Andam por aí umas sondagens que fundam a previsão de que o Bloco de Esquerda se arrisca a desaparecer nas próximas legislativas, a benefício do PCP e do PS. Feia coisa: o regime democrático fica-o menos com o reforço do PCP; e a vitória do PS é, se for absoluta, a garantia de um segundo resgate, logo que as instâncias europeias não possam mais fechar os olhos à contabilidade pública criativa, para disfarçar as derrapagens; e, se for relativa, a garantia de um segundo resgate devido à barafunda dos governos fundados em coligações contra-natura, com o alto patrocínio do senhor Presidente da República.
O Bloco é uma associação recreativa fundada para acolher comunistas desgostosos com as aplicações concretas da doutrina e ávidos de a casar - como se fosse possível - com a democracia parlamentar; doentes infantis do comunismo que precisavam de um veículo para lhes conferir notoriedade; e sociais-democratas que detestam o PS amigo da banca, dos ricos e das negociatas.
A prazo, esta gente tinha que se zangar: um comunista é detentor de uma doutrina científica para regulação da sociedade; qualquer um entende que não pode haver, sobre a mesma realidade, duas verdades científicas diferentes; e assim os que caem fora do círculo que detém a liderança são inimigos de classe e apóstatas, se o Partido estiver no Poder, e dissidentes, se não estiver. De sociais-democratas nem falemos, que são pouco menos que traidores, aliás e de toda a evidência em trânsito para o PS.
Tenho pena: que a serenidade e boa-educação de João Semedo, enquanto debita aquelas piedades esquerdistas; o friso de caras bonitas com que o BE sempre abrilhantou as listas (a par de alguns camafeus, que a perfeição não é deste mundo); até mesmo a verve pseudo-democrata de Louis Le Rouge Fazenda, a contracenar com parlamentares burgueses; a constante pulsão para reformar a Europa e lhe dar lições, como se um bando ingénuo de ignotos radicais pudesse dar ao País a importância que este não tem - tudo me deixará saudades.
Há porém limites para o sentimentalismo: que frei Anacleto Louçã e a sua fundamental incompreensão dos mecanismos da economia, embrulhada em suficiência catedrática e brilho oratório de lantejoulas populistas - t'arrenego.
Mas enfim, extinto o Bloco, quem - quem? - se ocupará de coisas tão necessárias como a criminalização do piropo, na qual aliás, sem sucesso, foi pioneiro? É que podemos sorrir e achar que, desaparecidas em combate aquelas meninas azougadas do BE, tão queridas, ficamos livre desta e doutras tolices. Puro engano: a coisa, afinal, é europeia ou, no mínimo, de Bruxelas, uma cidade que cozinha superlativamente mexilhões e parvoíces. E, se é bruxelense, o PS virá, a seu tempo, tentar importar o disparate.
E a perspectiva de ver a planturosa Canavilhas ou, pior, a esfusiante Moreira, a defenderem penas de prisão para atrevidos - perdão, mas dá-me saudades do BE.
Blogs
Adeptos da Concorrência Imperfeita
Com jornalismo assim, quem precisa de censura?
DêDêTê (Desconfia dele também...)
Momentos económicos... e não só
O MacGuffin (aka Contra a Corrente)
Os Três Dês do Acordo Ortográfico
Leituras
Ambrose Evans-Pritchard (The Telegraph)
Rodrigo Gurgel (até 4 Fev. 2015)
Jornais