadores e da destruição do Estado Social e do País. Já anunciou aliás, desarmando as dúvidas que nunca ninguém teve, que votará contra.
O PS queixar-se-á dos aumentos dos impostos, das reduções dos benefícios, do aumento da dívida pública e da continuação da austeridade. E já anunciou, desarmando as dúvidas que nunca ninguém teve, que votará contra.
Os Verdes não existem senão para aumentar o tempo de antena do PCP, e o BE dirá o mesmo que dizem os primos, como sempre, com mais ou menos arrebiques. Se já anunciou como votaria ignoro, mas ninguém ignora como votará.
A maioria votará a favor. Não pode fazer outra coisa, desde logo porque o documento já terá o visto prévio de aprovação de Bruxelas, onde reside, não direi a casa da Democracia - essa continua a fingir-se que é em S. Bento -, mas a sede verdadeira do Poder Legislativo. E, se tiver juízo, do que é lícito duvidar, fá-lo-á com melancolia e desgosto.
Melancolia porque na votação do Orçamento para 2016 já lá não estarão muitos dos que obedientemente votarão agora; e desgosto porque este Orçamento é um desastre, representando o último capítulo de uma governação falhada.
Há alguma medida séria e profunda de reforma do Estado, isto é, extinção de serviços públicos, revogação de legislação que atrapalha e onera a actividade económica, simplificação de procedimentos? Não.
Se, do lado da despesa, não há nada, salvo uns aumentos mal explicados aqui e ali, porquê a desonestidade intelectual das medidinhas do lado da receita para induzir as pessoas a pensarem que há alguma redução que valha a pena, ao mesmo tempo que se aumentam os impostos sobre combustíveis, com a descarada (não menos descarada por haver quem acredite nestas caraminholas verdes) desculpa da melhoria do ambiente?
Não falo do cenário previsto de crescimento. Sobre isso sei tanto como as pessoas que o estabeleceram em 1,5%, e tanto como as pessoas que acham que não se chegará lá, isto é, nada.
Nem falo da decantada redução do IRC para 21%, senão para perguntar se alguém acredita que a redução atrairá algum investimento estrangeiro, ou incentivará o nacional; se alguma empresa que esteja mal ficará melhor; e se as poupanças nas empresas que têm lucros significativos, positiva embora, justifica o trombeteamento da medida, sabendo-se, como se sabe, que ela será revertida logo que o dr. Costa comece a tomar medidas para o quarto resgate.
Mas, sendo tudo o mais incerto, os aumentos de impostos ficarão. E ficará também a celerada redução dos direitos dos contribuintes, entretanto agravada com mais este escândalo.
Tudo vale a pena se a alma não é pequena, disse o poeta. Mas a alma era pequena em 2011; e os tomates também, digo eu. Por isso a reforma não se fez, conforme confessou o malogrado Vítor Gaspar pouco depois de dar à sola. Agora é tarde, como o Orçamento confirma.
Mas mesmo tarde há limites para a asneira. E mais valia vivermos em duodécimos, ou copiar o Orçamento actual, com as adaptações inevitáveis, do que aproveitar a 25ª hora para reforçar o totalitarismo fiscal.
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