Os impostos podem tornar os portugueses mais saudáveis?, pergunta o título e o texto responde dando a entender que sim.
Eu também acho. E nem preciso de exercitar a imaginação: quando comecei a trabalhar muitos empregados fumavam e hoje a esmagadora maioria não fuma nem tosse, a ponto de, quando vou do meu gabinete à secretaria, onde ninguém tem esse hábito demonstradamente nocivo, e calha ir fumaçando, haver com frequência alguém que lembra a proibição legal de fumar em espaços públicos, menos com a esperança de me ver apagar o cigarro e mais para me ouvir dizer, pela milésima vez, o que realmente penso das proibições fascistas e o que se entende por espaços públicos, que não são certamente os da fábrica que fundei e onde trabalho. Sou um patrão moderno: qualquer trabalhador tem a liberdade de me dizer o que entende depois do meio-dia, e eu a de ouvir apenas o que me agrada, convém ou acho útil.
Não fuma porquê? A maioria porque não pode: um operário que ganhe o salário mínimo e fume um maço de tabaco por dia gasta quase um terço do vencimento em tabaco. E portanto faz das tripas coração para deixar de fumar, tendo como recompensa a satisfação de pertencer à virtuosa maioria, e como vingança o direito de atazanar a paciência aos escravos do vício, ameaçando-os com os rigores da lei umas vezes e dando consultas antitabágicas grátis, outras.
Com isso, abdicou do direito a, depois do café da manhã, fumar o saborosíssimo primeiro cigarro do dia; depois do almoço, que trouxe de casa, a não regressar ao trabalho sem dedicar algum tempo ao prazer; e aumentar a concentração, se ela for necessária, aliviar o stress, se existir, distrair quando a tarefa é chata - tudo o que o tabaco faz e que explica o sucesso que teve e ainda vai tendo junto de alguns diehards.
Abdicou do prazer, numa vida que é escassa deles. E isto em nome dos senhores médicos, que consolam a sua incapacidade para curar os males que o tabaco provoca com o expediente de proibir os comportamentos que evidenciem a sua impotência, demonstrando ao mesmo tempo o poder e importância que têm; dos senhores políticos, de cujas motivações abaixo se dá nota; e da maioria dos cidadãos que, no tabaco e no resto, nunca precisaram senão de boas desculpas para reprimir os comportamentos das minorias, em particular se estes caírem na categoria de vícios.
O Poder, em particular nas sociedades democráticas, não quer desagradar à opinião pública, porque quem o detém quer lá manter-se e quem não o detém quer lá chegar. Para agradar à maioria é preciso distribuir benefícios - as campanhas eleitorais são hoje leilões de promessas onde ganha quem as faça credíveis. E como, mesmo descontando a aldrabice, com a qual aliás o eleitor já conta, é preciso entregar, a receita fiscal tem que crescer, coisa que sucedia naturalmente no saudoso tempo em que a economia crescia.
Agora não e é portanto necessário usar expedientes: um bom é aumentar os impostos indirectos - toda a gente se queixa do preço do combustível (que nunca esteve na origem tão barato), sem se dar conta que o imposto embutido no preço pesa mais do que o produto refinado; e se uma categoria de produtos tem muita procura, mas infelizmente uma taxa normal de imposto (o "normal" é quase um quarto do preço) a solução é dependurar-lhe um labéu de nefasto para a saúde, e zás, logo a opinião pública fica receptiva a pagar taxas delirantes. À força porém de tirar dinheiro dos bolsos de uns para enfiar nos bolsos de outros estamos já na situação em que, com frequência, são os mesmos: o tipo a quem aumentaram a pensão vai dar um passeio no carrito e descobre que o aumento que lhe deram não cobre o aumento do custo do passeio; o funcionário cuja dignidade estava ofendida mas deixou de estar porque o novo governo respeita as pessoas constata que não consegue pagar as despesas escolares dos filhos sem passar fome; e assim por diante.
Dos impostos directos nem é bom falar, que ricos já não há faz tempo, pelo que mesmo com o exercício semântico de chamar "rico" a quem é apenas remediado nem a receita é muita nem a operação segura: os antigos remediados, agora reclassificados para efeitos fiscais, são com frequência socialistas, e não estão portanto disponíveis para redistribuir senão o que não lhes pertence.
Entretanto, o Serviço Nacional de Saúde tornou-se, por boas e más razões, uma vaca sagrada do regime. E como a evolução das contas nacionais mostra que os cortes não foram nunca suficientes; a receita não cresce para alimentar as insaciáveis necessidades daquele serviço; e a população cada vez mais envelhecida requer cada vez mais do SNS, quando ele pode cada vez menos: há que fazer um homem novo são, atlético, que não adoeça, não tenha vícios, não se alimente mal, faça exercício - tudo a golpes do Fisco, da polícia de costumes, de regras, regulamentos e propaganda.
No limite, e como escreveu um leitor indignado do artigo, "a melhor solução era mesmo retirar do SNS o tratamento a doenças resultantes de maus hábitos de saúde como alcoolismo e tabagismo crónicos".
Santas caixas de comentários, nelas se encontram sempre os reformadores sociais, os ferrabrases de aldeia, os justiceiros, e os imbecis. Que este santo homem não se apercebeu que o que os fumadores pagam em impostos, e poupam em pensões por morrerem mais cedo, cobre largamente o seu custo acrescido; para não lembrar que não poucos cidadãos se excluiriam eles próprios do SNS se se pudessem também livrar de o sustentar.
Enfim, caminhemos alegremente para o mundo novo que a preclara Comissão Europeia aponta: de todos o que puderem, a todos o que não lhes podemos dar; e todos morreremos em instituições de terceira idade, sãos como peros salvo as doenças da senectude, de todos esquecidos e esquecidos de nós próprios.
José Rodrigues dos Santos é apresentador de televisão e escreve novelas de série B.
António Araújo, hipotético "historiador", é o boneco do "intelectual" português. No blog enfrenta gigantes literários como Isabel Moreira, ou Domingos Freitas do Amaral; sobre as grandes fraudes que a "cultura" leva a sério, nem uma única linha.
Se António Araújo tivesse algum estatuto aparecia em polémicas relevantes. Ou profissionais, como por exemplo aquela que opôs Rui Ramos a uma matilha de zelotes da 1ª República. Mas não. Senta-se no jornal Público a meter na ordem uma personagem menor. Na prosa mais chata de Portugal, típica de "académico", um saco de citações e notas remissivas para opinar por interposta pessoa.
Talvez António Araújo tenha ganho um convite para outro "colóquio". Talvez lhe sirva para apresentar serviço, neste tempo de "afectos" e "consensos". De resto não se compreende a utilidade do exercício. Quem é que aprende marxismo com o José Rodrigues dos Santos?
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