Ontem estive num jantar lisboeta, degustando as primárias do PS. Os comentários voavam sobre as toilettes e os penteados das senhoras que iam aparecendo na pantalha, no geral horríveis, e os discursos e os abraços, os primeiros de circunstância (salvo a deselegância de Costa não guardar uma palavra simpática, mesmo que hipócrita, para o derrotado) e os segundos, naturalmente, muitos deles, de oportunismo e revivalismo. Da substância das coisas falou-se pouco, e não porque os comensais estivessem excessivamente concentrados no bife à Império ou lhes faltasse o domínio da matéria. Não. É que sobre Costa e Seguro, e respectivos esquadrões de áulicos, só é possível falar de diferenças de personalidades e de estilos - quase nada os separa no que desejam para o país, e no que pensam sobre a UE e o Mundo.
Secretamente porém, eu tinha o meu cavalo, e era Seguro. E não pela razão comezinha de desejar para adversário o mais fraco - Seguro nunca pareceu mais do que o lugar-tenente que efectivamente foi e sempre lhe faltou aquele je ne sais quoi que faz com que um líder possa pescar, se as circunstâncias o permitirem, fora da área dos convertidos indefectíveis.
É que ambos devem ter lido, na juventude, Herbert Marcuse, Seguro devagar, porventura tomando notas, Costa na diagonal, só para ficar com uma ideia. E agora que ambos, e toda a gente, esqueceram aquele in illo tempore celebrado filósofo, resta que Seguro, se chegasse a governante, seria um diligente leitor das instruções de Bruxelas e Frankfurt. E Costa, fiado na superioridade intelectual que lhe imaginam, na popularidade que a sua falsa bonomia lhe compra, e na ideia absurda que pode seriamente impressionar as altas instâncias europeias onde tudo se decide, exercendo sobre dignitários estrangeiros o mesmo fascínio que exerce sobre os jornalistas e o eleitorado de Lisboa, lerá na diagonal.
Daí que, se ganhar as eleições, e conseguir fazer uma coligação com um mínimo de consistência, o que nos vai acontecer depende não dos humores dos coligados mas do que a Europa pós-Barroso pensar dos Gregos ibéricos. E será isso, e isso apenas, que determinará quando, e de que forma, virá um novo resgate. Então, não serão apenas os lisboetas a ter os pés em água enquanto o seu Presidente está de viagem a espalhar discursos empolgantes e promessas sortidas.
Do blog Os Comediantes:
"Como deve o PSD responder à vitória de Costa? Pedindo uma remodelação do Governo? Não. O que faz falta é um processo de primárias no PSD em tudo semelhante ao do PS, nomeadamente com abertura a simpatizantes, que permita a Passos Coelho testar a sua liderança. Isso é que era. Até porque estou convencido que à direita, houvesse uma candidatura forte contra Passos nessas condições - por exemplo, encabeçada por Rui Rio -, e mesmo sendo Passos o actual PM - ou até por isso -, militantes e simpatizantes do PSD não deixariam o Coelho passar de candidato a candidato à renovação do seu cargo de PM."
Exactamente. Avaliação da situação, estudo de opinião, abertura de primárias, demissão e campanha eleitoral. Face ao "Novo" PS dos neo-mesmos-de-sempre-socráticos, um PSD de cara lavada faria toda a diferença para dar esperança a uma grande parte do eleitorado que não se revê nem no actual PSD nem no PS. E seria sinal de pensar-se primeiro no país. Em último caso, para uma negociação de bloco-central (será muito estranho que o PS consiga maioria absoluta) o PSD apresentar-se-á mais forte.
Mas isto é no país das maravilhas. O mais provável é o PSD continuar a definhar e o PS a cavalgar a onda do "vamos fazer diferente mas não sabemos dizemos como".
Blogs
Adeptos da Concorrência Imperfeita
Com jornalismo assim, quem precisa de censura?
DêDêTê (Desconfia dele também...)
Momentos económicos... e não só
O MacGuffin (aka Contra a Corrente)
Os Três Dês do Acordo Ortográfico
Leituras
Ambrose Evans-Pritchard (The Telegraph)
Rodrigo Gurgel (até 4 Fev. 2015)
Jornais