Eu e Jorge Jesus somos possivelmente os dois únicos cidadãos que não têm, sobre a crise grega, ideias claras. E sobre a ignorância que lhe assaco não estou absolutamente certo: é possível que a ausência de opiniões conhecidas se deva ao facto de os jornalistas, incompreensivelmente, não o inquirirem sobre o estado de alma, e as verdadeiras intenções, do engenheiro Alexis e do professor Varoufakis.
Talvez ele, desde logo com a vasta experiência que se lhe reconhece sobre a moda actual no seio dos futebolistas de sucesso, pudesse esclarecer o significado das toilettes: aqueles dois celebrados estadistas não usam gravata porquê?
Os políticos, homens e mulheres, com mais ou menos gosto, ou sobretudo falta dele, vestem-se com discrição porque pretendem que os imaginemos sérios, preocupados com a coisa pública, e portadores de ideias salvíficas e profundas que não casam com vestimentas fora do convencional. E porque, se não fosse assim, em vez de ouvirmos com preocupação a mais recente declaração da chanceler Merkel, ou o último discurso pós-prandial do senhor Juncker, comentaríamos a minissaia com a qual a senhora se apresentaria aos senhores deputados no Bundestag; ou o débardeur e os shorts com os quais, nestes dias de calor, o senhor presidente da Comissão se dirigiria aos jornalistas - duas possibilidades, de um vasto leque, verdadeiramente aterradoras.
É certo que, entre nós, alguns deputados se apresentam no Parlamento de pijama; e no país aqui ao lado há pelo menos um político de sucesso que tem um aspecto excessivamente piolhoso. Mas não estão no Poder executivo - aquela dupla está.
Está e não optou pelo look décontracté chic por acaso - aquilo significa alguma coisa. Jorge Jesus, com a sua chiclete, o seu penteado e o seu conhecimento dos meandros da moda entre a juventude dourada, poderia certamente descodificar - mas só lhe fazem perguntas sobre o plantel para a próxima época.
Quanto às outras dúvidas, não vejo especialista que nos esclareça: o que é que Obama tem dito a Merkel que a fez ficar tão maternal e tão predisposta a cedências às cigarras gregas? O que foi que Tsypras e Putin combinaram, se alguma coisa? O Syriza em geral, e a dupla dos Louçãs bem-vestidos, acham, como os eleitores, que a Grécia está melhor no Euro, ou entendem que estaria melhor fora, caso em que, na realidade, gostariam de ser empurrados? O colossal aumento de impostos, que parece que aceitaram, é para valer ou um expediente para mergulhar a Grécia num caldeirão revolucionário?
Não sabemos. Que sabemos então? i) Que a Europa fará tudo, mas tudo, inclusive adoptando um tratamento completamente diferente daquele a que Portugal e Irlanda tiveram direito, desde que a Grécia finja que vai cumprir um programa de austeridade; ii) Que os Gregos continuarão a querer comer o bolo e guardá-lo, uma vez que não podem imaginar-se fora do Euro, mas necessitam transferências permanentes de outros países; iii) Que o querido projecto da União pode progredir, agora com a evidente necessidade da união bancária, fiscal, orçamental, criminal e outros ais, para evitar novas grécias; iv) E que, qualquer que seja a solução encontrada, nenhuma funcionará.
Quer dizer: eu sei; Jorge, talvez, também: o homem pode exprimir-se no dialecto das classes mais desfavorecidas da Amadora, mas burro não é.
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