Ligo a televisão e caio no Prós & Prós. No indispensável arrazoado soez, uns cavalheiros protestam o desprezo dos jornalistas pelas associações "cívicas". Dizem que não lhes dão acesso à imprensa e às televisões, ao contrário do que fazem com os partidos políticos.
Fátima não concorda: "tanto é que os senhores estão aqui". E ilustra, pivoteando a palavra para uma senhora da plateia que apresenta como "reformada da Função Pública". Alexandra Gonçalves levanta-se e despeja a indignação "dos portugueses", que observa "nas ruas, nos mercados, e nos centros comerciais", e "lamenta" que "só tenham invadido quatro ministérios".
Conheço bem esta "reformada". Era vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, no período em que João Soares se entendeu com os comunistas para governar a geringonça - de resto, com arroubos poéticos de educado requinte.
Foi nos últimos anos do mandato e Alexandra Gonçalves, do PCP, tinha os pelouros da Higiene Urbana, do Saneamento, do Turismo, e da Intervenção Local. Aparentemente, agora representa o PCP numa qualquer "plataforma" apropriada à mais casta intervenção "cívica", e tem os pelouros da Observação, da Listagem, do Lamento, e da Invasão de Edifícios Públicos - especialidades em que o partido comunista sempre se distingiu com reputados pergaminhos.
O interesse destas memórias não é, desta vez, apontar as aldrabices que a RTP nos serve diariamente. Nem é mostrar que a "cidadania" está infectada de elementos oriundos dos partidos políticos, onde exercem as suas pressões de maneira dissimulada e traiçoeira. A moral desta história é concluir que as duas princesas têm tudo o que é preciso para se manterem casadas e serem felizes.
Raquel Baptista Varela é marida de um cidadão que também é mentalmente excepcional. À luz da legislação portuguesa, está visto que podem co-adoptar pareceres. Poderão adoptar crianças? Deixo esta pergunta no ar.
Estará o país preparado? Até certo ponto. Mesmo no Arrastão, instituto onde se observam e defendem excepções de todo o tipo, há dois cidadãos que, escurecidos de preconceito, não vêm a coisa com bons olhos. Naquela linguagem "cavernícola" (obrigada, Galamba), de quem convive mal com o "direito à diferença" e pactua, pela "passividade bovina", com certos "retrocessos civilizacionais", dizem da doce Raquel que ela é "alienada", que "usa a ideologia" como um "pronto a vestir", e que lhe falta "bom senso". Palavras fortes, que não levo a mal: são decisões difíceis, que inflamam os ânimos e necessitam de muita ponderação.
Enquanto pensamos fica um excerto, uma síntese do pensamento do filósofo, que se chama António Paço:
"Os grandes agradecimentos que a apresentadora Fátima Campos Ferreira fez à Raquel no final do programa só se explicam, aliás, por ser óbvio que a Raquel lhe «salvara» o programa."
Vai à atenção de André Azevedo Alves, este meu subsídio para o dorido trabalho de investigação que está a partilhar com o estimável público, biografando a "académica" Raquel, a nível d' O Insurgente.
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Leitura complementar: Doce Raquel e o horário "nobre"
Vejo as "redes sociais" muito agitadas com um tal Martim, jovem bastante mais potável que o risível Miguel Gonçalves, na sequência de uma troca de impressões no Prós & Prós de ontem. Não acompanho os aplausos, muito menos os "agradecimentos" por ter, aparentemente, posto uma senhora "no seu lugar".
Martim tem "um negócio de moda", "a preços acessíveis", que lhe corre bem. Mesmo porque "foi bem aceite a nível das pessoas" que se davam com ele. Fátima "calcula" que seja "confortável", "desportiva", "muito jovem", "muito aliciante", "muito atractiva", e a "preços bem mais baratos" (sic) do que se fosse "roupa de marca". Raquel interrompe-o para lhe perguntar se as roupas são fabricadas na China, "com os trabalhadores a ganharem 2 dólares por dia" e "a comer uma tijela de arroz". Martim diz que não, que são feitas numa fábrica portuguesa. Raquel pergunta se ele sabe "nessa empresa portuguesa, quanto é que ganham os trabalhadores", porque "maioritariamente nas empresas têxteis os trabalhadores ganham o ordenado mínimo", o que "não é suficiente para viver". Martim responde-lhe que, "pelo menos", esses trabalhadores "não estão no desemprego". A plateia vem abaixo com as palmas.
Que a suposta "doutora" Raquel Varela seja (digamos) mentalmente excepcional, é um facto da vida, indesmentível, inevitável, e que não me diz respeito. Que a nossa "academia" lhe dê "graus", é exemplar. Diz mais da nossa "academia", e do que em 30 anos fomos colectivamente permitindo que se fizesse dela, do que diz da "académica" Raquel. Que a televisão pública dê palco às varelices, é uma consequência directa do ponto anterior.
Nada disto faz de Martim um fenómeno. Qualquer mamífero com instrução suficiente para atravessar a própria rua percebe o mundo melhor do que a doce Raquel.
Se Martim responde a Raquel, mostra que é educado. Se Martim responde a Raquel contrariando-a (assim, em directo e em horário "nobre"), fico na dúvida. Bem sei que Martim só tem 16 anos. E que não foi ele que a convidou. Se os "jornalistas" soubessem o que é caridade, nunca mais entrevistavam Raquel.
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