A Empresa Municipal de Tranportes de Madrid vai lançar uma campanha apoiada em sinalética, tenho que me ir habituando gradualmente a usar estes termos do novi-Português, para desincentivar os passageiros do Metro de Madrid de ocuparem um espaço excessivo nos lugares onde se sentam à custa da redução do espaço que fica disponível para os seus vizinhos de banco.
Estou cien por ciento de acuerdo, como diria o nosso primeiro-ministro que tanto tem inovado na língua Portuguesa sempre que abre a boca, é uma questão básica de civismo lado a lado com outras, como estar atento à entrada de passageiros com mais dificuldade de locomoção para lhes ceder o lugar sentado franzindo o sobrolho aos que fingem que não os vêem para não se levantarem, principalmente se apresentam sinais exteriores de terem sido educados num contexto social em que isso lhes devia ter sido devidamente ensinado. Ocupar mais do que um lugar, no Metro ou num parque de estacionamento, é uma falta de civismo e, para alguns, em que me incluo, um indício de deficiência, neste caso, mental.
Mas isto era bom demais se a história ficasse por aqui, nomeadamente tendo em atenção que a cidade de Madrid é governada pelo partido que ficou em segundo lugar nas eleições municipais, o Podemos, depois de o partido que as ganhou, o PP, ter sido impedido de governar o município por uma coligação negativa do Podemos com o PSOE, que, andando aos caídos depois de um passado glorioso, preferiu apoiar o bando de doidos que lá se instalou a deixar governar o partido eleito pelos madrilenos.
E quando digo "bando de doidos" sei que a minha credibilidade é diminuída pelo desamor que nutro por essa formação partidária criada com base no financiamento do regime bolivariano miserável e assassino em troca de assessorias de alguns dos mais ilustres dirigentes do partido em domínios como a organização e a propaganda, os filhos da puta deviam ser obrigados e viver na Venezuela para experimentarem ao lado do desgraçado do povo venezuelado as suas próprias ideas e conselhos, mas não posso deixar de usar a expressão porque se trata mesmo de um bando de doidos, de gente que nas redes sociais incentiva a tortura e o assassinato de adversários políticos, coisa que só não fazem porque lhes sobra em garganta o que lhes falta em, desculpem-me a expressão, tomates. Enfim, uma espécie de guerrilheiros urbanos do teclado.
Mas, regressando ao Metro, a campanha contra a utilização de espaço excessivo identifica um alvo preciso para a sua mensagem, os homens que se sentam de pernas abertas, que são caricaturados na sinalética e estão na base do hashtag, outra palavra do novi-Português que significa "palavra ou palavras sem espaços a separar precedidas de um #", ou almofadinha, como já lhe ouvi carinhosamente chamar, #MadridSinManspreading.
Chegado aqui, tenho que confessar que, apesar de ter sessenta anos de idade e mais de cinquenta de utente do Metro de Lisboa, já tinha dado pelo problema ocasional da falta de civismo de alguns passageiros que ocupam mais do que o seu próprio lugar, mas nunca por homens de pernas abertas. Ou por uma improbabilidade estatística, ou por os homens lisboetas sentirem menos necessidade de arejar os tomates que os madrilenos e manterem as pernas fechadas, os casos a que assisti foram de senhoras com sacos de compras ou a carteira pousados no banco do lado, ou pessoas muito gordas que parecia impossível caberem na largura que o banco lhes disponibilizava, por mais civismo que tivessem, e nunca os tais homens das pernas abertas. Nem senhoras, acrescente-se para repor a neutralidade de género. Mas, com a minha tradicional boa-fé, tenho de admitir que pode haver especificidades das cidades que resultem em que, numas, os homens gostem de se sentar de pernas abertas e, noutras, as prefiram trazer fechadas.
E fui investigar, lendo a notícia. E, boa notícia, não foi difícil identificar o motivo da especificidade.
Diz a notícia que "La Empresa Municipal de Tranportes (EMT) incorporará un pictograma específico en el panel acompañado de la frase "respeta el espacio de los demás" y recoge así la propuesta del colectivo Mujeres En Lucha, que haces unos días inició la campaña #MadridSinManspreading para pedir al consistorio y a la Comunidad de Madrid que incorporara carteles contra esta actitud en los autobuses y en el metro, al igual que ocurre en otras ciudades como Nueva York o Tokio.". Ou seja, não foi uma qualquer comissão de utentes do Metro fartinhos de lhes ocuparem o lugar sem necessidade que sugeriu a campanha #MadridSinManspreading, mas um "colectivo", o "colectivo Mujeres En Lucha". Já se começa a parecer com um município governado pelo Podemos.
Diz também que o Ayuntamiento de Madrid se associou à campanha sugerida pelo colectivo e emitiu uma recomendação que pode bem ficar escrita na pedra, "por respeto a los demás, los usuarios masculinos no deben sentarse abriendo las piernas ocupando dos asientos". E por intermédio de que departamento? Do Departamento dos Transportes ou outro qualquer que garanta a articulação do ayuntamiento com a EMT? Não. Da Área de Políticas de Género y Diversidad. Num município Podemos é onde se tomam as grandes decisões. E diversidade não falta à recomendação, que estipula que os homens não se devem sentar de pernas abertas mas omite qualquer preceito para as mulheres, que assim se podem sentar com as pernas como muito bem entenderem.
E agora? perguntam-me os leitores mais sensíveis às questões da igualdade de género, temos aqui uma recomendação que pode criar situações de desigualdade por permitir às mulheres abrirem as pernas nos lugares sentados onde os homens têm que as fechar?
A pergunta é pertinente. Mas a resposta é fácil, e foi dada por "una de las ideólogas de la campaña" a senhorita Alejandra de la Fuente: "es una práctica que también realizan mujeres, pero es en una medida ínfima comparada con los hombres porque es una cuestión de cómo nos han educado. A nosotras siempre nos han dicho que debemos ocupar el menor espacio o a que se nos vea lo menos posible y a ellos no". As espanholas foram educadas para fecharem as pernas para não se lhe verem as partes, de modo que não há o risco de as abrirem, mesmo sendo-lhes permitido. Já os espanhóis, em contraste, abrem-nas se lhes for permitido, sendo a ideóloga omissa na explicação de as abrirem por terem sido educados para mostrar as partes ou simplesmente por usarem calças que as tapam melhor do que as saias.
O que não lhes ensinaram, às espanholas como ela ou as colegas do colectivo Mujeres En Lucha, foi a manter a boca fechada quando não têm nada para dizer, para evitar a emissão e propagação de asneiras. Elas e eles, não me vá aparecer aqui algum colectivo a fiscalizar os textos à procura de conteúdos sexistas. Mas não era a mesma coisa, e não teríamos a oportunidade de verificar numa experiência de laboratório o modo como esta gente é capaz de transformar uma grande cidade num manicómio à sua imagem.
Num mundo em que até é proibido, e mesmo criminalizado, a um partido aceitar a disponibilização gratuita de um auditório municipal para organizar uma sessão pública, por violar a proibição de os partidos receberem financiamento de pessoas colectivas e uma câmara municial ser uma pessoa colectiva, a expansão do Metro é o melhor dos instrumentos para a propaganda política, autárquica pelo alcance local, mas também nacional por ser um tema de aferição da ambição e do progresso dos decisores de grande visibilidade. Até porque promessas leva-as o vento e só muito depois das eleições autárquicas ou nacionais que pretendem influenciar se chega a ver se foram cumpridas ou, o que é certo e sabido, mas muitas vezes esquecido no momento de as ouvir, e de votar em consequência com a generosidade da oferta, não foram.
Quem tem a faca e o queijo na mão é, naturalmente, o accionista da empresa do Metro, o governo, cujos planos são em teoria promessas credíveis, por ter o controlo do mealheiro de onde as paga, ao contrário dos da oposição, que não passam de aspirações irrealistas e demagógicas. E, quando se aproximam eleições autárquicas de Lisboa, e as deste ano estão aí a bater à porta, é chegado o momento de os tirar dos estiradores e os espetar nos telejornais em horário nobre. A história explica que não é para lhes dar muita importância, porque a correlação entre os planos de expansão apresentados pelos governos ou exigidos pelas oposições e os planos de expansão concretizados é muito reduzida, mas é tema que entra facilmente no imaginário popular e dá-se-lhe sempre alguma importância.
Desta vez o governo veio em auxílio do futuro candidato socialista à Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, é quase garantido quem está numa câmara recandidatar-se, mas normal deixar para a última hora o anúncio da candidatura de modo a usar até o mais tarde possível todos os meios de propaganda que o governo da câmara lhe proporciona, desde obras, a cartazes ou meros boletins municipais, passando por sessões públicas nos auditórios municipais, estas dentro da lei porque não são iniciativas de partidos mas da própria câmara, anunciando, numa manhã de primavera, a construção de quatro novas estações dentro da cidade de Lisboa, e na tarde do mesmo dia, a construção de apenas duas e a promessa de mais outras duas, o que vai dar ao mesmo e tem o mesmo efeito eleitoral, porque é tudo para se fazer muito depois de receber os votinhos nas eleições, mas sai muito mais barato.
De caminho, confirmou o que já tinha sido sugerido na última cerimónia de inauguração de uma estação, a da Reboleira, que a prioridade agora passaria a ser construir mais estações dentro de Lisboa, fechar a rede, e adiar para as calendas gregas a expansão das linhas fora de Lisboa, entre as quais o prolongamento da linha que serve a Amadora desde a estação da Reboleira até ao Hospital Fernando Fonseca, o Amadora-Sintra, passando pelo centro da Amadora. Aliás, com uma estação planeada à distância ideal da minha casa, ou seja, suficientemente longe para eu não levar com a poeira das obras quando estiver em construção mas suficientemente perto para poder sair de casa e ir a pé até à estação quando estiver em funcionamento. Que tinha sido prometida, por quem? pelo anterior governo socialista, o do Sócrates de boa memória, justamente por um dos muitos governantes que transitaram directamente desse governo para o actual, a então secretária de estado dos transportes Ana Paula Vitorino, e quando? no período que antecipou as eleições autárquicas de 2009. Eu já tinha avisado.
Nessa época era conveniente apoiar a reeleição do então Presidente da Câmara da Amadora Joaquim Raposo com um anúncio de uma expansão do Metro para servir a Amadora, agora é mais importante apoiar a eleição (ia dizer reeleição mas ele nunca foi eleito) do Presidente da Câmara de Lisboa e delfim do primeiro ministro, e quem parte e reparte e para o delfim não guarda a melhor parte ou é burro ou não tem arte, e os manhosos dos socialistas que nos governam têm a arte toda. Está nos livros, e assim foi feito.
Às duas mais duas estações oferecidas agora pelo governo ao candidato Fernando Medina para brilhar na campanha eleitoral, respondeu a candidata Assunção Cristas dizendo que, com rasgo e ambição, o governo devia ter prometido vinte em vez de duas. Candidata à Câmara Municipal de Lisboa, note-se, pelo que o rasgo e a ambição chegaram-lhe para pedir vinte novas estações mas não lhe chegaram para reclamar as três da ligação da Reboleira ao Hospital Fernando Fonseca.
O nacional situacionismo socialista caiu-lhe em cima, claro, por estar a fazer promessas demagógicas e disparatadas, onde é que já se viu alguém pedir vinte estações de Metro, onde é que se vai buscar dinheiro para as construir? Acalmado do povo o gran sussurro, recordou-se que estas vinte que ela pediu não são mais do que uma selecção das trinta que o governo socialista anterior tinha prometido quando já se lhe estava a acabar o dinheiro mas ainda havia campanhas eleitorais para fazer. Quem dá mais acabam sempre por ser os socialistas.
Eu vou poupar aos leitores os detalhes da história, ou não sairiamos daqui, tamanha a variedade de planos de expansão que são proclamados ou reclamados ou protestados. Será suficiente assinalar que são apresentados quando estão a chegar eleições autárquicas de modo a favorecer o candidato do partido do governo à Câmara Municipal de Lisboa ou de algum dos concelhos limítrofes abrangíveis pelo Metro, que o partido da situação fica satisfeito com a promessa, mesmo que fique muito aquém do que reclamava antes, e os partidos da oposição insatisfeitos, mesmo que a promessa ultrapasse o que tencionariam fazer se estivessem na situação, mas que isto tudo é um bocado indiferente, porque no mundo real o Metro se vai expandindo ao seu próprio ritmo, que é o do dinheiro que se vai arranjando para o expendir, e que não coincide em nada com o ritmo voluntarista das campanhas eleitorais.
De modo que podemos concluir que as promessas de expansão do Metro são iguais ao litro.
PS: Ó Doutora Assunção Cristas, se me está a ouvir, queria-lhe dizer que a acho uma simpatia de pessoa, mas que os amadorenses, pese embora o handicap de não poderem votar em si por não terem direito de voto nas eleições autárquicas de Lisboa, e talvez até merecessem poder votar pelos impostos e taxas que largam neste concelho, desde a derrama das empresas de Lisboa onde trabalham e para cujos resultados contribuem, ao IVA deixado por eles nos restaurantes ou lojas de Lisboa que frequentam, a todas as taxas e taxinhas que incidem sobre as empresas de quem são clientes, mas não têm direito de votar, também são pessoas, com sentimentos e necessidades e aspirações, alguns até são também uma simpatia de pessoas, de modo que deixe-os lá ambicionar um dia também vir a ter Metro até ao hospital como a senhora e muitos lisboetas já têm, e alguns até estações de Metro à distância ideal as suas casas. E alguns deles até votam no CDS, se bem que na Amadora. Como disse uma vez o saudoso José Torres, o Bom Gigante que também morava na Amadora, deixe-nos sonhar!
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