Estas contas, é claro, pecam por sumárias, além de incorrectas: falta falar, pelo menos, no subsídio de alimentação, no seguro contra acidentes de trabalho e no efeito dominó que o aumento do salário mínimo tem entre os salários que já estão acima; e 2.394,00€ a dividir por 231 (dias efectivos de trabalho, por ano, em média - 21x11) não dão 6,5€/dia mas sim 10,36€.
Mas este não é o ponto. O ponto é que há um microempresário que diz que, com o novo salário, terá que fechar as portas. Isto pode, no caso, ser verdade ou não. Mas, se não for neste caso, é-o em muitos outros, olá se é, e nem todos micro. E sobre quantos são, e quem são, ninguém sabe nada.
Nem precisa, pelos vistos. Qualquer empresário dos que o empreendedor Saraiva diz que representa dirá com gravidade e orgulho, se inquirido na matéria: na minha empresa não tenho colaboradores a ganhar o salário mínimo - todos estão acima disso, em muitos casos substancialmente acima. Do senhor Presidente da República para baixo todos os políticos, responsáveis disto e daquilo, economistas, professores, isto é, quem esteja direta ou indirectamente sentado à mesa do Orçamento ou do das empresas majestáticas protegidas da concorrência pela Lei, os usos, os reguladores e a agenda telefónica, dirá, inclinando a cabeça, o ar subitamente sério e profundo: Portugal não pode apostar no modelo dos salários baixos.
Isto dizem eles. E mesmo que alguns saibam que não existem modelos de salários altos, o que existe são economias fortes que os permitem, mas que não são automaticamente induzidas por aqueles; e mesmo que a generosa iniciativa do legislador, dispondo sobre o que não lhe pertence, vá criar fatalmente umas quantas falências e impedir uns quantos jovens de encontrarem o seu primeiro emprego (quantos? – ninguém sabe nem quer saber): sempre o abençoado novo salário mínimo, irrefragável conquista da Esquerda, verá a luz do dia, para evitar esse trunfo nas mãos dela na campanha eleitoral.
"Uma empresa que não pode gastar mais 13€/dia com os seus trabalhadores, não é uma empresa, é, perdoem-me a expressão, um saco de merda que lastra a economia e o país," diz com indignação o comunista. Salvo melhor opinião, o que lastra o país são os que recebem subsídio de desemprego ou nem isso - que a empresa que paga mal não custa ao erário público nada, antes para ele contribui; e os que, existindo tanta empresa mal gerida, não lhe aproveitam a falência para, comprando-a ao preço da uva mijona, a gerirem bem, como podia fazer tanto gestor desaproveitado e tanto sindicalista a fazer carreira na propaganda e na berrata.
No 5Dias os revolucionários desataram à batatada. O caso é da maior gravidade: parece que uns acham que Cunhal sempre defendeu a linha justa, para não falar da sua excepcional envergadura de romancista, ensaísta, doutrinário, pintor, intelectual e crítico de cinema; e outros que não era infalível e, em momentos chave, travou os naturais impulsos revolucionários das massas.
Estou certo que, se Cunhal tivesse conseguido fazer o golpe de mão ao país, encostaria sem hesitar os iconoclastas ao paredón, que as revoluções costumam devorar os filhos e, se forem comunistas, até mesmo os netos.
E só isto já nos dá um certo conforto: Raquel Varela e Renato Teixeira davam dois fuzilados de primeira categoria, mas com eles vivos sempre nos vamos entretendo.
Eu realmente não posso ajudar a esclarecer a matéria: nem conheço bem os evangelhos da seita, nem a história do partido, nem tenho sobre a importância de Cunhal e do PCP, antes e depois do 25 de Abril, a mesma opinião que têm os 16% - e Pacheco Pereira - que uma sondagem recente deu como potenciais votantes naquela prestigiada agremiação. O PCP tinha, no tempo da Velha Senhora, a importância que tem o herpes labial - era incomodativo, não tinha cura, mas não era letal; e, depois do 25 de Novembro e até hoje, tem, no Parlamento, nos meios de comunicação social e sobretudo no sindicalismo e na universidade, uma importância que excede em muito a cotação eleitoral - mas continua a não ser letal.
Faço porém votos, desta tribuna fássista, pá, para que reine a paz, ainda que armada, no seio dos 1224 autores que o 5Dias alberga nas suas coudelarias: estas coisas acontecem nas melhores famílias e há que saber engolir as ofensas, calar os ressentimentos, pôr em surdina as divergências. Não viram o que fizeram agora os primos Espírito Santo? Pois é - esses capitalistas é que deveriam vender a corda com que haveriam de ser enforcados, mas não: são os comunistas que se suicidam.
Fui ler o maldito Relatório (em diagonal e a cem à hora, que são 62 páginas densas e cheias de gráficos e eu é mais leituras amenas) e juro que não vi lá 870 milionários portugueses que, no conjunto, têm 75 mil milhões de euros.
Claro que esta riqueza, a existir, não é líquida, corresponde a activos dos quais a maior parte emigraria para outras paragens ou veria o seu valor despencar pela escada abaixo se fosse confiscada.
Depois, o confisco dos muito ricos não acabava com os ricos - o 871º passava a 1º, o 872º a 2º e assim por diante, até não haver ninguém que detivesse meios de produção que lhe permitisse apropriar-se das mais-valias geradas pelos trabalhadores, pé-ré-pé-pé.
Sem crédito externo, porque o confisco não é bem visto por quem vive de emprestar, os bancos tinham que ser nacionalizados, as empresas paralisavam por falta de matérias-primas, passaria a haver racionamento, controle de divisas, prisão dos transgressores económicos e manifestantes contra-revolucionários, fuga de capitais e pessoas, planeamento central da economia, e tudo o mais que caracterizou o regime defunto cuja Revolução seminal se assinalou ontem. E tudo isso aconteceria necessariamente - um regime comunista só pode nascer e manter-se na violência, cortando permanentemente as cabeças à hidra da Reacção.
Eles, os comunistas, são por vezes cultos, lidos, parlamentares brilhantes, dão aulas nas universidades, aparecem todos os dias a dizer coisas na televisão, alguns são historiadores e economistas, que Deus lhes perdoe.
Mas não aprenderam nada, não esqueceram nada, e ao mais que podem aspirar é cavalgar o descontentamento. E em vez dos amanhãs que cantam têm para oferecer o passado grávido de crimes, enterrado no lixo da História.
Que este programa cative algures entre dez e quinze de cada cem portugueses é uma medida segura da nossa miséria, atraso - e ignorância.
A propósito deste curtinho post:
Contabilidade a partir desta página da wikipedia:
"A introdução, a cargo do editor Stéphane Courtois, declara que "…os regimes comunistas tornaram o crime em massa uma forma de governo". Usando estimativas não oficiais, apresenta um total de mortes que chega aos 94 milhões. A estatística do número de mortes dado por Courtois é a seguinte:
E não lhes acontece nada porquê? Ora, é bom de ver: Polícia, Ministério Público, Tribunais, é tudo a mesma corja - em se tratando de passatempos da direita portuguesa fecham os olhos.
E não é só em Portugal. Em Espanha a coisa não é muito diferente: um dirigente do PP tinha 45 multas acumuladas desde 2011 e nada. Mas foi a Cuba, teve um acidente que provocou uma vítima mortal e "Ángel Carromero ficou sem carta e foi condenado a quatro anos de prisão". Cuba é um estado de direito, os poderosos, lá, não têm como passatempo pôr em risco a vida dos seus concidadãos.
Mas, espera: Para da comparação se poder tirar uma conclusão edificante, o dirigente preso não deveria ser governante local?
Porque, assim, almas mal-intencionadas - fascistas, vá lá - poderão julgar que o acidente pode ter tido alguma coisa a ver com a lástima das estradas e a decrepitude do parque automóvel cubano.
Sei de fonte limpa que a CDU vai ter direito, por sessão legislativa, a três moções de censura; a interpelar o Governo em triplicado; a dizer a mesma coisa de três maneiras diferentes; a reforçar a presença na comunicação social da voz da classe operária, do campesinato, dos intelectuais e das camadas mais esclarecidas da população.
Adivinha-se portanto a derrota iminente das forças da reacção. Qual silly season o quê?
Não ouvi a musiqueta até ao fim: ele é pides, e reaças, e não sei quê, mas de música nicles - não há paciência.
Também, só fui movido pela inveja. Quando li que manifestações já iam em 15 (aqui a última), e eu calado, logo vi que tinha que me pôr em bicos de pés. Comunistas a taxarem outros de reaccionários e para mim nada? Não pode ser.
Apanho o comboio em má altura, porque logo vejo a lista das malfeitorias do Grande Satã Americano, e para as desmontar precisava de escrever uma nova Bíblia, tarefa blasfema e de toda a maneira fora do meu alcance.
Do lado a que pertenço, e que é, na linguagem da seita, a democracia burguesa, já foi dito muito, não adianta abundar. Daria assim para o peditório nada se não tivesse tropeçado nesta frase do meu estimado adversário (ia dizer inimigo, mas ele abespinha-se e eu, que o aprecio, não quero dar o flanco): "A pertença a essa fascinante escola de futuros quadros do actual regime que é a Juventude do CDS já me chegava para mais uma vez esclarecer que se BE e PCP são classificados como de extrema-esquerda por um mínimo de decência geométrica o CDS será de extrema-direita, e desta não saio nem dela ninguém me tira (enfim, se vierem armados não terei outro remédio)."
Sucede que o PCP, se pudesse, acabava com o arranjo de coisas que faz com que o CDS desde 1975 concorra às eleições e, ocasionalmente, chegue ao Poder. E o CDS, mesmo que pudesse, não faria nada para acabar com o estado de coisas que faz com que, desde 1975, o PCP tenha a representação que o voto lhe dá.
Não elaboro, não argumento, não enumero factos, ofereço a afirmação como uma evidência. E quem a aceite pelo seu óbvio valor facial não pode vir dizer que o CDS é geometricamente de extrema-direita, porque que à esquerda dos comunistas não há nada; e à direita do CDS há a direita anti-democrática.
Que me desculpe o ebuliente JJC por vir armado - de lógica.
Começa assim: "Neste espetáculo, quisemos enfatizar o potencial da vontade." A gente fica à espera do resto, realmente na música acontece com frequência enfatizar-se o potencial, tanto em Quim Barreiros como em Tchaikovsky. E continua:
"Este espetáculo é, acima de tudo, o resultado da relação entre a parte e o todo." Mau - se a parte for detestável e o todo horrível, a declaração é pouco tranquilizadora. Bom, mais um bocadinho não custa:
"Não entendemos, no entanto, conceitos como arte ou política na perspetiva da especialização que tende para a noção da intelectualidade enquanto um desafio posto às elites, e cuja racionalidade tentam impor à sociedade." Confesso: não entendo o que não entendem; aliás, não entendo nada.
No resto, fala-se de "motor propulsivo do pensamento político", nas "potenciais formas que poderemos construir para a organização coletiva do quotidiano", no "edificar a sua vida individualmente" e na "relação dialética entre o indivíduo e a sociedade."
Não, não vou ver o espetáculo, hei-de conseguir aguentar-me no devir. Nas palavras dos promotores: "Este espetáculo não segue, por isso, a dialética hegeliana na sua aspiração à síntese, pretende apenas deixar um contributo que possibilite manter em devir a discussão.”
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