Desde sempre que gosto de ver os jogos da Selecção Nacional. Além destes, um ou outro entre países terceiros, por ocasião do Campeonato do Mundo, sobretudo os do Brasil porque aquela gente tende a jogar bonito, e por ocasião do Campeonato da Europa, sobretudo os da Alemanha porque aquela gente tende a jogar eficiente e nunca desistir, mesmo quando as coisas correm mal.
Em casa, as arbitragens suspeitas, claramente enviesadas a favor dos grandes, a preguiça, o calculismo ou a falta de preparação física dos jogadores, para não falar da mediocridade da maior parte, levam a que não veja nada, excepto ocasionalmente o Porto, porque sim.
Debates não, por razões sanitárias; jornais desportivos nunca, por medo do que a falta de superfície do assunto, e o tráfico de influências, fazem a uma prosa destinada a fanáticos; dos dirigentes sei que é gente que no geral só se poderia convidar para jantar tendo o cuidado prévio de esconder as pratas; dos treinadores que são pessoas muito interessantes durante meia hora; e dos jogadores que não se lhes deve permitir o convívio com filhos adolescentes, não vão fascinar os moços com os seus penteados ridículos, e as moças com o seu encanto de efebos acéfalos.
O mundo do futebol adquiriu no nosso país uma importância absurda: nas programações das estações televisivas ocupa horas infinitas; gente séria dedica-lhe a profundidade das suas considerações eruditas; os jornais desportivos vendem-se muito mais do que os comuns; os poderes públicos disputam a simpatia dos amantes da bola, e atribuem aos clubes benefícios que outras colectividades não têm; e, nos dias de jogos grandes, suspendem-se as regras de estacionamento, e as da civilidade, para acomodar a mole excitada dos adeptos, que vai para os estádios procurar o consolo da diluição da individualidade na camaradagem da tribo.
O outro lado deste quadro é que o país tem internacionalmente, no mundo da bola, uma importância e sucesso que não tem em nenhum outro domínio; dezenas de milhares de miúdos praticam desporto atrás do sonho de serem craques; exportamos regularmente futebolistas e treinadores, a peso de ouro; e o turismo beneficia da notoriedade que estes deuses da contemporaneidade adquirem.
Deuses da contemporaneidade. E, neste Olimpo decadente, o Zeus incontestado é, merecidamente, Ronaldo. Não podemos por isso deixar de ter em atenção o que Zeus faz. Não tanto por ele, mas pelo exemplo que dá.
Ronaldo comprou dois Nenucos, um menino e uma menina, nos Estados Unidos. É provável que o preço impressione muita gente porque sabendo-se cada vez mais o preço de tudo, e o valor de nada, a quantia excite a inveja de algum esquerdista mais militante, e menos apreciador do craque.
Mas o preço não importa ̶ se fosse dez vezes mais Ronaldo poderia com a mesma facilidade pagar; e com dez vezes menos, como será provavelmente o caso com outras incubadoras de menor prestígio, o artigo ficará acessível a gente de poucas posses, o que será possivelmente considerado mais igualitarista e democrático.
Este contrato de compra, em Portugal, não seria para já possível. Infelizmente, não há tendência, moda, comportamento, doutrina, que não chegue às nossas costas, ainda que com algum atraso. E em se tratando de produtos da tecnologia, modernidade, e engenharia social, o atraso é cada vez menor ̶ não se pode parar o pugresso.
Os engenheiros sociais têm entre nós uma Ordem, liderada pelo Bloco de Esquerda, que acha que o papel dos pais e o das mães é comutativo, um pai e uma mãe são perfeitamente equivalentes a dois pais ou duas mães, a ascendência biológica está exactamente no mesmo plano que a ascendência de encomenda, a família tradicional é uma obsolescência a combater; e que a normalidade não existe, nem as excepções, porque a regra é não haver excepções, ou as excepções serem a regra.
Podem, sobre esta matéria, escrever-se, e têm-se escrito, tomos. Mas um tipo que manda fazer um filho (no caso, dois, porque a Natureza não respeitou a encomenda) a preço certo, por não estar disposto a aturar mulheres nem o que elas custam se as reconhecermos como mães que engravidamos, pode ser descrito como um inconsciente, ou um pulha se quisermos ser severos. E uma mulher que aluga o seu corpo, sem estar em estado de necessidade, só não merece ser tratada como prostituta porque estas cumprem uma função socialmente útil e não prejudicam terceiros.
Vai gostar muito dos gémeos, decerto ̶ são filhos dele e decidiu tê-los. Talvez um dia um deles lhe diga, como eu diria: deste-me tudo o que uma criança e um adolescente podem ter mas tu, não o destino, escolheste que não teria mãe. Não tinhas esse direito, e bardamerda para tudo o mais.
Pois não, não tinha. E mesmo que o prestígio de Cristiano, os ventos da modernidade e as blocas ganhem o dia da Família Nova, que é em parte o Homem Novo com outras vestes, continuará a haver quem diga: Bardamerda.
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