Por que razão, sendo o presidente e audiência franceses, o custo vem em dólares, a notícia não esclarece. Não é que interesse muito, é dinheiro para torrar.
É para torrar porque os 500 mil estágios subsidiados pelo Estado ou são para lugares necessários ou não são.
Se não são, logo que acabe o apoio do Estado aos ex-estagiários os patrões calçam-lhes uns patins, ou, se um ou outro se tiver revelado particularmente apto os patins vão para outro, menos apto, que o Estado não ajudou.
Se são, então o sector privado criá-los-ia de todo o modo e o apoio estatal apenas financiará a concorrência desleal, visto que se há apoios há candidaturas, se há candidaturas há selecção, se há selecção não há forma de garantir que as "boas" empresas serão apoiadas e as "más" não: quem separa as boas das más empresas não é uma agência governamental - essa entende, no melhor dos casos, a linguagem das tretas da moda em matéria de gestão e, no pior, a da corrupção - mas o mercado.
"Com mais de 10% de desempregados, a França situa-se acima dos 9,8% que constituem a média da UE. No Reino Unido a taxa era, em Novembro, de 5,2%, e na Alemanha de 4,2%".
A propósito, de onde vêm os 2.200 milhões? A notícia, lamentavelmente, não diz, mas adivinha-se: de impostos ou de dívida pública, que são impostos de cobrança diferida.
Ah, mas estes 2.200 milhões vão dinamizar a economia pela via do consumo e os trabalhadores, com as suas competências melhoradas, vão fazer um upgrade da produção, da produtividade e do pé-ré-pé-pé, ou não?
Não. O Estado, para inundar a economia de dinheiro, tem primeiro que o retirar da economia, ou endividar-se para retirar depois, e as competências profissionais, se o mercado local não as exigir, vão para onde haja quem as aprecie.
E onde fica isso, quem aprecie? Ora, um dos lugares é a Alemanha, e o outro o Reino Unido. Então não se está mesmo a ver?
Esperar que o milésimo programa de formação profissional insuflado a golpes de subsídios, discursos e voluntarismos políticos dê resultado diferente do que deram os outros 999 só não é uma loucura porque Hollande fez o seu número; os 500 empresários também, porque esperam meter ao bolso alguma esmola; e os eleitores, que não estavam na plateia, são os inocentes da história - não é o que são sempre?
Pergunta-se: Podemos razoavelmente esperar que as grandes empresas se abstenham de usar o seu poder de influência para que os poderes públicos as ajudem a combater a concorrência, ou adquirir vantagens ilegítimas, quando aquelas dispõem de consultores, especialistas, advogados, marqueteiros, lobistas, cujo papel é precisamente influenciar as decisões de quem as pode, consciente ou inconscientemente, ajudar?
Não, não podemos. Os consultores e fornecedores não servem, nem têm que servir, o interesse público, servem o interesse de quem os paga e contratou. E mesmo que nos processos decisórios não haja corrupção, no sentido comum da palavra, a obrigação de quem administra uma empresa não é dar aulas de lucidez ao mercado, defender uma qualquer visão particular do bem da comunidade ou, menos ainda, adoptar comportamentos que, prejudicando a empresa, beneficiassem porventura esta ou aquela categoria de cidadãos.
Não. Nos limites da lei e dos costumes (enfim, com excepções, as realidades costumam resistir a que se as definam em duas ou três frases), o grande patrão defende o interesse próprio primeiro, o dos accionistas depois, e o dos trabalhadores e fornecedores na medida em que o possa casar com os dois primeiros e o imponha a sustentabilidade da empresa.
Não tem que ser assim, claro: se a grande empresa for de propriedade pública não há conflito de interesses, porque o proprietário da empresa é quem define o interesse público. Mas isto, que parece resolver um problema, cria outros maiores: a concorrência, que era justamente o que o patrão antigo queria mitigar, desaparece de vez - e com ela a necessidade da sobrevivência, que explica o esforço para o progresso, a inovação e a produtividade.
De empresas com pouca ou nenhuma concorrência nós, em Portugal, temos vasta experiência; e de concorrência de pacotilha, supervisores cegos e sem dentes, e captura dos poderes públicos para defesa de interesses privados, também.
Desta nada invulgar história tiram-se muitos ensinamentos. Um deles, que é o que escolho, é lembrar que já temos uma polícia, a ASAE, cuja missão é também impôr legislação que não saiu dos órgãos políticos que nos demos ao trabalho de eleger, mas de burocracias anónimas que não respondem perante ninguém, muito menos perante as pessoas a quem se servem doses massivas de propaganda em nome da saúde pública, da segurança, da protecção da Natureza, do combate ao aquecimento global, da poupança energética, do catano - e da UE.
Nós temos muito menos variedades de queijo do que a França, embora estejamos igualmente servidos de asneirol. Mas poderíamos ter sempre a esperança de remediar alguns dos nossos males em mudando os responsáveis. Mas isso serve de quê, se entretanto importamos os males dos outros?
A mais antiga profissão do mundo sempre foi mal vista: vender a prática de actos íntimos a quem os compra para disso retirar prazer é objectivamente degradante; e é por isso que a natureza deles supõe uma gratuitidade que o vil metal polui.
Depois, as religiões, que se ocupam sobretudo da relação do crente com o sobrenatural, tratam de garantir que o comportamento nesta vida não comprometa a bem-aventurança na outra, segundo a Revelação em que cada uma se acolhe e o cânone fixado pela igreja competente. Daí que a luxúria não seja vista com muito bons olhos, por distrair da contemplação do eterno a benefício do imediato e contingente - a esfera mais íntima não fica fora, por definição, do comando religioso.
Mas a carne é fraca, todos os pecados serão perdoados, e as igrejas são feitas de homens (homens para designar o género humano, não me venham cá com perífrases de homens e mulheres). Donde, não faltam nem épocas nem situações em que a prostituição foi tolerada - não em nome da tolerância, mas do realismo.
Mas isso era dantes. Que o que as igrejas não conseguiram, os costumes permitiram, as autoridades toleraram, mulheres sem outros recursos agradeceram e pecadores aproveitaram - c'est fini.
Claro que a prostituição não corre o risco de desaparecer, ou sequer de diminuir seriamente - já bastou o tombo que levou com o risco da sida, a reverter logo que a cura se venda na farmácia da esquina. O que vai diminuir é a liberdade, por mais um comportamento ser interdito, e a segurança, por as polícias terem um novo crime para perseguir, com recursos que não crescerão. Ao mesmo tempo, a corrupção vai aumentar, porque a clandestinidade e o secretismo a facilitam; e, aberta mais esta porta, por ela se enfiarão, com o breviário da igualdade de género e causas fracturantes na mão, todos os promotores do novo homem politicamente correcto:
Não fuma, não bebe, não toma café em excesso, faz exercício e está aqui está a tornar-se vegan. E, claro, nunca foi às putas.
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