Não sei se deva confessar isto, porque têm-me dito que quem não acredita no aquecimento global é como se acreditasse que a Terra é plana ou se defendesse o geocentrismo e o criacionismo. Eu até confesso, mas peço-vos o favor de não divulgarem nas redes sociais para as pessoas não suspeitarem desta minha triste condição.
Eu posso garantir que a Terra é redonda porque já vi fotografias. E domino a física newtoniana suficientemente bem para garantir que o sistema solar é heliocêntrico. E consigo acompanhar a plausibilidade estatística do evolucionismo, pelo que acredito mais no evolucionismo do que no criacionismo, em que aliás não acredito mesmo nada, até porque não recebi a graça da Fé.
Mas não estou convencido que o aquecimento global seja real. Não por estar convencido que não seja real, mas por saber que não tenho informação suficiente para acreditar que seja.
Mas nas alterações climáticas acredito.
Mas não vale a pena terem esperança na minha redenção antes de lerem até ao fim.
O clima era, quando eu dei Ciências Naturais nos primeiros anos do Liceu, uma estatística de longo prazo das condições meteorológicas, o tempo, em períodos de pelo menos 30 anos. E suspeito que continua a ser. O que não simplifica a tarefa de tentar perceber se está a mudar, e muito menos a quem tenha pressa para chegar a conclusões.
Não basta estar mais quente à hora de almoço do que de madrugada, nem hoje estar mais quente do que ontem por esta hora, ou do que nos conseguimos lembrar ou registámos que estava neste mesmo dia há um ano atrás, ou nos últimos 5 ou 10 anos. O clima hoje é o tempo que esteve de 1988 a 2018, com todas as oscilações sistemáticas ou caóticas que sofreu.
Com esta definição, para avaliar se o clima está a mudar é necessário recorrer a estatísticas do tempo de pelo menos 60 anos, por exemplo, comparar o período de 1988 e 2018 com o de 1958 a 1988. Isto porque acompanhar a evolução de médias móveis, por exemplo, os últimos 30 anos terminados em 2018 com os 30 terminados em 2013, apenas permite comparar o período final do período mais recente com o período inicial do período mais antigo, ou seja, no exemplo, os cinco anos de 1988 a 1993 com os cinco de 2013 a 2018, todos os outros anos de 1993 a 2013 estando presentes nas duas amostras, e de amostras de apenas 5 anos não se podem tirar conclusões que exigem amostras de pelo menos 30 anos.
Com a complicação de saber que valores usar, medidos em que locais e como, se as medidas são comparáveis ao longo do tempo, que valores se desprezam na estatística por serem considerados outliers, tudo variáveis metodológicas que dão uma certa liberdade de manipular os números para chegar a um valor preferido quando se prefere usar a ciência para sustentar uma mensagem a usá-la para perceber o que acontece.
Mesmo com estas dificuldades e armadilhas metodológicas todas, é hipoteticamente possível aferir a hipótese do aquecimento global, através do aumento da temperatura global: se a hipótese for verdadeira alguma tendência de aumento nas estatísticas de temperatura tem que aparecer. Se o cientista for rigoroso e honesto há razões para acreditar na estatística que apresenta. Se tiver uma agenda política, para não acreditar. Na ausência de informação, para manter um prudente cepticismo. Mas mesmo com todas as condicionantes é possível testar a hipótese de a temperatura estar a aumentar.
Mas é impossível aferir, e, aferindo, poder rejeitar, a hipótese de o clima estar a sofrer alterações climáticas. O clima está garantidamente sempre a mudar, não porque o tempo está sempre a mudar, que está, mas porque é virtualmente impossível todas as estatísticas relativas a condições meteorológicas permanecerem imutáveis 30 anos depois.
A grande vantagem de substituir o aquecimento global, que é possível ir tentando aferir apesar de ser muito complicado fazê-lo num fenómeno tão oscilatório e caótico como o clima, pelas alterações climáticas é que, estando o clima em alteração permanente, se bem que não necessariamente no sentido de aumento da temperatura global, acerta-se sempre na previsão.
Se eu só consigo acreditar no aquecimento global se vir informação credível que o demonstre, dou de barato as alterações climáticas mesmo sem olhar para estatísticas. Se o tempo num Novembro menos frio me parece sustentar a hipótese do aquecimento global tanto quanto o tempo num Março mais chuvoso me encoraja a duvidar dela, qualquer tempo me parece compatível com a hipótese de haver alterações climáticas. É uma hipótese credível que nem necessita de confirmação.
Já se a utilidade de saber que há aquecimento global é mais ou menos evidente, porque é possível antecipar que problemas é que o aumento sistemático da temperatura poderá possivelmente provocar e preparar alguma prevenção contra eles, a de saber que há alterações climáticas parece de utilidade menos evidente, porque sem se saber que alterações serão ao certo também não se pode fazer grande coisa para lhes prevenir as consequências.
Os defensores do aquecimento global e das alterações climáticas ganharam em credibilidade com a mudança o que perderam em utilidade do alerta.
Outra coisa, de que não falei, é se o hipotético aquecimento global, ou as garantidas alterações climáticas, são determinados pela actividade humana e se podem, alterando mentalidades, evitar e, evitando-os, evitar também os perigos que colocam se forem hipótese reais? Daqui a 30 anos volto a este assunto.
Aviso já que não vale a pena ler a notícia inteira: o título* chega perfeitamente. O resto, para quem tenha curiosidade, mostra a promiscuidade e as trapalhadas entre o Estado e as empresas predilectas do regime quando se desperdiçam dinheiros públicos à boleia de "conceitos" importados e absurdos.
Neste caso, importa perceber uma ideia simples: Lisboa (como o Porto e a maior parte das cidades portuguesas), pela sua topografia e salvo áreas muito reduzidas, não se presta a bicicletas. E nem pela cabeça de um robalo passa a ambição de ver os lisboetas, aplacados por operações de "mudança de mentalidades", exercer felizes a sua "sensibilização" de ladeira acima - transpirando a "sustentabilidade" do planeta e a bazófia dos figurões que vivem à conta deles.
A moda das ciclovias, com os respectivos adornos, serve para perfumar um caixote de lixo. Feito de incompetência, abuso, descaramento e muita propaganda. Assim que se rasga a superfície, vê-se o que não gostamos.
__________
* "Ponte ciclável e pedonal sobre a Segunda Circular vai servir para quê?"
(Translation in English follows)
(Imagem daqui)
Há uns dias, enviaram-me um post do Professor James Lawrence Powell que me deixou intrigada.
1.) O título é: "Why Climate Deniers Have No Scientific Credibility – In One Pie Chart”.
O que são “climate deniers”? São pessoas (ou cientistas) que negam a existência do clima? Onde estão essas pessoas? Onde se manifestam? Que trabalhos científicos publicaram, para que James L. Powell possa discordar da sua “credibilidade científica”?
Pelo cuidado científico com que o Professor James Lawrence Powell escolhe as suas palavras, podemos deduzir que, no seu entender, os "climate deniers" - ou "negacionistas do clima", uma referência inqualificável e irrelevante aos "holocaust deniers" - são nada menos do que nazis.
Pessoalmente, duvido da credibilidade (científica ou outra) de alguém que negue a existência do clima. Mas, caso exista, confesso que tenho alguma curiosidade em saber quem é esse cientista tão exótico.
2.) A imagem mais forte que "ilustra" o texto é um gráfico circular (pie chart) que diz: “24 reject global warming”.
Isto é verdade? Conheço quem ponha em causa os factores antropogénicos do aquecimento global. Actualmente, que eu saiba, nenhum cientista questiona o aquecimento global em si.
Além disso, há cientistas que não acreditam nos factores antopogénicos do aquecimento global (baseado nas emissões de CO2), e que não estão incluídos na lista de 24 para que aponta o link. Como, por exemplo, o Professor Tim Ball (Dep. of Climatology, Univ. of Winnipeg), o Professor Paul Reiter (IPCC & Instituto Pasteur), o Professor Richard Lindzen (IPCC & M.I.T), o Professor Patrick Michaels (Dep. of Environmental Sciences, Univ. of Virginia), o Professor Philip Stott (Dep. of Biogeography, Univ. of London), o Professor Syun-Ichi Akasofu (Director do International Arctic Research Center), ou o Professor John Christy (Univ. of Alabama in Huntsville & IPCC).
3.) O post apresenta uma outra imagem, que é um gráfico de barras com o número de “papers” sobre aquecimento global publicados em cada ano, desde 1991 até 2012.
"The gold standard of science is the peer-reviewed literature", diz Powell no primeiro parágrafo. Todo o texto se refere a “peer-reviewed literature” e a “articles”. "Papers" e "articles" não são a mesma coisa. Como interpretar isto? É gralha?
Por outro lado, e já que se comparam os estudos que apontam para factores antropogénicos nas alterações climáticas com os que rejeitam estes factores, seria interessante que o gráfico de barras mostrasse as datas (bastariam os anos) em que uns e outros foram publicados.
4.) Por fim, o Professor James Lawrence Powell faz uma série de afirmações puramente especulativas:
“Of one thing we can be certain: had any of these articles presented the magic bullet that falsifies human-caused global warming, that article would be on its way to becoming one of the most-cited in the history of science.”
“Within science, global warming denial has virtually no influence. Its influence is instead on a misguided media, politicians all-too-willing to deny science for their own gain, and a gullible public.”
Não vou comentar estas frases que são, pela sua natureza, incomentáveis. Impedem qualquer crítica séria. Estão no domínio da mera opinião. Ignoram com estrépito todas as exigências do método científico ("the gold standard of science") e só podem ter interesse no estudo de outras disciplinas.
__________
Is this science?
Someone sent me an intriguing post from Professor James Lawrence Powell a few days ago.
1.) The title is: "Why Climate Deniers Have No Scientific Credibility – In One Pie Chart”.
What exactly are “climate deniers”? Are they people (or scientis) who deny the existence of climate? Where are these people? Where do they speak? What "peer-reviewed literature" have they published, so that Professor Powell can deny their “scientific credibility”?
Given Professor Powell's scientifically careful choice of words, "climate deniers" - an unspeakable and irrelevant allusion to "holocaust deniers"- are nothing less than nazis.
I do personally doubt of the credibility (scientific or not) of someone who denies the existence of climate. But in case there is one, I would like to know who such an exotic scientist might be. Just out of curiosity.
2.) The strongest picture on the post is a pie chart that reads: “24 reject global warming”.
Is that so? I know people who question the anthropogenic factors of global warming. At the moment, no one questions global warming itself.
Furthermore, there are scientists who do not believe in anthropogenic factors of global warming (based on CO2 emissions) and are not included in the 24 linked list. As for instance, Professor Tim Ball (Dep. of Climatology, Univ. of Winnipeg), Professor Paul Reiter (IPCC & Pasteur Institute), Professor Richard Lindzen (IPCC & M.I.T), Professor Patrick Michaels (Dep. of Environmental Sciences, Univ. of Virginia), Professor Philip Stott (Dep. of Biogeography, Univ. of London), Professor Syun-Ichi Akasofu (Director of International Arctic Research Center), or Professor John Christy (Univ. of Alabama in Huntsville & IPCC).
3.) Another picture on the post is a column chart showing the "number of global warming papers by year", since 1991 until 2012.
"The gold standard of science is the peer-reviewed literature", Powell states in the first paragraph. All along he refers to “peer-reviewed literature” and to “articles”. “Papers” and "articles" are not the same thing. Where do we stand? What are we talking about? Was it a misprint?
On the other hand, the post compares studies that point to "human-caused" factors of global warming with studies that "reject" them. So it would be interesting if the column chart had included the dates (years would be enough) in which both were published.
4.) Eventually, Professor James Lawrence Powell makes a series of purely speculative statements:
“Of one thing we can be certain: had any of these articles presented the magic bullet that falsifies human-caused global warming, that article would be on its way to becoming one of the most-cited in the history of science.”
“Within science, global warming denial has virtually no influence. Its influence is instead on a misguided media, politicians all-too-willing to deny science for their own gain, and a gullible public.”
I am not going to comment on these statements; by nature, they rule out serious criticism. They are merely a matter of opinion. They blatantly ignore the "gold standards of science" and they could be of interest only to another discipline.
Blogs
Adeptos da Concorrência Imperfeita
Com jornalismo assim, quem precisa de censura?
DêDêTê (Desconfia dele também...)
Momentos económicos... e não só
O MacGuffin (aka Contra a Corrente)
Os Três Dês do Acordo Ortográfico
Leituras
Ambrose Evans-Pritchard (The Telegraph)
Rodrigo Gurgel (até 4 Fev. 2015)
Jornais