Eu dei aulas no Instituto Superior Técnico sem ser licenciado.
O professor Diamantino Durão, na altura Catedrático no departamento de Engenharia Mecânica do IST, regente de várias cadeiras do ramo de Termodinâmica Aplicada, presidente do Conselho Directivo e mais tarde ministro da Educação, tinha que ir fazer um trabalho nos EUA e reconvidou-me, já me tinha convidado quando acabei o 4º ano onde tinha sido aluno das aulas teóricas dele nas cadeiras de Transmissão de Calor e Massa que ele regia mas eu entretanto tinha aceitado um convite para bolseiro de investigação no Laboratório Nacional de Engenharia Civil e não tinha aceitado o dele, para assegurar as aulas da cadeira como Monitor.
Nunca me chegou a explicar o motivo de o convite não ter sido precedido de um rigoroso concurso público, mas admito que o facto de eu ser o melhor aluno do curso de Engenharia Mecânica e de ter tido 19 na cadeira possa ter tido alguma influência. E suspeito que possa não ter sido por motivações políticas, porque eu só ingressei no PSD trinta e dois anos depois de acabar o curso e em 1983, entre governos do dr. Pinto Balsemão, resgates do FMI e governos do Bloco Central, interessava-me muito pouco pelo PSD, e não faço ideia se ele próprio era do PSD apesar de mais tarde ter sido ministro num dos governos de doutor Cavaco Silva.
Durante dois ou três meses assegurei sozinho as aulas da cadeira de Transmissão de Calor e Massa I, tanto as práticas como as teóricas, porque o professor que costumava dar as teóricas estava ausente. Não quero maçar os leitores com as technicalities, mas depois de duas ou três semanas dedicadas a ilustrar os princípios mais simples de transmissão de calor por condução e por convecção em regime estacionário e em corpos homogéneos de geometria simples e unidimensional passei para outras duas ou três a apresentar a Equação do Calor e a derivar várias soluções em coordenadas ortogonais, assim como em coordenadas cilíndricas e esféricas que não vos maço com a demonstração nem sequer a ilustração. Era isto.
Mesmo dada por um aluno imberbe era aquilo a que se podia chamar uma cadeira para alunos de barba rija, ou um cadeirão.
Entretanto eu acabei o curso e fui admitido numa empresa privada a que me candidatei e não me pareceu conveniente perturbar o início da carreira a acumular o trabalho absorvente na empresa com ausências para continuar a dar aulas, o professor Diamantino Durão regressou dos EUA com disponibilidade para retomar as aulas, e acordamos pacificamente a cessação do meu trabalho como Monitor no IST em Janeiro de 1984.
Felizmente este episódio não chegou aos jornais, nessa época não havia redes sociais, e investigadores notáveis como o professor doutor Rui Bebiano ou a professora doutora Raquel Varela não tiveram conhecimento dele nem vieram para a praça pública indignar-se contra a destruição da universidade pública pelo nepotismo partidário através da decadência da exigência do nível científico inerente à contratação de professores não doutorados, exigência que eles próprios garantem como referências científicas sólidas com base nos graus académicos que outros como eles lhes atribuiram.
E o IST não caiu no pântano em que merecia apodrecer por recrutar, pior que assistentes e professores convidados não-doutorados para ensinarem matérias, nomeadamente tecnológicas, que nenhum docente da carreira dominava, alunos para darem aulas a outros alunos, nem a Ordem dos Engenheiros recusou a atribuição do grau profissional de Engenheiro aos licenciados que foram meus alunos de Transmissão de Calor e Massa I, e graças à discrição com que o episódio foi tratado o IST até manteve, se não aumentou, o renome de universidade de excelência que conquistou ao longo de muitas décadas.
Não certamente ao nível daquelas onde eles investigam através do método de escolher os factos que sustentam as opiniões, muito mais assertivo e proactivo que o método mais modesto seguido no IST de formar conclusões com base nos factos. Método em que desgraçadamente me formei, e que limita seriamente quaisquer ambições que possa vir a ter de conseguir vir a ser intelectualmente trafulha como eles.
A academia pode perfeitamente ser colonizada por idiotas e trafulhas, mas deve ser reservada a doutorados. Ou então de esquerda.
Blogs
Adeptos da Concorrência Imperfeita
Com jornalismo assim, quem precisa de censura?
DêDêTê (Desconfia dele também...)
Momentos económicos... e não só
O MacGuffin (aka Contra a Corrente)
Os Três Dês do Acordo Ortográfico
Leituras
Ambrose Evans-Pritchard (The Telegraph)
Rodrigo Gurgel (até 4 Fev. 2015)
Jornais