"Incentivar os contribuintes a pedir factura" foi uma das mais tristes iniciativas que o governo anterior tomou, num longo rosário delas em matéria fiscal.
A medida foi, à época, denunciada raramente por aquilo que é: um apelo ao baixo instinto policial do cidadão invejoso e controleiro, a consagração do espírito queixinhas e da mentalidade de dependente do Estado, e o reforço da ideia deletéria que todo o comportamento deve ser vigiado, sendo a função de polícia um dever que incumbe não apenas a categorias especiais de funcionários mas também aos contribuintes.
Este passo foi acompanhado por um crescimento demencial do controle electrónico da vida dos cidadãos, disponibilizando à Administração informações que a seu tempo, e sempre à boleia das mais sonoras boas intenções, serão utilizadas para abusos, prepotências e policiamentos - hoje do evasor fiscal, amanhã do desalinhado que não pensa nem faz o que o Estado do dia (quer dizer, quem o controla, porque o Estado não somos nós todos, é apenas quem decide em nome dele) acha bom para a comunidade.
Pode-se elaborar interminavelmente em torno deste assunto. Mas não adianta: as sociedades totalitárias encontram sempre quem as sirva e costumam nascer trombeteando intenções generosas, no seu dealbar gozando do apoio das populações; e já o amor da Liberdade, que por definição não inclui à esquerda a liberdade económica, costuma ser escasso em toda a parte. Que quem pariu este monstro corruptor e putrefacto fosse do partido dos contribuintes, que é por acaso o meu, também não é particular surpresa: estatistas não são raros à direita; e burros teimosos também.
Previsivelmente, num tempo em que o costismo tudo reverte e desfaz, a corrupção das consciências e dos comportamentos mantém-se. Mas o Audi, o Audi não - agora são certificados de aforro. Faz sentido: a merda do carro não agradaria a toda a gente, desde logo porque faz lembrar excessivamente a condição de rico, um estado de pecado. Já o aforro, se for no Estado, é uma coisa virtuosa, porque lhe dá meios para comprar votos com benesses e investir em elefantes brancos. E depois é sempre possível, quando convier, alterar unilateralmente o prazo de reembolso e a taxa de juro.
Isto se não der mais jeito ainda inventar um truque qualquer para o sorteio não funcionar. É Costa que manda, lembremos, e o homem é especialista na área de minas e alçapões.
E depois a moeda de troca de o Estado nos fiscalizar a todos é que ninguém o fiscaliza a ele. Não faço a demonstração: quem dela precisar não está em condições de a entender.
Blogs
Adeptos da Concorrência Imperfeita
Com jornalismo assim, quem precisa de censura?
DêDêTê (Desconfia dele também...)
Momentos económicos... e não só
O MacGuffin (aka Contra a Corrente)
Os Três Dês do Acordo Ortográfico
Leituras
Ambrose Evans-Pritchard (The Telegraph)
Rodrigo Gurgel (até 4 Fev. 2015)
Jornais