Sabemos, apesar da publicação de estudos de resultados mistificados por investigadores amigos da maioria de esquerda tentar afirmar o contrário, que a desigualdade diminuiu em Portugal durante a legislatura anterior, e nomeadamente durante a implementação do programa de assistência financeira da troika e da severa austeridade a que o país se viu forçado a submeter para conseguir sobreviver com os meios limitados de que dispunha.
* Gráfico martelado pelo autor
Sabemos que as medidas mais significativas do governo actual que afectam a distribuição de rendimentos favoreceram em 2016 e continuarão a favorecer em 2017 os que têm rendimentos mais altos, e até muito altos, sem qualquer benefício para a esmagadora maioria dos que têm rendimentos mais baixos, ou até muito baixos, e que as alterações propostas à tributação do património também favorecem mais os que têm mais, e até muito mais, e até os evasores fiscais.
Não sabemos, infelizmente, o modo como esta política que, escondida por trás de uma retórica socialista de diminuição da desigualdade através da tributação da riqueza, parece concertada em voltar a aumentar a desigualdade a afecta, porque o índice de Gini é calculado com um recuo extenso, e ainda nem sequer existem publicadas estimativas para 2015. A este ritmo é natural que só lá para 2018 consigamos perceber o que aconteceu à desigualdade neste ano de devolução dos rendimentos aos portugueses de 2016, e em 2019 no da consolidação orçamentada dessa devolução de 2017.
Temos que esperar para ver.
Mas a conjugação de todos os factores enumerados acima aponta para um aumento da desigualdade, que só será compensado se a redução do desemprego, que reposiciona os desempregados que arranjam emprego da cauda da distribuição de rendimentos para zonas menos extremas, que tem sido reivindicada pelas estatísticas estiver a ser real, e não um mero artifício demagógico proporcionado pela manipulação das estatísticas reais. E os números de crescimento anémico que têm sido publicados não lhe dão grande sustentação.
É provável que a desigualdade esteja a crescer no Portugal governado por socialistas sustentados no poder por bloquistas e comunistas. É apenas um dos custos de mais uma tentativa de reciclar um marxismo cada vez mais retardado.
Todos gostaríamos de viver num país onde a desigualdade na distribuição de rendimentos é baixa, como a Suécia, abstraindo o clima e as pessoas para quem prefere o português e os portugueses, se bem que nem todos gostassemos de viver num país de desigualdade igualmente baixa, como a Ucrânia. Mas, para níveis de produção de riqueza semelhantes, é melhor um país com menos desigualdades, nomeadamente no domínio da igualdade de oportunidades que permite aos mais capazes e competentes contribuirem para o progresso colectivo sem serem impedidos, empobrecendo a sociedade, por origens sociais desfavoráveis.
Desde que se iniciou o ajustamento, e podemos, para abreviar sem desgastar a conversa com discussões sobre quem conduziu Portugal à circunstância de, em última instância, emitir um pedido de assistência financeira internacional, nem de quem negociou e formulou com os parceiros internacionais o programa de assistência, porque não vale a pena discutir questões de Fé com quem crê que o ajustamento foi obra da vontade de quem o implementou, considerar que o ajustamento se iniciou quando entrou em funções o primeiro governo de coligação PSD-CDS presidido pelo Pedro Passos Coelho em 2011, e se desencadeou a grave crise económica e social que sempre acompanha os ajustamentos, e também não vale a pena gastar tinta, porque também é uma questão de Fé, a discutir se a crise foi da responsabilidade do governo que conduziu Portugal ao ajustamento, ou do que o tirou da crise ao longo do, e graças ao, ajustamento, que o governo foi acusado de aumentar as desigualdades, sacrificando os pobres para beneficiar os ricos.
A observação das medidas mais significativas que afectaram o rendimento, nomeadamente os cortes nos salários da função pública e nas pensões públicas, não sugere intuitivamente que a desigualdade tendesse a aumentar, nomeadamente por todos os cortes terem salvaguardado os funcionários e pensionistas com rendimentos mais baixos, ainda que com limites de salvaguarda tristemente baixos, nécessité oblige, e terem sido fortemente progressivos com os rendimentos, nomeadamente nas pensões, em que os cortes atingiram 25% na parte que excede 4.611 e 50% na parte que excede os 7.000 euros por mês, sendo que os cortes nos salários da função pública, que atingiram 10% nos salários superiores a 4.200 euros, já vinham, nem toda a gente gosta de se lembrar, do tempo do governo socialista anterior, do José Sócrates.
Mas a esmagadora maioria dos observatórios, centros de investigação, académicos, partidos de esquerda, proto-partidos de esquerda, organizadores de manifestações de esquerda, para não falar no braço armado da esquerda na comunicação social, os jornalistas, e da sua tropa de elite, os comentadores, desataram a berrar, e ainda não se calaram, que as desigualdades aumentaram de modo gritante durante o ajustamento, com o complemento implícito ou explicitado que aumentaram por vontade do governo, por razões ideológicas de neoliberalismo, provavelmente para oferecerem uma mão-de-obra aflita e barata à exploração capitalista que permitisse aos capitalistas uma maior acumulação de riqueza. Tudo ilustrado com fotografias de gente a dormir nas ruas, nem todas tiradas em Portugal. A agitprop do costume.
Ainda há poucos dias foi lançado pela insuspeita Fundação Francisco Manuel dos Santos, anteriormente liderada pelo menos insuspeito, porque reconhecidamente mais crítico do governo anterior e nada crítico do actual, académico Nuno Garoupa, mais um relatório, o "Desigualdade do Rendimento e Pobreza em Portugal: 2009-2014", resultado do projecto Portugal Desigual, coordenado pelo académico Carlos Farinha Rodrigues, um "especialista" em desigualdades, coordenador científico do Observatório das Desigualdades do ISCTE-IUL, e visita frequente do esquerda.net, que afirma que a desigualdade aumentou em Portugal durante o ajustamento, e que os mais pobres foram mais afectados pelo ajustamento que os mais ricos.
Uma vez o relatório apresentado, e dada a tradicional competência dos jornalistas portugueses para sintetizarem um relatório nas palavras de ordem proferidas pelos seus apresentadores, passou a ser universalmente aceite que
Mas terá aumentado?
O Índice de Gini é o indicador universalmente considerado mais representativo para quantificar a desigualdade na distribuição dos rendimentos de uma população, nomeadamente por entrar em conta com os rendimentos de toda a população, e não apenas com amostras, ou uma parte, ou os extremos da distribuição.
Em Portugal, durante o ajustamento de 2011-2014, a desigualdade teve pequenas oscilações de reduzido significado estatístico para se situar em 2014 num patamar historicamente baixo, com excepção do único ano de 2009 em que tinha tido um valor mais baixo que em 2014.
O relatório agora publicado até menciona o Índice de Gini, que no entanto varreu para debaixo do tapete através da escolha do único ano de início que permitia sugerir que aumentou, ainda que ligeiramente, até 2014...
As conclusões do relatório que passaram pacífica e acefalamente para a comunicação social são todas baseadas em indicadores estatísticos parcelares que não representam a desigualdade na distribuição de rendimentos por toda a população portuguesa, mas desigualdades entre segmentos específicos da população, por exemplo, entre os 10% mais pobres e os 10% mais ricos ignorando todos os outros 80%, a esmagadora maioria da população.
(Além de sofrer de vícios metodológicos que podem ser desmontados com explicações fastidiosas que aqui não há espaço para aprofundar, mas de que se pode apontar, a título de exemplo, que o impacte da crise num grupo, por exemplo os 10% mais pobres, não se mede comparando os rendimentos dos 10% mais pobres no início do período com os dos 10% mais pobres no fim do período, que não são os mesmos, mas a evolução ao longo da crise dos rendimentos dos mesmos 10% que eram os mais pobres, ou de qualquer outro grupo para que se deseje medir o impacte, no início do período.)
Qualquer relatório de investigadores ou académicos que, com base noutros indicadores que não o Índice de Gini, e é possível calculá-los de todas as formas e feitios, para todos os gostos, e sustentando todas as conclusões, chegue à conclusão que a desigualdade aumentou em Portugal durante o ajustamento é falso, e é uma análise feita à medida de uma conclusão encomendada previamente, ou seja, um mero caso de desonestidade mental. Dizer que a desigualdade aumenta quando o Índice de Risi diminui é equivalente a dizer que fica mais calor quando a temperatura diminui.
Fica mal à Fundação Francisco Manuel dos Santos, mas é a consequência de dar guarida e palco a académicos mais comprometidos com as suas agendas políticas privadas do que com a ciência, e fica mal aos jornais, mas sobre a competência para informar e isenção destes não vale a pena derramar lágrimas, para não correr o risco de se ficar desidratado.
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