Ninguém vai ligar à notícia: essa merda do aquecimento global é lá coisa deles, que se entendam - se bem que o tempo não está como antigamente, lá isso não, como já os antigos diziam. E o efeito de estufa preocupa, agora que vamos entrar no Inverno, sobretudo por causa da falta de qualidade dos tomates da dita, que são esponjosos.
Na prática, o aquecimento global (ou alterações climáticas, como se começou a dizer quando a temperatura parou de subir, contradizendo as previsões) cumpre várias funções úteis: i) Mobiliza os moços das causas (há uma grande abundância de moços para causas, cheios de educação, formação, vícios e telemóveis, mas sem emprego) para esta relativamente inócua, impedindo-os de partir montras e incendiar automóveis em nome de coisas mais perigosas, como ideologias radicais e o ISIS; ii) Dá visibilidade, quando não oportunidades de emprego, a lunáticos como aquela simpática gente da Quercus e congéneres por todo o mundo capitalista poluidor; iii) Proporciona subsídios para investigação mais ou menos científica, viagens para conferências e cimeiras, e prebendas várias, sem que o contribuinte tuja - é para a causa; iv) Fornece uma excelente arma de arremesso para os políticos estatistas reforçarem o poder do Estado e multiplicarem regulamentações, intervencionismos sortidos e criação de agências com o louvável propósito de, superintendendo na actividade económica, garantirem que não viremos a morrer afogados, por causa da subida do nível das águas do mar, de fome, por danos irreversíveis à agricultura, de sede, por se esgotar a água, e em calamidades, que a mãe Natureza despejará sobre nós - se não os ouvirmos.
O nosso relativo atraso deveria proteger-nos desta onda de patetice. Mas não, estamos albardados com um Ministério do Ambiente que, para já, com o propósito de nos garantir um futuro risonho, se desentranhou em impostos verdes, que se distinguem dos outros por se dizerem virtuosos, e se prepara para embrulhar a vida de toda a gente com várias dezenas de quilos de legislação preventiva de grandiosos desastres imaginários, ao mesmo tempo que vai causando pequenos desastres reais.
Exagero? Quem me dera: aqui há um bom par de anos fui obrigado, como todos os fabricantes, a fazer largos investimentos para deixar de utilizar um gás frigorífico tradicional e passar a usar outro, moderníssimo, que não contribuía para o buraco do ozono. Os meus colegas chineses, que tinham grandes quantidades de gases antigos para escoar, resolveram o problema de uma forma que me pareceu muitíssimo esclarecida, mudando as etiquetas dos aparelhos frigoríficos para as novas designações, e exportaram-nos para cá enquanto na Europa a produção e comercialização dos gases antigos, mais baratos, foi proibida.
Claro que o efeito que os gases que então se usavam teria provocado na camada de ozono nunca foi universalmente aceite pela comunidade científica, desde logo porque, historicamente, a camada de ozono sempre variou, e houve buracos muito maiores quando não havia nem frigoríficos, nem aerossóis, nem queima de combustíveis fósseis, nem cientistas, nem aldrabões. Mas isso não impediu uma simpática engenheira de uma associação do sector (as associações costumam desempenhar, por razões que não vou detalhar, um papel nestes processos) de me tentar, ameaçadoramente, e a outros pequenos fabricantes, mudar a mentalidade, coisa que não me caiu particularmente bem, por sempre ter tido as melhores relações com a mentalidade de que estou servido.
Bom. Os Chineses encheram a burra, as multinacionais dos gases também, quem sobreviveu cá está, o R12 que eu usava (assim se chamava o mafarrico) desapareceu, mesmo na China, e o buraco de ozono fez o favor de sumir, pelo menos das notícias.
Estava eu posto em sossego, dos meus anos colhendo o amargo fruto, e zás: tenho debaixo dos olhos o Regulamento (UE) 517/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, "relativo aos gases fluorados com efeito de estufa". Mas que grande galo: o gás que agora uso, de seu nome R-134a, tem um "ozone depletion potential" de zero, mas um "global warming potential" de 1300.
Isto não pode ser. E portanto é preciso mudar tudo. Mas, desta vez, haverá necessidade de certificações várias, fiscalizações, pessoal especializado e o diabo a sete. É que os gases recomendados são explosivos e com isso não se brinca.
Prepare-se, amigo leitor: é provável que o seu próximo frigorífico tenha um gás explosivo. E portanto haverá incidentes. Mas que importa isso? Se morrerem localmente uns quantos cidadãos azarados, será pela irrefragável causa de não morrermos todos por efeito do aquecimento global. Justíssimo. E, é claro, o negócio terá, como sempre ganhadores, perdedores e ingénuos. Não faço parte dos primeiros nem dos últimos.
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